É sabido que, da mesma forma como o sempre inesperado da morte impacta com muito mais violência a sensibilidade de crianças jovens, por outro lado, a sua capacidade de superação e resiliência encurtam, comparativamente, a fase do transe dolorido. Se o tempo é o senhor da cura, em almas embebidas de esperança (nas quais a juventude confere a certeza da imortalidade), a morte impacta, mas sempre enquanto algo distante por mais que possa ter se avizinhado.
O fenômeno acima apontado (reação universal e óbvia no que se refere "à anormalidade" da certeza humana) perde a validade nestes tempos nos quais a morte anda pelas ruas recolhendo multidões saudáveis, jovens e, sobretudo, desavisadas. O desaviso fica como indubitável comprovação de que a "velha senhora" só visita os vizinhos.
Aliás, num parênteses de desabafo, nada mais inútil, irritante e descabido do que o comentário, "essa é a maior certeza da vida". A maior certeza da vida é querer viver! Se as palavras não conseguem enunciar o inexorável da morte, o silêncio é a sua melhor expressão!
Em tempos normais, a preparação da comunidade escolar para viver o luto era uma tarefa dolorida, mas socialmente suportada. Enquanto animal grupal, a liturgia do luto sempre se constituiu na amenização da dor pela sua socialização, num leque multifacetado exprimindo épocas e culturas, mas de inequívoca e necessária presença.
Neste contexto de excepcionalidade em que não podemos contar com a presença de um grupo coeso na comunidade escolar, o hibridismo didático não consegue suprir a necessidade do calor humano, onde contatos esporádicos ou, sobretudo, a frieza das máquinas em nada amenizam a dor.
Se nas sociedades capitalistas contemporâneas a celebração da morte se esvaziou e perdeu parte de seu caráter terapêutico, a necessidade dessas formas de culto permanece. Por mais que se queira simplificar e racionalizar a morte, a necessidade de conforto psicológico exige, mesmo que minimizados, rituais próprios e indispensáveis para a confirmação de uma das essências de nossa humanidade.
Professor Henrique Vailati Neto é diretor do Colégio FAAP - SP. Formado em História e Pedagogia, com mestrado em Administração. É professor universitário nas disciplinas de Sociologia e Ciência Política. Tem quatro filhos e quatro netos.
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