As aulas nas universidades não são mais apenas nas salas: o câmpus foi estendido. Instituições de ensino superior têm firmado parcerias que criam oportunidades para estudantes desenvolverem soluções para problemas reais, o que facilita o acesso ao mundo do trabalho, antes mesmo de concluírem a graduação.
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O estreitamento da relação atende aos interesses dos alunos. Pesquisa do Instituto Semesp aponta que para 97% dos universitários a faculdade ideal é aquela que faz parcerias com empregadoras para ajudá-los a conseguir emprego na área.
Em outra publicação do Semesp, 36,9% dos estudantes entrevistados apontaram que ingressam no ensino superior com a expectativa de emprego na área em que estudam; e 28,4% disseram que não atingir esse objetivo era o maior medo na hora de começar a graduação.
Atender a essa expectativa de empregabilidade exige ações efetivas de aproximação entre academia e mercado, afirma o reitor do Centro Universitário FEI, Vagner Bernal Barbeta. “A longo prazo, a tendência é cada vez mais essas interações se fortalecerem. A empresa começa a enxergar na universidade um ambiente onde busca talentos. Mas também pode influenciar e ajudar a desenhar os currículos das universidades.”
Na FEI, os modelos de parceria seguem formatos variados. Em um dos contratos de cooperação, uma indústria de balanças, a Toledo do Brasil, montou laboratório levando a infraestrutura da empresa para dentro do câmpus para que os estudantes de cursos como Ciência da Computação, Engenharia Elétrica e Engenharia Mecânica possam estagiar e estudar no mesmo endereço.
Já os estudantes de Engenharia Química desfrutam de parceria com a Basf, unidade da indústria química. Isso permite que durante quatro meses visitem a planta da empresa e recebam orientações de técnicos para desenvolver soluções para algumas de suas dificuldades.
Metrô e Chilli Beans
Os desafios do sistema metroviário de São Paulo também entram no radar dos alunos da FEI, que, a partir de diálogos com a empresa, tratam desses temas em seus trabalhos de conclusão de curso (TCCs). No ano passado, mais de 50 universitários se inspiraram em questões da Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô) para escrever seus projetos.
“É importante que a empresa compartilhe suas dores para que isso se torne objeto de estudo e para que o aluno trabalhe a partir de problemas reais. A interação entre empresa e universidade faz com que a troca seja um ganha-ganha”, diz o reitor da FEI.
No Centro Universitário Belas Artes, o “gostinho” do mercado de trabalho se dá por meio de concursos, nos quais os estudantes apresentam soluções para empresas parceiras da instituição. A Chilli Beans, por exemplo, todo ano lança um concurso para que os alunos de Design e Arte criem uma coleção limitada de óculos e relógios.
Já para a marca Ocean Way, da área de moda, os estudantes foram desafiados a desenvolver uma estampa para camisetas. Para a Phytoervas, empresa de cosméticos, os universitários fizeram embalagens para a linha home.
“Esses concursos estreitam os laços com as empresas, que passam a ser companheiras de trabalho e ainda podem dar feedback de como os alunos precisam chegar lá na ponta, depois de formados”, afirma Josiane Tonelotto, superintendente acadêmica da Belas Artes.
A instituição oferta uma plataforma com oportunidades de estágio aos estudantes durante o curso e hoje 75% dos que foram contratados conseguiram o emprego porque antes já haviam feito estágio.
“Acreditamos que a melhor forma de fazer educação é com prática. Por isso, 50% da nossa matriz curricular contempla essas iniciativas. Desde o 1º semestre do curso, o aluno é colocado em situações similares às que encontrará na vida real”, diz Josiane.
Outra estratégia é convidar profissionais para opinar sobre trabalhos de fim de semestre dos universitários, como se fosse uma aula final, garantindo que sejam avaliados do ponto de vista do mercado.
O objetivo da instituição é fazer com que o estudante, ainda na graduação, receba feedbacks e desenvolva competências e habilidades que ainda não domina plenamente.
Imersões e estágios
Imersões e estágios são algumas das iniciativas da Faculdade Belavista para aproximar alunos dos cursos de Direito e Economia das oportunidades profissionais. Uma vez por ano, estudantes deixam as salas de aula para conhecer uma região do País, onde conversam com empresários, políticos e representantes da comunidade.
Neste ano, a imersão começou em Goiânia, com visitas companhias do setor agropecuário e logístico, conheceram uma estância onde há produção de leite. Seguiram depois até Cavalcante, na região da Chapada dos Veadeiros, onde conversaram com a população quilombola. A viagem terminou em Brasília, onde foram recebidos por juristas e diplomatas.
Além disso, Milena Seabra, diretora executiva da Faculdade Belavista, conta que alunos do Direito têm a chance de aprender diretamente com escritórios renomados, por meio de palestras, experiências imersivas e estágios. Os de Economia, por sua vez, podem experimentar o mercado financeiro e de capitais por meio de estágios durante as férias de verão em fintechs, corretoras e gestoras.
A proximidade com as demandas do mundo do trabalho também se dá pela expertise do quadro de professores, como reforça a diretora executiva. “Nossos cursos são ministrados por professores expoentes em suas áreas, que respondem por cadeiras ou disciplinas em renomadas instituições. Eles têm contato direto com executivos, empreendedores, juristas e empresários, uma forma de facilitar ainda mais a inclusão dos alunos no mundo corporativo.”
‘Perspectiva é sempre a de promover a inserção’
A modalidade com alinhamento mais direto ao mercado é a Educação Profissional e Tecnológica (EPT), que oferta cursos superiores de tecnologia. Em São Paulo, são opções as Faculdades de Tecnologia do Estado de São Paulo (Fatecs).
São 79 unidades e 96 cursos com duração de 3 anos e foco na preparação profissional dos estudantes. Eles compreendem dez eixos: Ambiente e Saúde; Controle e Processos Industriais; Gestão e Negócios; Informação e Comunicação; Infraestrutura; Produção Alimentícia; Produção Cultural e Design; Produção Industrial; Recursos Naturais; e Turismo, Hospitalidade e Lazer.
Nessa modalidade, a conversa com o mercado de trabalho acontece desde a concepção dos currículos e projetos pedagógicos dos cursos, diz André Luiz Braun Galvão, coordenador pedagógico das Fatecs.
“Em função das diretrizes curriculares gerais da educação profissional e tecnológica, esta articulação é fundamental para a construção coerente de itinerários formativos, que visam ao preparo para o exercício das profissões. A perspectiva é sempre a de promover a inserção laboral dos estudantes”, diz.
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