O comércio varejista começou o ano de 2024 com crescimento robusto. O volume vendido avançou 1% em fevereiro ante janeiro, após já ter expandido 2,8% no mês anterior. O bom desempenho fez as vendas alcançarem novo patamar recorde, segundo os dados da Pesquisa Mensal de Comércio divulgados nesta quinta-feira, 11, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O resultado surpreendeu analistas ouvidos pelo Estadão/Broadcast, que esperavam uma queda mediana de 1,3%.
“O varejo começa o ano com uma cara bem melhor, mas vale ressaltar que os dados do comércio seguem difíceis de se projetar, já que vinham intercalando esses movimentos de altas e baixas, importante heterogeneidade entre as atividades pesquisadas e frequentes revisões”, ponderou o chefe de pesquisa Macroeconômica da gestora Kínitro Capital, João Savignon, em comentário.
Por ora, a Kínitro Capital prevê um crescimento de 1% no Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre, encerrando o ano de 2024 com expansão de 2,5%. Para o BTG Pactual, a pesquisa do IBGE mostra a atividade econômica mais aquecida no início deste ano, aumentando a chance de o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central diminuir o ritmo de cortes da taxa básica de juros, a Selic, em junho. Itens do varejo mais sensíveis à taxa de juros têm tido melhor desempenho do que os sensíveis à renda, observou o banco, em relatório.
“Em outras palavras, acreditamos que as surpresas altistas no varejo não são apenas responsáveis pela força do mercado de trabalho e de medidas governamentais de transferências de renda, mas pode ter contribuição importante do mercado de crédito”, dizem os economistas Álvaro Frasson e Victor Esteves, do BTG.
O forte crescimento do varejo no primeiro bimestre de 2024 foi impulsionado pela expansão do crédito, pelo aumento da massa de salários em circulação na economia e pela redução de preços em itens como vestuário e eletrodomésticos, enumerou Cristiano Santos, gerente da pesquisa do IBGE.
Na passagem de janeiro para fevereiro, houve aumento nas vendas em seis das oito atividades pesquisadas: artigos farmacêuticos e perfumaria (9,9%), outros artigos de uso pessoal e doméstico, que inclui lojas de departamento (4,8%), livros e papelaria (3,2%), móveis e eletrodomésticos (1,2%), equipamentos de informática e comunicação (0,5%) e vestuário e calçados (0,3%). Na direção oposta, o volume vendido recuou em combustíveis (-2,7%) e supermercados (-0,2%).
“O que refreia supermercados em fevereiro é inflação”, justificou Cristiano Santos, lembrando que os preços dos alimentos para consumo no domicílio aumentaram acima da inflação geral no mês. “Tem um pouco desse efeito de inflação, mas também tem base de comparação mais alta, e também tem como fator um pouco da mudança de comportamento do consumidor”, acrescentou.
Para Santos, o consumidor migrou de itens essenciais para a aquisição de produtos de outras categorias varejistas.
“O consumo tem mudado nos últimos meses. Ao longo de 2023, ele estava muito focado em produtos básicos. A gente teve crescimento consistente de supermercados e farmacêuticos. Agora o crescimento é em outros setores”, apontou o pesquisador do IBGE.
Quanto ao varejo ampliado - que inclui as atividades de material de construção, veículos e atacado alimentício -, as vendas cresceram 1,2% em fevereiro ante janeiro. O volume vendido por veículos avançou 3,9%, e em material de construção recuou 0,2%. Com a reformulação periódica da Pesquisa Mensal de Comércio, o desempenho do varejo ampliado passou a incluir os dados do atacado alimentício, mas ainda sem informações individuais para essa atividade na série que desconta influências sazonais. O IBGE explica que é necessário ter uma série histórica mais longa para construir uma base de dados consistente que permita divulgações ajustadas sazonalmente.
Desempenho heterogêneo ante o covid
O volume de vendas do varejo chegou a fevereiro em patamar 7,1% acima do nível de fevereiro de 2020, no pré-pandemia de covid-19. No varejo ampliado, as vendas operam 5,5% acima do pré-pandemia.
O segmento de artigos farmacêuticos opera em patamar 39,9% acima do pré-crise sanitária; supermercados, 9,6% acima; veículos, 9,0% acima; combustíveis e lubrificantes, 6,8% acima; e material de construção, 3,1% acima. Na direção oposta, os outros artigos de uso pessoal e domésticos estão 6,2% abaixo do nível de fevereiro de 2020; equipamentos de informática e comunicação, 7,9% abaixo; móveis e eletrodomésticos, 10,8% aquém; tecidos, vestuário e calçados, 19,2% abaixo; e livros e papelaria, 44,3% abaixo.
A previsão para o desempenho do varejo em 2024 passa a ter viés de alta, ainda que haja expectativa de certa volatilidade nas vendas nos próximos meses, apontaram as analistas Isabela Tavares e Giulia Mazzieri, da Tendências Consultoria Integrada.
“A manutenção de preços elevados de alimentos in natura (efeito das condições climáticas adversas sobre a oferta) impede o maior crescimento das vendas de supermercados ao longo do ano. No entanto, no segundo semestre, a perspectiva é de níveis mais baixos de juros bancários, inadimplência e comprometimento de renda, e os avanços da massa de renda beneficiam o maior consumo das famílias”, escreveram Tavares e Mazzieri.
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