BRASÍLIA - Autor do Projeto de Lei que quer criar a reciprocidade ambiental depois que o Parlamento Europeu aprovou uma série de medidas duras para importações, que podem prejudicar as exportações agrícolas brasileiras, o senador Zequinha Marinho (PL-PA) defendeu em entrevista ao Estadão/Broadcast que as discussões internacionais sobre o tema ocorram de forma transparente.
“Temos uma série de dados positivos e, de repente, somos o patinho feio da história”, disse do Pará, onde participa do Parlamento Amazônico (Parlamaz). O documento foi protocolado na noite de segunda-feira no Congresso.
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Além da Lei da Reciprocidade Ambiental ser vista como um obstáculo para ações mais fortes da União Europeia, o senador está de olho também no desenvolvimento do mercado de carbono no Brasil, que poderá servir como compensação para países que tiverem emissões superiores às locais.
“Temos um enorme potencial e seremos um grande mercado amanhã”, previu Marinho. O PL deve passar por quatro comissões do Senado antes de ser levado a plenário.
Leia abaixo a entrevista:
Qual sua expectativa com o projeto?
O assunto é sério, importante, mas, de repente, se usa isso para prejudicar as relações comerciais com a gente aqui, que tem uma das leis ambientais mais rígidas do mundo, o nosso Código Florestal. Somos um País com 66% de cobertura original, e eles têm, no máximo, 20%, não chegam a 30%. Temos uma série de dados positivos e, de repente, somos o patinho feio da história.
O projeto não conta com alíquotas de importação, apenas outros tipos de barreira, certo?
Exatamente, é uma coisa bem simples: país que negocia com a gente e não tem cobrança, a lei o deixa de fora. No caso dos países que fazem exigências, tomamos aquilo que a gente tem como parâmetro. Para negociar conosco, países que exigem não podem emitir gases de efeito estufa acima do padrão que o Brasil emite. É a reciprocidade. Vamos exigir reciprocidade em cima do que a gente cumpre aqui. Por exemplo: a China vende e compra e não tem problema? Não, ninguém vai falar com a China sobre isso.
O senhor não teme que esse PL acabe prejudicando as negociações entre União Europeia e Mercosul sobre a ampliação do comércio entre os blocos?
Acho que não, até porque não acredito muito que isso avance (a pressão ambiental europeia). Na semana passada, o Parlamento Europeu entrou em campo e aprovou uma legislação duríssima em cima disso. Tenho certeza de que eles estão prontos para dar também aquilo que estão cobrando. Senão, não são éticos. Se exigem, é porque também têm responsabilidade. Só quero que isso (as emissões) seja checado. E então, como é que fazem para se alinhar? Podem comprar crédito de carbono. Na hora que o governo regular esse mercado, e é de olho nisso que estou apresentando com a FPA (Frente Parlamentar da Agricultura), a gente tem crédito para vender, então podem comprar crédito para equilibrar.
O senhor está já pensando nesse mercado, então?
Sim, nós temos um enorme potencial e seremos um grande mercado amanhã. A questão é que, em toda a COP (Conferência da ONU sobre clima), prometem colocar dinheiro, comprar crédito… mas é só conversa. Quando chega a hora da verdade, o dinheiro não vem - agora está começando a aparecer alguma coisa (na semana passada, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, informou que solicitou US$ 500 milhões para o Fundo Amazônia).
O PL fala que não são alíquotas de importação, mas cita a Câmara de Comércio Exterior (Camex) do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). Qual será o papel da Camex?
Será o de acompanhar isso de forma simples, mas bem eficiente, identificando os parâmetros ambientais dos outros países.
Não corre o risco de o PL ser um tiro no pé do Brasil e perdermos mercado?
Não, não. Eu não vejo isso. Vamos abrir uma discussão agora que o projeto foi protocolado. Também queremos participar do debate aberto pela UE, mas não apenas como ouvintes. Precisamos dar transparência nas questões ambientais internacionais.
Qual será o trâmite do PL agora?
Vai para a mesa diretora e depois deve passar por pelo menos quatro comissões. Primeiro a do meio ambiente, depois a de assuntos econômicos, depois a de relações exteriores e, por fim, deve passar na Comissão de Constituição e Justiça para dar o xeque-mate final.
O senhor está no Pará e soube que quer estender o prazo para a consulta pública do Ministério do Meio Ambiente do Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm), que termina amanhã. Por quê?
Sem uma prorrogação, vamos matar esse povo aqui - e não é só o do Pará. Se a gente engessar isso, a gente acaba com a região. A Amazônia é linda, é rica, mas seus municípios e Estados têm um IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) muito baixo. Além de problemas em educação e saúde, a renda per capita é um desastre, em que pese todo o potencial que essa linda terra tem. Precisamos debater sobre isso no Senado e na Câmara, também na região, conversar com o governo para ver que forma implementamos melhorias, sem que as operações dos Ibamas sejam tão traumáticas aqui para os Estados.
Não se fez debate nenhum e vai pegar todo mundo em situação deprimente. Isso vai dar um impacto danado na questão do trabalho aqui. Precisamos atuar para sabermos o tamanho da pancada e, de repente, ver se o governo aceita alguma sugestão local.
E a COP 30? Vai ser no Pará?
Espero que sim, que esse povo venha para cá e veja que não há apenas floresta, jacaré e outros bichos. Aqui tem gente. São quase 30 milhões de pessoas morando nessa região. Não entendo que um discurso puramente ambiental avance. Tem que estar com o social e a questão econômica. Se não for assim, não vai dar certo.
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