Ensino Waldorf completa 100 anos em expansão no Brasil

Método, que espera criança amadurecer para alfabetização, não usa boletins, notas nem material didático; País tem 88 escolas

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Colégios como o Rudolf Steiner apostam em salas mais aconchegantes; para as crianças pequenas, espaço simula uma casa Foto: Werther Santana/Estadão

SÃO PAULO  - As aulas de Artes e Música são consideradas tão importantes quanto Língua Portuguesa ou Matemática. Até o ensino médio, os alunos têm todas as disciplinas ministradas por um mesmo professor, não possuem boletins com notas nem livros didáticos e não usam computadores ou aparelhos eletrônicos nas atividades escolares. Apesar de seguir na contramão do que faz a maioria das escolas tradicionais – que busca dar cada vez mais conteúdo e oferecer mais tecnologia em sala –, a pedagogia Waldorf completa cem anos em 2019 e está em expansão no País. 

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Segundo a Federação das Escolas Waldorf, nos últimos dez anos o número de unidades que segue o método cresceu 200%. O Brasil tem 88 escolas filiadas, reunindo mais de 16 mil alunos e cerca de 1,7 mil professores. Há ainda outros 170 colégios em processo de filiação. 

Para os educadores, o aumento na procura se deve a uma mudança de preocupação das famílias e também à abertura e desmistificação da pedagogia. “Havia um estereótipo de que nossas escolas são hippies, que não ensinamos o conteúdo e as crianças fazem o que querem. Quando passamos a explicar e mostrar o trabalho, o preconceito caiu e as escolas passaram a ter mais procura”, diz Melanie Guerra, diretora da Faculdade Rudolf Steiner, a primeira no País a usar o método na graduação, no curso de Pedagogia.

As escolas Waldorf se diferenciam das demais em uma série de aspectos. A alfabetização, por exemplo, só começa aos 7 anos, quando se entende que as crianças já adquiriram maturidade. O Ministério da Educação e a maioria das escolas particulares defendem que a introdução ao processo deve começar o quanto antes, ainda na educação infantil – a Base Nacional Comum Curricular prevê que ao fim dos 7 anos a criança já esteja plenamente alfabetizada. 

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“Esperamos a criança ter domínio do próprio corpo, e motricidade fina e grossa bem desenvolvidas. Assim, a alfabetização acontece de forma mais fácil e natural. Não temos pressa”, diz Melanie. Segundo ela, essa visão diferente de ritmo orienta todos os processos educativos. As educadoras dizem que, apesar de o conteúdo não ser a prioridade, ele não deixa de ser explorados. 

Também chama a atenção a organização dos espaços, que não segue o modelo convencional. Não há carteiras enfileiradas nas salas, por exemplo. Na educação infantil, o espaço se assemelha a uma casa, como sala de estar e cozinha. 

“Para aprender, a criança nessa idade precisa de um ambiente acolhedor e aconchegante, como o de casa. Nesse espaço, elas brincam, cozinham, desenham, tudo como fariam se estivessem em casa”, diz Melanie. Se privilegia o tempo em que o aluno passa na parte externa da escola. 

Outras habilidades. Em todos os anos escolares, os colégios Waldorf dedicam o mesmo tempo e esforço para ensinar os conteúdos tradicionais e desenvolver outras habilidades. E isso se evidencia na forma de apresentação do conteúdo. Gestora pedagógica, Walkyria Machado conta que no período em que falam sobre Revolução Industrial, por exemplo, o tema é abordado tanto dentro das disciplinas convencionais como na aula de tecelagem.  

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“Primeiro eles confeccionam as peças manualmente, depois apresentamos as máquinas, e eles veem como o processo de criação fica mais fácil e rápido, e entendem o que de fato foi a Revolução Industrial”, afirma. A escola tem ainda oficinas para trabalhar mecânica, elétrica e criação eletrônica. 

A partir do 6.º ano do ensino fundamental, além do professor de classe que dá aula de todas as disciplinas regulares, os alunos têm 7 professores das matérias de: trabalhos manuais, euritmia, educação física, música, inglês, alemão, marcenaria. Antes dessa série, o professor de classe pode pedir a colaboração de um especialista em alguma matéria, caso sinta necessidade. 

Receio.Ex-aluno, o administrador Paulo Camargo, de 49 anos, conta que o formato da escola o deixou um pouco ansioso quando se preparava para o vestibular. “Pensava que estava perdendo tempo tendo aula de tecelagem ou música e que devia me concentrar só no conteúdo das provas. Hoje, vejo que a preocupação não tinha sentido. Entrei na faculdade e não tive dificuldade de acompanhar o curso.” Hoje, suas filhas, de 7 e 9 anos, estudam na escola. 

Segundo Walkyria, dois terços dos alunos que completam o ensino médio entram em seguida na universidade. O restante opta por trabalhos voluntários ou vai para áreas que não exigem diploma de ensino superior. 

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Camargo diz que a pedagogia também exige comprometimento dos pais. “Nós não somos radicais – a maioria das famílias nem tem tevê –, mas controlamos o tempo no celular, não permitimos jogos eletrônicos. Não adianta não ter acesso na escola e em casa ficar só com eletrônicos, sem estímulos físicos.” 

Ana Paula Yazbek, especialista em primeira infância e formadora de professores no Instituto Avisa lá, diz que, como as escolas Waldorf têm formato fora do convencional, é preciso haver alinhamento e parceria com a família para não prejudicar a criança. “Os pais precisam entender e aceitar que o filho pode demorar mais pra ler, por exemplo. Não adianta forçar o processo em casa por medo de ela ficar para trás, pode gerar conflito.” 

Ela lembra ainda que nem todos os conceitos e princípios são exclusivos da pedagogia Waldorf – outras metodologias, como Montessori, Pikler e Reggio Emília (usadas nas escolas construtivistas), além do próprio MEC, preconizam a educação integral, com respeitando à individualidade do aluno. “Não há uma fórmula única ou superior para desenvolver as crianças.”

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