BRASÍLIA – As empresas americanas perderam US$ 4 trilhões em valor de mercado desde o início do governo de Donald Trump, no dia 20 de janeiro. Ao mesmo tempo, o chamado índice VIX, ou o “índice do medo”, que mede a volatilidade das empresas na bolsa americana, disparou, e houve piora da confiança dos consumidores, com expectativa de aumento da inflação.
Entre as principais bolsas globais, os índices americanos S&P 500, Nasdaq e Dow Jones operam no vermelho, atrás até do Ibovespa, da B3, que se valoriza este ano, mesmo com as incertezas fiscais do governo Lula.
O aumento de barreiras comerciais nos EUA tende a elevar a inflação no país, o que pode fazer com o Federal Reserve (Fed), o banco central americano, corte menos os juros este ano – ou, num pior cenário, até mesmo suba a taxa.

Com os impactos nas cadeias de suprimento de produção dos EUA, pelo encarecimento dos produtos importados, o índice “GDP Now”, medido pelo Fed de Atlanta, já prevê risco de queda do PIB no primeiro trimestre. Bancos e consultorias, por sua vez, reduzem projeções de crescimento e também falam em risco de recessão.
Veja abaixo, em seis gráficos, os efeitos do governo Trump sobre a economia.
Perda de valor de mercado
O início da administração Trump tem sido marcado pelo derretimento do valor de mercado das empresas do País. Segundo levantamento feito pela consultoria Elos Ayta, de 20 de janeiro, quando Trump tomou posse, a 14 de março, as empresas americanas listadas nos três principais índices das bolsas do país (Nasdaq, S&P 500 e Dow Jones) perderam US$ 4 trilhões em valor de mercado.
“A forte desvalorização das gigantes de Wall Street reflete um momento de incerteza nos mercados globais. Com perdas trilionárias desde o início do ano, investidores buscam refúgio em outras regiões, enquanto a volatilidade persiste nos EUA”, afirma Einar Rivero, CEO da Elos Ayta. “O impacto se estende além das grandes empresas de tecnologia, afetando o apetite por risco e a alocação de capital no mundo todo.”
A empresa com maior perda, curiosamente, é a Tesla, do bilionário Elon Musk, o homem mais rico do mundo e que integra o governo Trump, como chefe do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE, na sigla em inglês). Desde o início do governo, a desvalorização da empresa na bolsa chega a US$ 565 bilhões.
Logo em seguida, aparece a Nvidia, com perdas de US$ 404 bilhões, e a Alphabet, dona do Google, com desvalorização de US$ 379 bilhões. Ao todo, as sete maiores empresas dos EUA, chamadas de “sete magníficas”, perderam US$ 2,1 trilhões. Quando a conta inclui todas as empresas da bolsa, a perda vai a US$ 4 trilhões.
Desde o início do ano, os três principais índices americanos amargam desvalorização. O índice Nasdaq, que concentra ações de empresas de tecnologia, aparece com a maior perda entre 21 índices mundiais, com queda de 8,1%. O S&P 500 também cai 4,1% enquanto o Dow Jones recua 2,5%.
Na liderança da valorização este ano está o Euro Stoxx 50, índice europeu, com alta de 25,89%. O Ibovespa, por sua vez, sobe 4,45%.
Inflação pressionada
Com o anúncio em série de barreiras comerciais, que tendem a encarecer os produtos importados pelos americanos, já houve uma forte piora na percepção dos consumidores em relação à inflação.
Além disso, a entrada em vigor das tarifas contra o aço e alumínio – que atingem o Brasil – já provocaram uma disparada nos preços aos produtores. Desde o dia 25, a tonelada do aço em bobina laminada a quente no Centro-Oeste dos EUA disparou de US$ 779 para US$ 939, um aumento de 20,53%.
“A tarifa encareceu o aço importado e permitiu que os produtores domésticos aumentassem seus preços”, afirma o economista Alexandre Schwartsman. “O resultado é perda de competitividade das empresas americanas que usam aço como insumo. Tremendo tiro no pé”, diz.
Sondagem feita pela Universidade de Michigan com consumidores, por sua vez, mostrou que a projeção de inflação para cinco anos à frente subiu para 3,5% em fevereiro – o maior patamar desde abril de 1995, em quase 30 anos.
Segundo o economista Alberto Ramos, diretor de pesquisa econômica para a América Latina do banco Goldman Sachs, esse indicador tende a ser mais volátil, porque faz uma sondagem com os consumidores – que não rodam modelos como os economistas –, mas já começa a refletir o noticiário apontando aumento dos preços por conta das medidas de Trump.
Essa piora na percepção de inflação tende a fazer com que o mercado passe a apostar em menos cortes na taxa de juros pelo Fed, o que também tem levado alguns bancos a piorar as projeções de crescimento do país, com risco até de recessão.
‘Índice do medo’ (VIX)
As incertezas provocadas por Trump fizeram disparar o índice VIX, que mede a volatilidade das empresas dentro do S&P 500 e é conhecido como “índice do medo”. Segundo o economista-chefe da Austin Ratings, Alex Agostini, diferentemente do primeiro mandato, Trump agora está indo além da retórica e colocando as medidas em prática.
“Eu acho que ele deixou muito claro qual é a posição dele em relação aos Estados Unidos desde o primeiro mandato; só que, diferentemente daquela vez, agora ele está colocando em prática tudo aquilo que só ficava na narrativa”, afirmou.
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Agostini lembra que ele sempre foi um empresário com uma postura agressiva nos negócios, que faliu muitas vezes, mas se manteve como uma pessoa de sucesso. A lógica empresarial, no entanto, pode nem sempre estar alinhada à gestão pública, mesmo para uma potência econômica mundial, como os EUA.
“Em uma empresa, quando você fecha as portas com o fornecedor, você tem outro para negociar. O problema é que, como governo, você não tem tantos fornecedores no mundo e não é tão simples fechar e abrir portas. Você tem organismos internacionais, como a OMC (Organização Mundial do Comércio), que tentam equilibrar diferenças econômicas e financeiras entre países desenvolvidos, emergentes e subdesenvolvidos”, explica.
Risco de queda do PIB
O “GDPNow” (PIB agora), indicador que avalia a evolução da economia americana em tempo real, produzido por um modelo elaborado pelo Fed de Atlanta, apontou que o PIB do país no primeiro trimestre de 2025 atingiu -2,5%, em termos anuais e com ajustes sazonais, no dia 6 de março.
Segundo Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, a piora desse indicador reflete as incertezas provocadas pelo governo Trump na economia.
“O GDP Now está indicando que talvez haja uma queda de PIB já no primeiro trimestre. É bastante razoável de se esperar, porque Trump trouxe um cenário de muita incerteza, de muita instabilidade para a economia mundial e para a economia americana especialmente”, afirma Vale.
Ele destaca que o aumento de tarifas foi além da briga com a China e atingiu também México e Canadá, que estão totalmente integrados às cadeias de produção americanas. Além disso, há o risco de novos aumentos de tarifas, o que provoca enorme incerteza entre empresários, consumidores e investidores.
“Os americanos estavam, de certa forma, preparados para um Trump agressivo com a China. E, de repente, vem um Trump agressivo com o Canadá e o México, e que embaralha muito a estrutura comercial do país por conta da produção entre eles. Isso colocou um grau de incerteza enorme e um crescimento das importações nesse início de ano. Isso pode trazer a desaceleração já para o primeiro trimestre”, afirma.
Analistas do JPMorgan Chase afirmaram em um relatório que havia um “risco materialmente maior” de uma recessão global este ano por causa de “políticas extremas dos EUA”. Eles colocaram a probabilidade de tal recessão em 40%. Estrategistas do Goldman Sachs aumentaram as chances de uma recessão nos EUA nos próximos 12 meses para 20%, citando “mudanças de política como o risco principal”.