Há 25 anos, a tradicional “praia” do paulistano, o shopping center, passou a abrir aos domingos. Hoje, o domingo é o segundo melhor dia de vendas para esses centros comerciais, mesmo com as lojas abertas por um período menor, de seis horas, a metade de um dia comum. Só perde para o sábado.
A força do comércio e dos shoppings aos domingos, autorizada por lei federal em 1997, mudou o comportamento da cidade São Paulo. Antes vazia aos finais de semana, a capital paulista passou a atrair turistas em busca de lazer e compras. Isso desencadeou um efeito dominó, agregando mais vendas a novos setores.
Aristides Cury, presidente da Associação dos Dirigentes de Vendas e Marketing do Brasil (ADVB), observa que a motivação de abrir os shoppings aos domingos foi ter uma cidade mais competitiva no turismo e no lazer. “Mas, 25 anos depois, concluímos que o turismo foi o menor beneficiado.” Quem saiu ganhando foi o comércio – e em vários segmentos, como a venda de imóveis, por exemplo.
“Para o mercado imobiliário, essa iniciativa foi extremamente positiva, pois não só contribuiu para as vendas e a geração de empregos, como também provocou uma mudança de comportamento e aumento do fluxo nos stands de vendas”, afirma o presidente da Associação Brasileira das Incorporadoras (Abrainc), Luiz França. Isso porque é no final de semana que as famílias geralmente têm disponibilidade para discutir a compra da casa própria.
Para Raul Souza Sulszbacher, presidente do São Paulo Convention&Visitors Bureau, que capitaneou o movimento para liberação do comércio aos domingos, com a participação de órgãos de imprensa, entidades do comércio e até uma campanha publicitária, negociar abertura com todos os atores envolvidos “foi um parto”. A maioria dos prefeitos não queria e havia até oposição religiosa, porque domingo é um dia de missa e oração, lembra. Fora isso, os sindicatos alegavam que os trabalhadores seriam escravizados.
Estratégia a conta-gotas
Sulszbacher conta que a estratégia apara atingir um consenso da sociedade sobre o tema foi longa. No final dos anos 1980, iniciou-se uma campanha onde os shoppings abriam no domingo anterior às datas comemorativas, como Dia das Mães, dos Pais, por exemplo. Com isso, a ideia começou a ser disseminada.
O publicitário Milton Cebola Mastrocessário, ex-diretor de criação da agência McCann Erickson, lembra que o tom da campanha era divertido e leve. “A gente tinha que conquistar a simpatia da população.” Afinal, colocar as pessoas para trabalhar aos domingos era um tema delicado. Ele cita como exemplo o texto da campanha de abertura de um domingo que antecedeu o Dia dos Pais: “Não são só as igrejas que vão abrir neste domingo, os shoppings também. Para alegria dos pais”.
Além da campanha publicitária, uma comitiva de varejistas e sindicalistas viajou aos Estados Unidos, onde o comércio funcionava nesse dia, para avaliar os impactos.
O sinal verde veio na gestão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, quando uma lei federal passou a considerar o comércio como atividade essencial. E a regulação do funcionamento das lojas aos domingos e feriados ficou a cargo dos prefeitos.
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Nas contas de Sulszbacher, a abertura aos domingos das lojas de shoppings aumentou em 20% o emprego e agregou dois meses e meio de faturamento ao varejo.
No setor de material de construção, por exemplo, o domingo hoje é o melhor dia de vendas, segundo Roberto Mateus Ordine, vice-presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), entidade que também participou desse movimento. No segmento, ele conta que há trabalhadores que disputam o direito de trabalhar aos domingos porque a comissão sobre as vendas acaba sendo mais elevada.
Após a abertura aos domingos, São Paulo se transformou e passou a ser reconhecida mundialmente como uma cidade onde é possível encontrar qualquer mercadoria 24 horas por dia, diz Ordine.
Para Francisco Mesquita Neto, presidente do Estadão, que participou ativamente desse movimento, é difícil imaginar o que seria de São Paulo com os shoppings e o comércio fechado aos domingos.
Caio Luiz de Carvalho, diretor da TV Bandeirantes, que endossou o movimento, lembra que a inspiração veio de Nova York (EUA), uma cidade fabril que nos anos 1970 era falida e que buscou, justamente na área de serviços e entretenimento, uma saída.
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