Para voltar a receber estudantes, colégios e redes de ensino em todo o Brasil vêm pensando adequações para as salas de aula. As escolas estão fechadas desde março para conter a disseminação do coronavírus, mas, nos últimos meses, alguns Estados e prefeituras autorizaram a volta gradual às aulas.
Na capital paulista, parte das escolas particulares contratou a assessoria de hospitais para elaborar seus protocolos de retomada. Além de diretrizes como uso de máscaras e medição de temperatura, as consultorias avaliaram as salas de aulas e, de modo geral, indicaram a necessidade de que as escolas desliguem o ar-condicionado e abram janelas e portas.
Nesta terça-feira, um estudo publicado na revista Physics of Fluids, do Instituto Americano de Física, mostrou o caminho do coronavírus em uma sala de aula por meio de simulação computacional. A pesquisa apontou que, mesmo com distância de mais de dois metros entre os estudantes, partículas minúsculas suspensas no ar podem circular entre os estudantes.
Medidas como abrir janelas e instalar barreiras de vidro ou acrílico nas carteiras, segundo a pesquisa, são capazes de reduzir os riscos.
O estudo, realizado por pesquisadores da Universidade do Novo México (EUA), considerou um modelo de sala de aula com sistema de ar-condicionado central, que faz a troca de ar com o ambiente externo. Sistemas de ar-condicionado central como o considerado pelo estudo são raros em salas de aula brasileiras.
Esses modelos poderiam até reduzir os riscos de contaminação porque renovariam o ar que entra na sala de aula, mas a maioria das escolas do País usa sistemas que apenas refrigeram o ambiente, sem troca de ar. Nesses casos, a fim de manter o espaço climatizado, a tendência é fechar o ambiente, o que aumenta o risco de contaminação.
Escolas particulares de São Paulo que tiveram assessoria do Hospital Sírio-Libanês para elaborar seus planos de volta às aulas foram orientadas a desligar o ar-condicionado e abrir as janelas e portas.
"Os equipamentos de ar-condicionado nas escolas são do tipo split, que não fazem a renovação de ar. A gente teve de reforçar a renovação de ar de forma natural, com janelas e portas abertas", explica Marina Mattiello Gabriele, médica do programa Saúde Escolar do Sírio. Desde o início do mês, parte dos colégios paulistanos reabriu para receber os alunos em atividades extracurriculares.
Segundo Marina, a equipe do hospital fez visitas presenciais às escolas que contrataram o serviço (mais de 50) para avaliar as classes - em alguns casos, foi recomendado evitar o uso de determinadas salas de aula, que não apresentavam condições de ventilação.
A diretriz do hospital sobre a distância mínima entre os alunos dentro de uma sala de aula é de 1,5 metro, mesmo valor considerado pelo governo estadual e a Prefeitura de São Paulo para as escolas públicas.
"O uso de máscara e o distanciamento reduzem e muito a chance de possível transmissão", diz Marina. No caso das escolas particulares assessoradas pelo Sírio, as barreiras de acrílico nas carteiras só foram consideradas nos casos em que era impossível manter a distância de 1,5 metro.
No Colégio Bandeirantes, na zona sul de São Paulo, não deve haver barreiras nas carteiras dos alunos, mas o professor foi orientado a se movimentar menos pela sala de aula. As janelas do Band devem ficar abertas e o ar-condicionado, desligado.
"Isso pode ter alguma perda por causa de ruídos, mas, nesse momento, é mais crítico manter o ambiente salutar em termos de distanciamento", diz Eduardo Tambor, diretor de operação do Colégio Bandeirantes. Estudantes em uma sala não deverão ter contato com outros alunos da escola e o período do recreio foi eliminado.
Nas escolas estaduais paulistas, as diretrizes da Secretaria Estadual da Educação são de abertura de janelas e portas nas salas de aula e para que se evite o uso de ar-condicionado. Segundo Cecília Cruz, coordenadora de Gestão da Secretaria Estadual de Educação, seria difícil garantir que escolas estivessem usando o ar-condicionado para circulação do ar no ambiente e não para a refrigeração.
Escolas que identificarem que não têm condições de garantir ventilação adequada nas salas de aula, diz Cecília, não devem reabrir. "Quando escrevemos nossos protocolos, deixamos explícito que as escolas que não têm condição de garantir (a segurança) não devem retornar. Na eventualidade de a sala de não ter boa circulação de ar, a recomendação é que não volte", afirma.
Nas escolas municipais de São Paulo, a recomendação da Prefeitura é para que, com 20% dos estudantes, evite-se o uso do ar-condicionado, mas não é proibido. Um documento elaborado pela Secretaria Municipal de Educação indica que o ideal é manter as salas ventiladas e com as janelas abertas.
"Mas quando isso não for possível, as instalações deverão ser ventiladas frequentemente, com duração de pelo menos 10 minutos de cada vez. As salas de aula e outras salas ocupadas durante o dia devem ser, obrigatoriamente, ventiladas pela manhã – antes da chegada dos estudantes, durante cada recreio, na hora do almoço e à noite, durante a limpeza das instalações."
Especialistas reconhecem que a falta de refrigeração nas salas de aula e a necessidade de usar máscaras podem significar um desafio ainda maior aos estudantes e professores considerando as altas temperaturas registradas em todo o Estado.
Para Erick Campos, engenheiro da Universidade Federal de Juiz de Fora, uma alternativa para melhorar o conforto térmico é o uso de climatizadores, que são feitos para ser ligados com as janelas abertas. Já adaptar os sistemas de ar-condicionado convencionais para que renovem o ar, diz, pode sair caro. "Sistemas de hospitais são plenamente adaptados, mas o investimento para fazer toda essa adaptação acaba sendo alto."
A Organização Mundial da Saúde (OMS) indica que a ventilação natural, com janelas abertas, deve ser usada dentro de edifícios sempre que possível, sem recircular o ar. "Se sistemas de aquecimento, ventilação e ar-condicionado forem usados, eles devem ser regularmente inspecionados, mantidos e limpos", aponta diretriz da OMS.
Leonardo Cozac, engenheiro da Associação Brasileira de Refrigeração, Ar-Condicionado, Ventilação e Aquecimento (Abrava), reconhece que muitos ambientes brasileiros não têm sistemas de ar-condicionado bem instalados, mas pondera que nem sempre abrir portas e janelas é suficiente, principalmente em salas grandes.
"Nas salas que não têm renovação de ar mecânica, é necessário abrir portas e janelas. Mas isso não garante que o ambiente esteja bem ventilado porque depende do clima, se está ventando, do tamanho e da posição das janelas", diz.
Pesquisa da Confederação Nacional dos Municípios (CNM) indicou que 3.275 municípios brasileiros ainda não veem condições sanitárias para retomar as aulas presenciais na rede básica de ensino neste ano. O número equivale a 82% das prefeituras consultadas. Segundo o presidente da entidade, Glademir Aroldi, até mesmo o clima é considerado nessa decisão.
“Na flexibilização de um bar, vai a um bar quem acha que pode ir. Na escola, quando abrir, você faz com que os alunos acabem frequentando, permaneçam por um período longo e voltem para a casa, convivam com pais, avós. É uma situação mais complexa. Em algumas regiões, precisa do ar-condicionado ligado o tempo todo”, disse.
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