A Redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2024 propôs neste domingo, 3, o tema “Desafios para a valorização da herança africana no Brasil”, debate que tem crescido no País nos últimos anos. De forma indireta, a abordagem também passa por estratégias para superar o racismo e as desigualdades, mas o candidato deve discutir os aspectos positivos desse legado.
Uma das possibilidades, segundo os professores de cursinho pré-vestibular ouvidos pelo Estadão, é trazer referências e repertórios consagrados na literatura e na cultura brasileira sobre o assunto. Alguns dos autores que abordam o tema da herança africana são:
- Djamila Ribeiro: filósofa, escritora, pesquisadora e ativista antirracista e feminista, ela é autora de livros como Pequeno manual antirracista, Quem tem medo do feminismo negro? e Lugar de Fala
- Lélia Gonzales: filósofa, antropóloga, professora e escritora, também é referência nos estudos e debates de gênero, raça e classe no Brasil; é autora ou co-autora de livros como Lugar de negro, Por um Feminismo Afro-Latino-Americano e Interseccionalidades: pioneiras do feminismo negro brasileiro.
- Conceição Evaristo: linguista, pesquisadora e escritora afro-brasileira, ela é autora de diferentes gêneros literários, desde romances, até poesias, contos e ensaios; dentre suas obras, estão Ponciá Vicêncio, Olhos d’água e Canção para ninar menino grande.
Essas obras, segundo professor de Redação do Curso Anglo, Sérgio Paganim, podem ajudar o candidato a traçar perspectiva de análise histórica do histórico colonial escravocrata brasileiro e o consequente problema de desvalorização da herança africana. Além disso, direcionam o olhar para o presente, para as razões e os efeitos dessa valorização estar aquém do necessário.
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O professor ressalta ainda outras obras, como Casa-Grande & Senzala, de Gilberto Freyre, para fazer a análise histórica, ou “o mito das três raças”, conceito desenvolvido em obras de autores como Darcy Ribeiro, Florestan Fernandes e Lilia Schwarcz.
Outros pontos que podem ser trabalhados pelos candidatos são o respeito às diversidades e resgate e construção de memória, destaca Thiago Braga, professor do Colégio e Sistema pH. Mas, na avaliação dele, é preciso que o aluno se atente que o tema da redação deste ano não é diretamente sobre racismo, mas sobre a valorização da cultura africana.
“Há muitos argumentos que vão tocar na desigualdade cultural e no racismo, mas é importante pontuar que não se trata de um tema de racismo ou de desigualdade. É um tema de memória, de resgate e valorização de aspectos culturais africanos que são importantíssimos para a formação da cultura brasileira”, diz.
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Jéssica Dorta, coordenadora da equipe redação da Oficina do Estudante, sugere ao participante recorrer a vozes que evocam e sustentam a cultura africana no Brasil, como o filósofo quilombola Antônio Bispo dos Santos (Nego Bispo), que foi cobrado também no vestibular Unicamp 2025.
A Lei 10.639/2003, que determina a inclusão de história e cultura africanas no currículo escolar, também é um ponto importante para ser abordado na redação, diante das dificuldades de colocar essa proposta em prática nas várias etapas de ensino. Pesquisa no ano passado mostrou que sete em cada dez secretarias municipais de Educação realizam pouca ou nenhuma ação para implementar esses conteúdos.
Uma das propostas de intervenção possíveis seria fortalecer essa lei, afirma a professora e coordenadora de Língua Portuguesa da Escola Bilíngue Pueri Domus Danielle Capriolli. “Precisa ser colocada mais no dia a dia dos alunos, com a literatura, com a história do povo africano e toda a contribuição que vem deles”, diz.
Dentre os diversos formatos possíveis para as heranças africanas, estão a cultural, religiosa, musical, gastronômica, de costumes, de formação social e também nos esportes.
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