"Manipulação do comportamento do usuário pelo controle de dados na internet"
Por Lucas Felpi
No livro 1984 de George Orwell, é retratado um futuro distópico em que um Estado totalitário controla e manipula toda forma de registro histórico e contemporâneo, a fim de moldar a opinião pública a favor dos governantes. Nesse sentido, a narrativa foca na trajetória de Winston, um funcionário do contraditório Ministério da Verdade que diariamente analisa e altera notícias e conteúdos midiáticos para favorecer a imagem do Partido e formar a população através de tal ótica. Fora da ficção, é fato que a realidade apresentada por Orwell pode ser relacionada ao mundo cibernético do século XXI: gradativamente, os algoritmos e sistemas de inteligência artificial corroboram para a restrição de informações disponíveis e para a influência comportamental do público, preso em uma grande bolha sociocultural.
Em primeiro lugar, é importante destacar que, em função das novas tecnologias, internautas são cada vez mais expostos à uma gama limitada de dados e conteúdos na internet, consequência do desenvolvimento de mecanismos filtradores de informações a partir do uso diário individual. De acordo com o filósofo Zygmund Bauman, vive-se atualmente um período de liberdade ilusória, já que o mundo globalizado não só possibilitou novas formas de interação com o conhecimento, mas também abriu portas para a manipulação e alienação semelhantes vistas em "1984". Assim, os usuários são inconscientemente analisados pelos sistemas e lhes é apresentado apenas o mais atrativo para o consumo pessoal.
Por conseguinte, presencia-se um forte poder de influência desses algoritmos no comportamento da coletividade cibernética: ao observar somente o que lhe interessa e o que foi escolhido para ele, o indivíduo tende a continuar consumindo as mesmas coisas e fechar os olhos para a diversidade de opções disponíveis. Em um episódio da série televisiva Black Mirror, por exemplo, um aplicativo pareava pessoas para relacionamentos com base em estatísticas e restringia as possibilidades para apenas as que a máquina indicava - tornando o usuário passivo na escolha. Paralelamente, esse é o objetivo da indústria cultural para os pensadores da Escola de Frankfurt: produzir conteúdos a partir do padrão de gosto do público, para direcioná-lo, torná-lo homogêneo e, logo, facilmente atingível.
Portanto, é mister que o Estado tome providências para amenizar o quadro atual. Para a conscientização da população brasileira a respeito do problema, urge que o Ministério de Educação e Cultura (MEC) crie, por meio de verbas governamentais, campanhas publicitárias nas redes sociais que detalhem o funcionamento dos algoritmos inteligentes nessas ferramentas e advirtam os internautas do perigo da alienação, sugerindo ao interlocutor criar o hábito de buscar informações de fontes variadas e manter em mente o filtro a que ele é submetido. Somente assim, será possível combater a passividade de muitos dos que utilizam a internet no país e, ademais, estourar a bolha que, da mesma forma que o Ministério da Verdade construiu em Winston de "1984", as novas tecnologias estão construindo nos cidadãos do século XXI.
Enem 2018
O Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) foi realizado nos dias 4 e 11 de novembro do ano passado, e o tema proposto pelo exame para a redação foi "Manipulação do comportamento do usuário pelo controle de dados na internet". De acordo com o Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira), foram corrigidas mais de quatro milhões de redações.
Apenas 55 candidatos tiraram nota mil na redação do Enem 2018 e um deles foi o estudante Lucas Felpi, 17 anos, da unidade Granja Vianna do Colégio Rio Branco, em São Paulo. Além da nota máxima na redação, Felpi também tirou 988,7 em Matemática.
Lucas, que também prestou Fuvest e Unicamp para o curso de Engenharia da Computação, recentemente recebeu a notícia de que foi aprovado em uma universidade no exterior, o Georgia Institute of Technology, Atlanta, EUA, no curso Ciência da Computação, pois pretende atuar na área de Tecnologia.
A divulgação da nota do estudante e o fato de ter citado, entre outras referências, uma das séries de maior sucesso do Netflix, a britânica Black Mirror, que retrata a inquietação coletiva em torno da tecnologia na atualidade, gerou muita repercussão e curiosidade nas redes sociais.
Diante do grande número de internautas que pediram para ler a redação, Lucas decidiu divulgar o texto, com o objetivo principal de contribuir com outros estudantes que fizeram o exame ou farão esse ano.
"Fiquei muito surpreso com a quantidade de pessoas entrando em contato e pedindo a redação. Eu quero compartilhar mesmo o texto, para ajudar todos os que estão estudando!", explicou Felpi.
Além do alto rendimento acadêmico, durante todo o Ensino Médio, no Colégio Rio Branco, Lucas sempre demonstrou interesse e se envolveu em diversos programas de estudos compartilhados com professores e alunos, e importantes projetos colaborativos desenvolvidos em equipe.
Segundo ele, com a repercussão sobre o Enem, o próximo passo será usar as redes para dar dicas e orientações sobre como estudar para a prova e se preparar para a redação.
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