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Governo Lula edita cartilha que recomenda não dar celular próprio a crianças menores de 12 anos

Versão preliminar do documento traz diretrizes para uso saudável de dispositivos; MEC prepara projeto de lei

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Foto do author Paula Ferreira
Atualização:

BRASÍLIA - Uma cartilha elaborada pelo governo federal para orientar o uso de telas por crianças e adolescentes recomenda que crianças menores de 12 anos não tenham celulares próprios e que o acesso a redes sociais antes dessa idade seja evitado. O documento, ao qual o Estadão teve acesso, já passou por estágio final de revisão de conteúdo, mas aguarda aval de algumas pastas e ainda pode sofrer modificações.

O Guia para uso consciente de telas e dispositivos digitais por crianças e adolescentes está sob coordenação da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom), mas foi construído em conjunto por outras seis pastas além da Secom, como Casa Civil; Ministério da Justiça e Segurança Pública; Educação (MEC); Saúde; Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome; Direitos Humanos e Cidadania. A expectativa é de que a cartilha seja lançada perto de 12 de outubro, o Dia das Crianças. Ao Estadão, a Secom disse apenas que o documento “deve ser lançado no próximo mês”.

Guia afirma que a escola precisa definir regras de controle do uso de smartphones.  Foto: Nilton Fukuda/Estadão

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A diretriz para uso de telas traz cerca de 100 recomendações destinadas a grupos como famílias, empresas, influenciadores digitais, instituições de ensino, governos etc. As orientações incluem uma ampla gama de temas que abordam desde o “sharenting”, quando pais postam fotos e vídeos dos filhos nas redes sociais, até uso de ferramentas de verificação etária para acesso a determinados conteúdos.

Na semana passada, o ministro da Educação, Camilo Santana, afirmou que o MEC vai propor um projeto de Lei para proibir o uso de telefones celulares em escolas públicas e privadas de todo o País. Segundo fontes do ministério, o MEC tem participado das discussões sobre o guia de telas e enxerga a cartilha como uma ferramenta complementar ao projeto.

A ideia é que o projeto de lei, caso aprovado, institua uma regra geral que dê segurança jurídica às redes para proibir o uso de celular em sala de aula. Ao mesmo tempo, a pasta usaria as diretrizes contidas no guia para induzir o uso pedagógico desses dispositivos.

Ou seja, a priori, o projeto de lei não deve instituir a proibição total de celulares em sala de aula, mas sim sua restrição de uso sem caráter pedagógico. Ainda está em análise se o projeto de lei será lançado na mesma data que o guia.

O texto prévio do guia destaca que eventuais regras sobre o uso de celular em escolas devem levar em conta a autonomia pedagógica das instituições e ter a participação da comunidade escolar. Segundo o documento, a tendência de proibir o uso de celulares em escolas é recente e “ainda existem poucos estudos que analisam seus impactos, que à primeira vista parecem positivos”.

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Em um capítulo sobre “Bem-estar digital”, as diretrizes do governo afirmam ainda que “a mera proibição e restrição intensa do uso de telas não parece ser uma estratégia eficaz.” A orientação é que haja mediação do uso de tecnologia por parte dos responsáveis para tornar a navegação mais saudável, já que apenas restringir o tempo de uso é insuficiente.

A versão preliminar do guia traz 17 recomendações para as famílias, orientando como podem proteger crianças e adolescentes para o uso mais saudável de telas. Entre elas estão:

  • Não usar telas e aparelhos digitais com bebês (menos de 2 anos de idade), salvo para contato com familiares, por videochamada, dando preferência a outras atividades, como brincadeiras, interações face a face e atividades físicas.
  • Evitar, se possível, a aquisição ou posse de aparelhos celulares do tipo smartphone antes dos 12 anos de idade.
  • Evitar o acesso a redes sociais antes dos 12 anos de idade, pois a maioria delas não foi projetada para crianças e contém padrões que estimulam o uso prolongado e potencialmente problemático.
  • Ensinar pelo exemplo, evitando o uso excessivo de dispositivos digitais diante de crianças e adolescentes durante os momentos de convivência.
  • Evitar o uso de dispositivos digitais no momento das refeições em família.
  • Evitar a prática de sharenting, especialmente em redes sociais abertas, de modo a preservar o direito à privacidade das crianças e adolescentes, prevenindo inclusive riscos de uso indevido de sua imagem no ambiente digital.

O texto inclui dez recomendações para instituições de ensino. As diretrizes incluem atividades para formação crítica de crianças e adolescentes em relação ao uso das redes, assim como treinamento de professores.

O guia afirma ainda que a escola precisa definir regras de controle do uso de smartphones.

Dados da pesquisa TIC Educação, utilizados pelo governo para elaborar o o guia, mostram que cerca de 34% das escolas municipais diziam que os estudantes não podiam utilizar o telefone celular. O porcentual era de 12% das escolas estaduais e 28% das escolas particulares.

  • Estabelecer normas para o uso de celulares no contexto das instituições de ensino levando em conta a participação da comunidade escolar, e considerando que o uso não pedagógico de dispositivos digitais no ambiente escolar, em qualquer etapa de ensino, pode trazer prejuízos para a aprendizagem e o desenvolvimento de crianças e adolescentes e que o uso individual de dispositivos digitais como tablets e celulares na educação infantil não deve ser estimulado.
  • Zelar pela segurança de rede na escola, inclusive bloqueando o acesso a sites ou domínios que tenham conteúdos inadequados a crianças e adolescentes.
  • Comunicar às crianças e adolescentes sobre a ilegalidade do cyberbullying, bem como sobre os tipos de danos às vítimas dessa prática.

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Um dos pontos destacados pelo guia é o risco de exposição a jogos de aposta, sobretudo com a legalização de apostas online, ainda que sejam ilegais publicidades de aposta que tenham participação de crianças e adolescentes ou que sejam direcionadas a eles. Como o Estadão mostrou, as bets têm entrado no mundo infantil sobretudo por meio da interface com futebol e games de celular.

Nesse sentido, o guia traz recomendações ao setor empresarial para que tome medidas para reduzir riscos de crianças e adolescentes no ambiente digital. O tópico sobre apostas também é abordado na recomendação a influenciadores.

No rol de responsabilidades atribuídas às empresas, o governo também aborda a necessidade de moderação de perfis que possam colocar em risco a vida de crianças e adolescentes. No ano passado, o governo federal travou uma batalha com empresas responsáveis por redes sociais após a ocorrência de ataques a escolas. Na ocasião, o Ministério da Justiça e Segurança Pública exigiu que as empresas donas dessas plataformas tivessem uma postura ativa para coibir o uso das redes como local para orquestrar ataques.

  • Vedar publicidade e comunicação mercadológica voltada para o público infantil em suas aplicações, bem como qualquer publicidade de jogos de apostas direcionada para crianças e adolescentes, ou que conte com a participação dos mesmos.
  • Promover a moderação automatizada e humana de conteúdos postados em redes sociais, coibindo a difusão de conteúdos apelativos, discursos de ódio ou violentos que atinjam crianças e adolescentes, bem como derrubando perfis de usuários que cometam potenciais crimes contra crianças e adolescentes, ou incitem práticas danosas à saúde desse grupo.
  • Fazer cumprir, inclusive mediante o uso de ferramentas de inteligência artificial, os limites mínimos de verificação etária para acesso a aplicações que não sejam adequadas a crianças ou adolescentes.
  • Disponibilizar mecanismos para a mediação familiar escalonados por idade ou graus de autonomia e maturidade de crianças e adolescentes, garantindo o fácil acesso ao recurso, a compreensibilidade nas estratégias de linguagem acionadas e a transparência em relação ao tratamento de dados
  • Coibir o trabalho de crianças e adolescentes no ambiente digital, inviabilizando a monetização de conteúdos diretamente associados aos chamados “influenciadores-mirins”.
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