As notas do Enem são um reflexo cristalino das condições socioeconômicas do País. Em cada um dos quatro eixos avaliados pela prova, assim como na redação, o resultado é invariavelmente o mesmo: Sudeste com o melhor desempenho, seguido por Sul, Centro-Oeste, Nordeste e Norte, sempre nessa ordem. Não é por acaso que o Centro-Oeste, região localizada entre o Sul-Sudeste mais desenvolvido e o Norte-Nordeste menos desenvolvido, apresenta uma nota sempre muito próxima à média brasileira.
O cenário indica que o País vive um círculo vicioso: não consegue melhorar a qualidade do ensino na velocidade desejada porque isso depende de avanços nas condições socioeconômicas da população, o que só se consegue quando se oferece ensino de melhor qualidade. Ao mesmo tempo que os resultados do Enem são reflexo de tudo isso, a prova tem peso suficiente para contribuir com o aprimoramento da qualidade de ensino, avalia o consultor Carlos Walter Dorlass. “Por ser uma grande referência de como os alunos deveriam estar ao final do ensino médio, é inevitável que o Enem influencie as estratégias e as práticas pedagógicas das escolas.”
A evolução da nota média registrada na última década em todas as quatro áreas avaliadas é um alento – embora, em contrapartida, possa ser considerada decepcionante por não ter sido tão expressiva. Nos eixos Matemática, Ciências da Natureza e Linguagem, subiu entre 20 e 35 pontos, num universo de 1.000 pontos. Em Ciências Humanas, o quadro é de quase estagnação – apenas 4,66 pontos de crescimento entre 2012 e 2022. O caso da redação foge à regra por ter apresentado um crescimento muito maior, de 143,09 pontos, passando de 509,36 para 652,45, o que pode ter relação com o maior nível de subjetividade na avaliação.
“É necessário ter sempre em mente que o Enem faz parte de um contexto mais amplo da educação brasileira”, enfatiza Romualdo Portela de Oliveira, professor aposentado da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) e diretor de Pesquisa e Avaliação do Cenpec, ONG que desenvolve pesquisas e projetos focados na promoção da qualidade da educação pública. Esse contexto passa pela necessidade de investimentos mais amplos em educação, considerando-se a “dívida educacional” do Brasil, e pela valorização da profissão de professor. “No discurso, todo político diz que priorizará a educação, mas prefeitos e governadores sempre judicializam a discussão sobre o piso salarial da categoria”, diz Oliveira.
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