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Uso de fundos para turbinar gasto e crédito: veja 11 exemplos e entenda o caminho do dinheiro

Governo e Congresso têm se valido dessa estratégia para conseguir aumentar as despesas e os financiamentos baratos sem esbarrar nas travas do arcabouço fiscal

Foto do author Bianca Lima
Foto do author Luiz Guilherme  Gerbelli
Atualização:

BRASÍLIA e SÃO PAULO - O Brasil conta com mais de duzentos fundos públicos e privados ― alguns criados antes da Constituição de 1988. Esse instrumento costuma ter receitas vinculadas e ser usado para políticas setoriais, que vão desde a concessão de crédito a taxas mais acessíveis até aportes diretos em projetos e ações.

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Há também a possibilidade de o fundo servir como espécie de avalista. Ou seja, garantir o crédito em caso de uma eventual inadimplência, o que faz com que o tomador consiga juros mais baixos.

Desde 2023, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem ampliado o uso desses instrumentos para turbinar a concessão de crédito e ampliar os gastos sem esbarrar nas limitações impostas pelo arcabouço fiscal. A prática geralmente é viabilizada por meio da alteração ou aprovação de leis e, portanto, conta com o aval do Congresso.

O Estadão listou onze fundos públicos e privados para exemplificar como os valores estão sendo desembolsados, em qual volume e com quais prioridades. Confira a lista abaixo.

Fundo Clima

Foi criado em 2019 e é vinculado ao Ministério do Meio Ambiente. Tem a finalidade de garantir recursos e financiamentos a ações voltadas à mitigação das mudanças climáticas. Neste ano, recebeu aporte de R$ 10,4 bilhões, montante que foi captado pelo Tesouro Nacional por meio da emissão de títulos soberanos sustentáveis no mercado internacional ― os chamados títulos verdes. Trata-se, portanto, de emissão de dívida.

Na semana passada, o Senado Federal aprovou projeto de lei que amplia o uso do fundo. O texto prevê a criação de instrumentos de proteção cambial a investidores estrangeiros que queiram aportar recursos em projetos de transformação ecológica. A expectativa do BNDES, que é o agente financeiro do fundo, é de que os aportes alcancem R$ 32 bilhões até 2026.

Fundo de Investimento em Infraestrutura Social (Fiis)

Criado neste ano, o fundo nasceu da articulação do governo com o Congresso Nacional e tem expectativa de captar R$ 10 bilhões em 2025. Desse montante, R$ 3,6 bilhões deverão ser direcionados à retomada das obras de expansão da ferrovia Transnordestina.

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Em 2023, o projeto foi incluído no Novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), capitaneado pelo ministro Rui Costa, da Casa Civil. A adminstração do fundo caberá, inclusive, à própria Casa Civil e a operação ficará com o BNDES.

Fundo do Pé-de-Meia

Trata-se de um fundo privado administrado pela Caixa Econômica Federal, que, por lei, pode receber recursos de outros fundos privados. Ele é responsável por abastecer o programa de bolsa aos alunos do ensino médio de escolas públicas, batizado de Pé-de-Meia.

Esse mecanismo orçamentário é visto como perigoso por especialistas em contas públicas, que afirmam que o programa deveria estar dentro do escopo do Orçamento, como qualquer outra despesa social. Pela legislação, o governo poderá destinar até R$ 20 bilhões ao fundo.

Fundo de Garantia de Operações (FGO) e Fundo Garantidor para Investimentos (FGI)

Foram criados em 2009, durante o segundo governo do presidente Lula. O FGO é administrado pelo Banco do Brasil, enquanto o FGI está no guarda-chuva do BNDES. Eles têm o objetivo de garantir parte do risco dos empréstimos e financiamentos concedidos a micro, pequenas e médias empresas, microempreendedor individual, profissionais liberais e autônomos transportadores rodoviários de carga.

Esse fundos tiveram aportes substanciais durante a pandemia de covid-19, na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro, e se mostraram um instrumento importante de ampliação do crédito em momento de calamidade.

Os valores aportados nesses fundos, à época, foram contabilizados fora das regras fiscais, com o compromisso de que retornariam aos cofres do Tesouro após um determinado período. Mas isso nunca aconteceu, e o dinheiro agora vem sendo utilizado para programas ordinários, que não se encaixam no escopo de urgência e imprevisibilidade.

Funttel tem Finep e e BNDES como agentes financeiros Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil

Fundo Nacional da Aviação Civil (Fnac)

Fundo vinculado ao Ministério de Portos e Aeroportos, que foi criado em 2011 com o objetivo de fomentar o desenvolvimento do sistema nacional de aviação civil. A principal fonte de recursos do Fnac são as outorgas pagas pelas concessionárias de aeroportos.

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Na semana passada, o presidente Lula sancionou projeto de lei que autoriza o fundo a garantir crédito às empresas aéreas, as quais enfrentam dificuldades financeiras desde a pandemia de covid-19. A estimativa é de R$ 5 bilhões em crédito. Os recursos do Fnac também poderão ser usados para subsidiar a compra de querosene de aviação em aeroportos localizados na Amazônia Legal.

Fundo Social do Pré-sal (FS)

Foi criado em 2010 como um instrumento para fomentar o desenvolvimento social e projetos nas áreas de educação e saúde, por meio das receitas provenientes da exploração do pré-sal. Em 2023, o Tribunal de Contas da União (TCU) alertou para o desvirtuamento dos objetivos de criação do fundo, bem como para a ausência de estruturas de governança.

Neste ano, por exemplo, ele foi usado pelo BNDES para a concessão de crédito a empresários do Rio Grande do Sul afetados pelas enchentes. Além disso, o governo propôs usá-lo para realizar uma triangulação de recursos e conseguir bancar a ampliação do Vale Gás ― a manobra consta de projeto de lei enviado ao Congresso.

Fundo da Marinha Mercante (FMM)

É administrado pelo Ministério de Portos e Aeroportos. Neste mês, o BNDES liberou um financiamento de R$ 3,7 bilhões à LHG Logística, o braço de mineração do Grupo J&F, dono da JBS.

Os recursos são provenientes do FMM e serão usados para a construção de 400 balsas e 15 empurradores destinados ao transporte hidroviário de minério de ferro e manganês pelos rios Paraná e Paraguai.

Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT)

Foi criado em 1969 e hoje é atrelado a 15 fundos setoriais, que abrangem vários setores - do agronegócio ao segmento de petróleo. Desde 2021, não pode ter o seu valor contingenciado (ou seja, bloqueado temporariamente em caso de desequilíbrio das contas públicas).

É uma fonte importante de recurso para a Finep, que desde 2023 passou a emprestar valores do FNDCT ao custo de Taxa Referencial (bem abaixo do mercado). Isso foi possível graças à aprovação de uma lei no Congresso Nacional.

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Neste ano, o plano de investimento do FNDCT é de R$ 12,7 bilhões, que serão aplicados em dez programas do setor de ciência, tecnologia e inovação.

Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust)

Criado em 2000, o Fust é gerido pelo Ministério das Comunicações e tem previsão de investimento de R$ 5 bilhões até 2026, último ano do atual mandato. Dentre as ações previstas, o fundo ajudará a bancar aporte de R$ 2 bilhões a data centers e destinará R$ 75 milhões a projeto que busca levar internet a 1,4 mil escolas do Norte e Nordeste - ambas as ações por meio do BNDES.

O ministro das Comunicações, Juscelino Filho, também quer usar os recursos do fundo para ampliar aportes do governo em provedores regionais de internet. Isso seria viabilizado por meio de empréstimos operados por bancos de fomento estaduais.

Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações (Funttel)

Foi instituído em 2000 e também é atrelado ao Ministério das Comunicações, tendo Finep e BNDES como agentes financeiros. Em julho, o conselho gestor do fundo aprovou R$ 1,3 bilhão para compra de equipamentos desenvolvidos com tecnologia nacional até 2026.

As suas receitas advêm, principalmente, das contribuições das empresas prestadoras de serviços de telecomunicações.

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