Fuvest, Unicamp e Unesp: por que os vestibulares de SP vêm perdendo inscritos?

Enem e fatores como pandemia ajudam a explicar queda no número de inscrições para os exames de seleção das instituições estaduais paulistas

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Por Beatriz Bulhões
Atualização:

Não é só o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) que tem visto queda significativa de inscritos. Tradicionais vestibulares de universidades paulistas - como a Fuvest, da USP, o da Unicamp e o da Unesp - também vêm perdendo candidatos nos últimos anos.

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Uma explicação é o próprio teste federal, que passou a ser usado por essas instituições na oferta de parte das vagas. Outros fatores são os impactos da pandemia, que trouxe déficits de aprendizagem e desestímulo para muitos jovens, sobretudo os mais pobres, que veem nas provas desafio inalcançável, e decidem nem tentar. A necessidade de trabalhar também deixa o sonho do diploma mais distante.

Nas universidades estaduais de Campinas (Unicamp) e Paulista (Unesp), o total de concorrentes é o menor desde 2012: 61,6 mil e 67,5 mil, respectivamente. Já o total de candidatos na Universidade de São Paulo (USP) atingiu o menor índice em 2021, com 110,7 mil inscritos. Neste ano, a Fuvest, cuja 1ª fase será realizada neste domingo, 4, registrou ligeiro aumento, de quase 4 mil vestibulandos, mas ainda distante dos 172 mil registrados em 2013.

Rayssa Campos, da mesma idade e colega de Lívia no COC de Araraquara, no interior paulista, desistiu das universidades estaduais e prefere focar no Enem e em cursos privados Foto: AMANDA ROCHA / ESTADAO CONTEUDO

“É um grande quebra-cabeça, com várias peças”, avalia o coordenador do Curso Anglo, Madson Molina. “Difícil falar de pandemia e não citar também o cenário econômico. Tem muitos alunos que abandonaram o projeto do ensino superior porque tinham de trabalhar. Um jovem que naturalmente seguiria para o ensino superior, mas precisou ir direto para o mercado de trabalho”, avalia ele, que também vê impacto da transição etária no Estado, com a diminuição da quantidade de adolescentes.

A abrangência do Enem, outro dos motivos destacados por Molina, facilitou e barateou a vida dos vestibulandos. Antes, era preciso fazer várias provas, geralmente com poucos dias de diferença, pagar várias taxas de matrícula e até viajar para tentar a sorte em mais de uma instituição. Hoje, apenas com a nota do exame federal é possível concorrer no País todo.

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“Acaba sendo uma estratégia dos candidatos de se dedicarem a uma prova de amplitude nacional e não perderem recursos de tempo com provas regionais, que não sabem terão bom desempenho”, ressalta Mônaco, diretor-executivo da Fuvest.

Alta exigência assusta

Além disso, o nível de exigência das provas paulistas assusta Lívia Cabral, de 17 anos, que mira uma vaga em Medicina. Ela fez a Unicamp e achou o teste mais difícil do que nos anos anteriores - agora conta as horas para a Fuvest. “A dificuldade elevada não acompanha o nosso ritmo de pandemia em EAD (ensino a distância)”, diz.

Com acesso à internet e computador próprio, a jovem ainda conseguia acompanhar as aulas remotas na pandemia. Mas segundo o Instituto Brasileira de Geografia e Estatística (IBGE), porém, 28,2 milhões de brasileiros de 10 anos ou mais não usavam a internet em 2021, sendo 3,6 milhões deles estudantes.

Rayssa Campos, da mesma idade e colega de Lívia no COC de Araraquara, no interior paulista, desistiu das universidades estaduais e prefere focar no Enem e em cursos privados. “Medicina nestas faculdades (USP, Unicamp e Unesp) é desumano, você tem de praticamente gabaritar a prova”, opina a jovem, que diz não ter como ficar quatro ou cinco anos em um pré-vestibular.

“A Fuvest é difícil mesmo. Ela precisa ser difícil, porque o número de interessados é bastante grande. Se fazemos uma prova muito fácil, isso tem um impacto complicado, que é um número elevado de empates, o que deixa tudo ainda mais complexo”, justifica Mônaco, da Fuvest.

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Diretor da Comissão Permanente para o Vestibular da Unicamp (Comvest), José Alves atribui à covid e ao longo período de escolas fechadas grande parte da redução de inscritos. “Isso levou estudantes a ficarem mais desestimulados, é um processo seletivo exigente. Muitos candidatos talvez tenham se sentido pouco preparados para poder enfrentar uma maratona, como essa no caso da Unicamp”, destaca.

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Segundo Alves, foi justamente a carreira de Medicina, uma das mais disputadas na maioria dos processos seletivos, a principal responsável pela queda de inscritos deste ano. Para a entrada em 2023, a relação candidato/vaga para este curso é de 294. Embora alto, essa taxa na edição anterior era de 325 por vaga, ou seja, são 30 estudantes a menos na disputa por uma cadeira.

Procurada para comentar, a Unesp disse, em nota, que “em uma primeira leitura, a variação no número de inscritos no vestibular tem causas multifatoriais e precisa ser compreendida no contexto educacional do País como um todo”. É necessário também, afirma a universidade, “estudo bem detalhado sobre o assunto e necessariamente um recorte temporal maior que o dos últimos três anos, influenciados pela pandemia, para entender se existem questões de fundo em torno da procura atual dos jovens por estudo universitário”.

E como trazer mais alunos?

Mesmo com a alta cobrança de conteúdos e a possibilidade de fazer a prova perto de casa, a baiana Mariana Neri, de 16 anos, decidiu viajar para São Paulo, com uma amiga, com o objetivo de encarar a Fuvest. “O Enem dá poucas vagas para entrar na USP. Acredito que fazendo o vestibular tenho mais chances, por ter mais vagas”, aposta.

Para 2023, a USP oferece oferecerá 11.147 vagas. Desse total 8.230 destinadas para seleção por meio da Fuvest e 2.917 vagas, pelo Enem. “De qualquer formam a gente também passeia e conhece a cidade”, brinca Mariana, que também pretende se formar como médica na universidade paulista.

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Ainda segundo ele, a ligeira alta nesta edição é fruto de uma série de novas ações conduzidas pela fundação. Dentre elas, destaca presença mais forte nas redes sociais e a visita de ex-alunos da USP vindos da rede pública às escolas que frequentaram para incentivar a inscrição dos adolescentes.

“Começamos essa movimentação e intensificamos, sobretudo na 2ª metade de setembro, porque percebemos impacto bastante positivo no número de inscrições que entravam nos dias seguintes das escolas visitadas”, conta Mônaco.

Vaga no exterior também tira alunos das paulistas

Se na maior parte dos casos a baixa renda das famílias é um obstáculo determinante no caminho de jovens pobres até a universidade, do outro lado a perspectiva de ir para fora do País atrai estudantes de escolas particulares de São Paulo.

Lucas Faro, de 17 anos, é um deles. Aluno do colégio Pentágono, o jovem até se inscreveu na Fuvest, mas “apenas por fazer”, em suas palavras. A meta dele é ser aceito em uma universidade dos Estados Unidos ou do Canadá, onde pretende se especializar na área de Economia e Ciência Política. Para se dedicar aos planos no exterior - o processo de admissão envolve também entrevistas e o envio de cartas -, ele abriu mão das provas de Unicamp e Unesp.

O Enem também se tornou uma porta de acesso a instituições de ensino superior no exterior. Por meio de acordos com o governo brasileiro, 51 instituições de ensino portuguesas aceitam a prova no processo de admissão, entre elas as universidades de Coimbra, do Porto e de Lisboa.

Vice-diretor de Inovações Pedagógicas do Pentágono, Bruno Alvarez acena que há ainda o movimento de ficar em São Paulo, mas optar por uma instituição de ponta na rede privada. Entre os nomes mais citados por especialistas, estão as faculdades do Einstein, FGV, Insper e ESPM. “Já ouvi muito um discurso de preferir uma universidade particular na capital do que ir para Unicamp, Unesp, ou até a USP de Ribeirão Preto”, conta.