BRASÍLIA - Um ano após ser lançado, o novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) ainda tem cerca de metade dos empreendimentos anunciados em sua primeira leva em “ações preparatórias” - ou seja, estão num estágio anterior à obra propriamente dita. O levantamento foi feito pelo Estadão/Broadcast Político com base na lista de ações divulgada pelo próprio governo, que chega a contar como “em execução” obras paradas. Ou seja, pode haver menos empreendimentos do PAC sendo efetivamente executados.
De acordo com os dados da Casa Civil, o programa tinha em seu lançamento, em 11 de agosto do ano passado, 11.656 empreendimentos. Um ano depois, 5.666 ainda estão em “ação preparatória”. Outros 146 que estão em fase de licitação ou leilão.
Os empreendimentos com o status “em execução” somam 4.908. Já aqueles que foram concluídos, segundo a Casa Civil, são 936. Os dados divulgados pelo ministério não mostram o porcentual de execução de cada empreendimento, nem prazos para conclusão.
“Os PACs dos governos do PT nunca foram concluídos na sua integralidade”, criticou o líder do PL no Senado, Carlos Portinho (RJ). “Isso aí era anunciado, tolos são aqueles que acreditaram”, declarou o senador à reportagem. Desde o primeiro lançamento, em 2007, no segundo mandato de Lula, o PAC sofreu com atrasos, cancelamentos e suspensão de obras. Outro problema forams os constantes aumentos nos valores de investimentos das obras.
Procurada, a Casa Civil disse que uma obra estar “em ação preparatória” não significa que ela não foi iniciada. “Significa que está em andamento toda parte de formalização, legislação, retomada e outras ações que estão em curso, mas que não caracterizam a obra em execução”, afirmou o órgão. “A mesma informação vale para as que estão em leilão/licitação, que é uma das possíveis etapas até o início da obra”, declarou a pasta.
Além das obras do lançamento do programa, nos meses seguintes foram incluídas ações a pedido de prefeitos e governadores - o que o governo chama de PAC Seleções. A reportagem computou apenas as obras da primeira leva.
Obras paradas
O levantamento identificou duas obras que constam na lista da Casa Civil como “em execução”, mas que, na prática, estão paradas. No Acre, a ponte sobre o rio Juruá precisa de uma licença ambiental para ter a construção iniciada. Já no Rio Grande do Sul, os acessos à ponte do rio Guaíba estão com as obras paralisadas porque ainda não há uma empreiteira contratada para continuar a construção.
“Sobre as duas obras citadas, segundo os critérios estabelecidos para o monitoramento dos empreendimentos no Novo PAC, estes encontram-se com fase ‘em planejamento’ e situação ‘em elaboração de projeto’. Isso significa que os empreendimentos estão em andamento, não necessariamente da obra, mas as fases que a antecedem, no caso, o desenvolvimento dos projetos”, afirmou a Casa Civil.
Leia também
Diante das inconsistências apontadas pela reportagem, a Casa Civil afirmou que a área técnica “trabalha em ajustes na metodologia de classificação, com vistas a facilitar a demonstração da situação do empreendimento no site”. “O compromisso é que as informações sejam ainda mais transparentes para o público geral. Ressaltamos que aperfeiçoamento e melhorias sempre são considerados e implementados”, complementou.
Reclamação contra a burocracia
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem cobrado os ministros para acelerar as obras do PAC. O programa está emperrado nos ministérios da Saúde e da Ciência e Tecnologia, duas áreas caras ao chefe do Executivo, como mostrou na quarta-feira, 8, o Estadão/Broadcast Político.
Em seus discursos, o petista costuma reclamar da burocracia, que atrasa ações do governo. “O mandato é só de quatro anos, daqui a pouco a gente termina o mandato e não consegue executar”, disse Lula durante evento de assinatura de contrato para destinação de recursos do Fundo Amazônia a ações de fortalecimento do Plano Amazônia: Segurança e Soberania - AMAS, em junho.
O andamento das obras do PAC varia de lugar para lugar. Em Sergipe, por exemplo, na duplicação da BR-101 Sul e Norte, os trechos caminham em velocidades diferentes. De acordo com informações da área técnica, são 25 km de duplicação da BR-101 Norte. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) já entregou 5,7 km e pretende concluir a entrega no ano que vem.
Já no trecho Sul, que conta com 50 km de duplicação, a obra ainda está em fase preparatória e o edital do empreendimento deve ser publicado até o fim do ano. A expectativa é que as obras nesse trecho comecem só em 2025. No site do PAC, o empreendimento está classificado como “em execução”.
O Rio Grande do Sul também teve problemas devido às enchentes que atingiram o Estado no primeiro semestre deste ano. O superintendente do Dnit no local, Hiratan Pinheiro da Silva, disse à reportagem que houve atrasos durante o período em que algumas obras ficaram submersas.
“É claro que a retomada foi mais lenta em razão das limitações de acesso, mas agora já está normal”, declarou Pinheiro da Silva. Segundo ele, a exceção é uma obra tocada pelo Exército que foi paralisada para os militares atenderem pessoas atingidas pelas chuvas.
Vitrine do governo
O Novo PAC foi lançado em 11 de agosto de 2023 por Lula no Rio de Janeiro, com investimentos de R$ 1,7 trilhão em todos os Estados até 2026. Os investimentos previstos com recursos do Orçamento Geral da União somam R$ 371 bilhões e os das empresas estatais, R$ 343 bilhões. Também entram na conta financiamentos, na ordem de R$ 362 bilhões, e desembolsos do setor privado, em um total de R$ 612 bilhões.
A cerimônia do ano passado contou com a presença da ex-presidente Dilma Rousseff, do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), governadores e diversos ministros do governo. Durante a fala, Lula disse que o ato marcava o começo de seu governo.
“O PAC é o começo do nosso terceiro mandato. Porque, a partir do PAC, o ministro vai parar de ter ideia. O ministro vai ter de cumprir o que foi aprovado aqui e trabalhar muito para a gente poder executar esse PAC”, declarou o presidente, na ocasião.
Resultados ruins dos PACs anteriores
O anúncio de um novo PAC pelo governo federal sempre foi visto com muita desconfiança por especialistas. Entre os motivos do ceticismo estavam o fato de muitos empreendimentos anunciados no passado terem projetos mal estruturados e de parte das obras não ter sido finalizada, além do envolvimento em grandes escândalos de corrupção.
No caso da primeira edição do PAC, por exemplo, relatórios do governo apontavam que os empreendimentos concluídos entre 2007 e 2010 chegavam a R$ 444 bilhões, o que correspondia a 82% do previsto para o período. Para o PAC 2, os documentos indicavam R$ 796,4 bilhões, ou 99,7% do previsto.
Estudo da consultoria Inter.B de 2016, porém, mostrou que esses números foram superestimados, dado que houve uma superposição de cerca de 61% das ações do PAC 1 e do PAC 2. Indica ainda que, na verdade, apenas 50,9% das ações do PAC 1 haviam sido concluídas e 52,9% das do PAC 2.
A consultoria também analisou uma amostra dos principais projetos do PAC e concluiu que, entre dezembro de 2010 e dezembro de 2014, o aumento médio do custo e do prazo de entrega das obras no setor de transportes foi de 46% e 89%, respectivamente. Em energia, foi de 51% e de 78%.
“O que aconteceu no PAC – e em muitos projetos fora do PAC também – é que os gastos foram acima do planejado, a execução foi falha e, por isso, houve grandes atrasos”, disse Claudio Frischtak, fundador da Inter.B, em entrevista ao Estadão no ano passado.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.