A Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo (USP) lançou na semana passada o projeto Memória Negra para “reconhecimento e valorização de docentes negros”. Na lista, está a professora emérita da instituição e escritora Marilena Chauí, de 81 anos.
A divulgação do projeto repercutiu nas redes sociais. Parte dos internautas questionou a identificação como de Marilena como negra (preta ou parda). Também motivou reações a inclusão no rol de outra professora: Rose Satiko, docente desde 2005 e coordenadora do Laboratório de Imagem e Som em Antropologia.
Procuradas pelo Estadão, Rose, Marilena e a FFLCH não se manifestaram. Em seu site, a faculdade afirma que o levantamento se baseia na autoidentificação dos docentes.
Até o momento, pelo menos 29 professores negros foram localizados pela equipe do Projeto Memória FFLCH 90 anos. Os perfis dos professores estão no site da universidade, com fotos em preto e branco.
Um dos questionamentos nas redes sociais foi feito pelo professor Wilson Gomes, da Universidade Federal da Bahia. “Com qtos anos vcs descobriram que Marilena Chauí era negra? Eu descobri aos 60″, perguntou em uma publicação com quase 100 mil visualizações na rede social X.
Os comentários dividiram a opinião dos usuários. A autodeclaração é o critério utilizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para identificar a raça das pessoas.
O novo perfil de ingressantes na USP na última década foi o ponto de partida o mapeamento das figuras negras, conforme a faculdade. Menos de 5% dos docentes eram negros em 2023, segundo o anuário oficial. Por outro lado, alunos pretos e pardos de graduação e pós somavam 23,55%.
“A partir das políticas de cotas raciais e sociais, os espaços universitários enegreceram. Estudantes negras e negros trouxeram, finalmente, uma ampliação do perfil das universidades públicas sem, contudo, terem esta mesma representatividade negra por parte do corpo docente”, explica a vice-diretora, Silvana de Souza Nascimento, no site da faculdade.
“Também pretendemos dar visibilidade e realizar pesquisas que envolvam estudantes e servidores não-docentes negros e relembrar e valorizar suas atuações em diferentes âmbitos políticos e sociais”, continua a vice-diretora da FFLCH.
A faculdade ainda não esclareceu se o mapeamento dos professores negros pode ser utilizado em algum tipo de política afirmativa, como priorização em editais, voltada ao corpo docente.
No caso dos alunos que querem ingressar na USP, metade das vagas é reservada para estudantes de escolas públicas. Desse recorte, 37% são direcionadas para pessoas negras (pardos ou pretos) e indígenas (PPIs). Esse número representa o percentual da população de pessoas negras e indígenas no estado de São Paulo.
Bancas raciais para cotistas causaram polêmica
Parte dos internautas, porém, lembrou das bancas de heteroidentificação de candidatos a cotas raciais, que avaliam se os estudantes aprovados autodeclarados pretos ou pardos têm direito à reserva de vagas no vestibular.
No início do ano, em um caso emblemático, a banca da Universidade de São Paulo (USP) rejeitou a autodeclaração de pardo do estudante Alison Rodrigues e cancelou sua matrícula na Faculdade de Medicina. Ele conseguiu a vaga de volta na Justiça.
Na época, a reitoria da USP rechaçou as acusações de “tribunal racial” e disse que os comitês de heteroidentificação servem para evitar fraudes. Prometeu ainda aperfeiçoar o formato, com entrevistas feitas apenas presencialmente.
Houve controvérsias similares em outras universidades que adotaram modelo semelhante, como a Universidade de Brasília (UnB). A análise com base nas características físicas foi validada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2017.
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