O Brasil participou, pela primeira vez, da avaliação global TIMSS, promovida pela Associação Internacional para a Avaliação do Desempenho Educacional (IEA). Realizado a cada quatro anos, desde 1995, o TIMSS examina o desempenho de estudantes do 4º e 8º ano do ensino fundamental em Matemática e Ciências, reunindo dados de diversos países.
Nesta edição, foram avaliados em 2023 alunos de 64 países (incluindo o Brasil) regiões de referência. Os dados revelam um cenário alarmante. No 4º ano do fundamental, 51% dos estudantes brasileiros não alcançam o nível básico de compreensão da Matemática, ou seja, não sabem fazer coisas básicas como somar e subtrair números inteiros com até três algarismos, multiplicar e dividir números inteiros de um algarismo e resolver problemas simples que envolvam essas noções.
A média brasileira na etapa foi de 400 pontos, 103 pontos abaixo da média dos países participantes, superando apenas Marrocos, Kuwait e África do Sul. Para efeito de comparação, esse desempenho equivale ao patamar alcançado por 95% dos estudantes de 15 países desenvolvidos, como Irlanda, Bélgica, Dinamarca, República Tcheca, Noruega e Polônia.
Isso significa que, nessas nações, praticamente não há estudantes que atingem menos de 400 pontos (para análise de política pública, é comum a exclusão dos extremos, isto é, dos 5% de mais alto desempenho e os 5% de mais baixo, que chamamos de outliers).
No 8º ano, a situação se agrava: 62% dos brasileiros abaixo do nível básico, com dificuldades em habilidades fundamentais, como reconhecer formas básicas e interpretar imagens e gráficos que envolvam matemática. Isso significa que as crianças brasileiras ficam três anos atrasados em relação aos estudantes dos países desenvolvidos.
Diante disso, os dados trazem um veredito: é preciso dar à Matemática a atenção que ela exige no sistema educacional brasileiro, sob pena de termos paralisia no desenvolvimento intelectual, científico e cidadão dos nossos estudantes.
A dificuldade com a aprendizagem na disciplina não é novidade, e o TIMSS reforça a urgência de olhar mais intencional. Embora os anos iniciais do fundamental tenham apresentado avanços importantes no Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), prova do Ministério da Educação (MEC), nas últimas edições, é evidente que o País ainda está distante de oferecer, desde o início da trajetória escolar, educação de qualidade para todos. É preciso desnaturalizar o fracasso do ensino e da aprendizagem de matemática no país.
Precisamos entender que lacunas de aprendizado, que começam nas séries iniciais, acumulam-se ao longo dos anos, prejudicando as aprendizagens mais complexas nas etapas seguintes. É um efeito perverso e em cadeia, causando inclusive efeito correlacionado - o sentimento que muitas crianças e adolescentes experimentam de incapacidade para aprender matemática.
A preocupação com a disciplina já foi destacada em estudos anteriores do Iede, como no documento O cenário do ensino de Matemática no Brasil: O que dizem os indicadores nacionais e internacionais. O trabalho revelou que, entre mais de 47 mil escolas que oferecem os anos finais do fundamental, apenas 71 foram classificadas como unidades com bons resultados em Matemática em perspectiva nacional. E só se chegou a essas 71 por não serem adotados critérios muito exigentes.
É urgente criarmos bons programas de recomposição das aprendizagens e um pacto nacional pela aprendizagem da Matemática.
O plano exige reflexões:
- como garantir bons professores de Matemática nas escolas?
- como engajar os alunos nas disciplinas com professores que podem ter aversão à área?
- os direcionamentos dos currículos são claros e devidamente exigentes?
- as avaliações nacionais estão norteando adequadamente o trabalho das redes?
- o avanço demandará muitas discussões e ações dos tomadores de decisão em educação, que só acontecerão se o ensino de Matemática passar a ser uma agenda prioritária no País.
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