Donald Trump revelou seu ponto fraco em sua disputa com o líder chinês, Xi Jinping

Xi, que governa com autoridade absoluta, sinalizou estar disposto a permitir que o povo chinês enfrente dificuldades por conta da guerra comercial; Trump mostrou que tem limites

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Por Li Yuan (The New York Times)

O presidente Donald Trump não parecia se importar quando suas tarifas globais provocaram quedas nas bolsas de valores e eliminaram trilhões de dólares em riqueza.

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“Fiquem tranquilos”, disse ele aos americanos.

Mas, na tarde de quarta-feira, 9, ele recuou diante da turbulência financeira, especialmente com a rápida alta nos rendimentos dos títulos do governo, que poderia abalar a posição dominante do dólar e a base da economia dos Estados Unidos.

Ao suspender algumas tarifas por 90 dias para dezenas de países, ele também cedeu algo ao seu principal rival, o líder chinês Xi Jinping, com quem está travando um “jogo da galinha” que corre o risco de separar as duas maiores economias do mundo e virar a ordem econômica global de cabeça para baixo.

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Xi aprendeu que seu adversário tem um ponto fraco.

Ao suspender algumas tarifas por 90 dias, Trump também cedeu algo ao seu principal rival, o líder chinês Xi Jinping. Foto: Eric Lee/NYT

Por mais imprudente e implacável que Trump possa parecer para partes do mundo, ele enfrenta, em Xi e na China, um líder e um Estado-partido com um longo histórico de busca obstinada por suas políticas — mesmo quando resultam em catástrofes econômicas e humanas.

Entre os chineses, tanto críticos quanto apoiadores do governo concordam que o desfecho pode depender de qual líder será capaz de fazer seu povo suportar o sofrimento em nome do interesse nacional.

“Tarifas e até sanções econômicas não são os pontos de pressão para Xi Jinping”, escreveu Hao Qun, romancista chinês exilado que assina como Murong Xuecun, na rede X. “Ele não se preocupa particularmente com as dificuldades que as tarifas possam causar ao povo comum.”

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Diferente de Trump, Xi não se comunica com o público chinês por meio das redes sociais, embora controle todas elas. Tudo o que ele diz e faz é coreografado. É impossível saber o que se passa em sua cabeça, porque o público conhece pouco além de sua fachada oficial. Mas pistas sobre como ele pode reagir ao confronto com Trump estão em sua visão sobre o sofrimento, na relação com o povo chinês e em seu histórico como líder de uma nação de 1,4 bilhão de pessoas.

A internet chinesa está repleta de comentários nacionalistas sobre a necessidade de “resistir firmemente e manter a posição até o fim”.

Internautas compartilharam um vídeo do ex-presidente Mao Tsé-tung falando sobre a Guerra da Coreia: “Lutaremos pelo tempo que eles quiserem lutar, e lutaremos até vencermos completamente.”

Mao Ning, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, relembrou um comentário de Mao de 1964, chamando os Estados Unidos de “um tigre de papel”. “Não acreditem no blefe deles”, disse Mao a uma delegação do Parlamento francês que visitava a China. “Com um empurrão, ele estoura!”

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O presidente da China, Xi Jinping Foto: Ng Han Guan/AP

Alguns comentaristas online mencionaram o “Grande Salto Adiante” para ilustrar a capacidade do Partido Comunista de impor austeridade em tempos difíceis. A campanha, entre 1958 e 1962, visava a industrializar rapidamente a China. Suas políticas desafiavam a ciência e as leis da natureza, resultando em uma fome que matou dezenas de milhões de pessoas.

Enquanto pessoas famintas no interior recorriam até ao canibalismo, Mao instruía os agricultores a comer farelo de grãos e plantas selvagens comestíveis. “Aguentem por um ano, dois anos, até três anos, e daremos a volta por cima”, dizia.

Xi, que alguns chineses veem como o sucessor de Mao, gosta de falar sobre os benefícios de suportar dificuldades.

Nascido em uma família revolucionária, Xi enfrentou turbulência política e adversidade desde jovem. Seu pai, vice-primeiro-ministro, foi expurgado quando Xi tinha 9 anos. Durante a Revolução Cultural, o pai foi severamente perseguido. O filho, ainda com 15 anos, foi enviado para um vilarejo no remoto planalto de Loess para trabalhar como agricultor.

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“Os sete anos difíceis que passei vivendo e trabalhando no campo foram um grande teste para mim”, disse ele em uma longa reportagem da agência oficial Xinhua. “Sempre que enfrento dificuldades, lembro como, mesmo sob condições tão duras naquela época, eu conseguia realizar as coisas.”

Era 2023, e a economia da China ainda lutava para se recuperar da pandemia de covid-19. O desemprego entre jovens disparava. Xi disse aos jovens que deveriam aprender a “comer amargor”, expressão popular que significa suportar dificuldades.

Em um artigo da mídia estatal sobre as expectativas de Xi para a nova geração, a palavra “dificuldade” foi mencionada 37 vezes.

No início de 2022, já estava claro que a variante Ômicron era contagiosa demais para ser contida, mas quase todos os outros países vacinados já tinham reaberto suas economias. Xi, no entanto, insistiu que a China mantivesse sua rigorosa política de “covid zero”, resistindo a importar vacinas ocidentais. Centenas de milhões de pessoas enfrentaram lockdowns, testes diários e quarentenas forçadas. Muitas vidas e meios de subsistência foram destruídos.

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Nos últimos anos, Xi resistiu aos apelos de economistas e até de membros de seu governo para oferecer auxílio direto à população e estimular o consumo. Em um discurso de 2021, ele criticou o “assistencialismo”, dizendo: “Uma vez que os benefícios sobem, eles não voltam a cair.”

A realidade é que 600 milhões de chineses ganham menos de US$ 140 por mês e contam com benefícios sociais mínimos — um dos principais motivos pelos quais economizam tanto e consomem pouco, o que prejudica o crescimento da economia.

Xi acabou encerrando a política de covid zero, mas o fez de forma abrupta e sem vacinação adequada. Milhões se infectaram rapidamente, idosos morreram, e formaram-se filas nos crematórios.

A crise crônica no setor imobiliário parece ter finalmente aproximado Xi da ideia de ajudar os consumidores, embora alguns economistas acreditem que isso possa ter vindo tarde demais — especialmente diante da guerra comercial.

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Ponto fraco de Xi

Xi também tem um ponto fraco na economia: ele não pode permitir que a situação fique tão ruim a ponto de comprometer a legitimidade do regime. Os protestos nacionais de novembro de 2022 ajudaram a encerrar a política de covid zero. As tarifas ameaçam as exportações chinesas, motor da economia do país. Na sexta-feira, 11, Xi fez seus primeiros comentários públicos sobre a guerra tarifária.

“O desenvolvimento da China sempre dependeu da autossuficiência e do trabalho árduo; nunca da caridade dos outros, e nunca temendo qualquer repressão injusta”, disse, conforma citação da mídia estatal.

Como o mundo aprendeu nesta semana, Trump não pode simplesmente ignorar os mercados financeiros ou os bilionários de Wall Street e do setor de tecnologia que apoiaram sua campanha. Eles procuraram membros de seu gabinete para expressar suas preocupações. Até aliados fiéis, como Elon Musk e o gestor de fundos Bill Ackman, demonstraram discordância com as políticas tarifárias do presidente.

É difícil imaginar que qualquer empreendedor chinês ousaria fazer o mesmo ou, como Musk, teria canais para transmitir suas preocupações a Xi, que afastou opositores políticos e reprimiu empresas privadas. Se Trump aspira ao poder absoluto como Xi, ainda tem um longo caminho a percorrer.

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Nos últimos dias, tenho acompanhado as redes sociais chinesas à procura de alguma empresa ou empresário conhecido que tenha reclamado da guerra comercial. Não encontrei nenhum. Pessoas comuns que lamentaram online ter tido corte de salário ou perdido negócios por causa das tarifas foram atacadas por comentaristas nacionalistas e rotuladas como “antipatrióticas”.

Essa é uma base com a qual Trump não pode competir.

“Submeter-se à hegemonia nunca foi uma opção para a China”, escreveu um usuário da rede social chinesa Weibo na quinta-feira. “Se conseguimos expulsar os americanos durante a Guerra da Coreia, não temos nada a temer com seu bastão tarifário. Devemos responder com punho de ferro.” O comentário recebeu mais de 3 mil curtidas.

Este conteúdo foi traduzido com o auxílio de ferramentas de Inteligência Artificial e revisado por nossa equipe editorial. Saiba mais em nossa Política de IA.

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