O Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa) vai inaugurar seu primeiro curso de graduação, no Rio de Janeiro, com previsão de início em março de 2024. O objetivo é formar profissionais com sólidos conhecimentos em Matemática, capazes de atuar no mercado de tecnologia e inovação, que sofre com a escassez de mão de obra bem capacitada. Com duração de 4 anos e em modelo presencial, o bacharelado, que ganhou o nome de Impa Tech, também será voltado para áreas como Física, Ciência de Dados e Ciências da Computação.
O Impa tem hoje 140 alunos regulares na pós-graduação e seus cursos são gratuitos. Entre as maiores conquistas de pesquisadores do instituto, está a conquista da Medalha Fields, considerada o “Nobel da Matemática”, por Artur Ávila, em 2014.
De acordo com Marcelo Viana, diretor-geral do Impa, uma iniciativa própria de graduação faz parte dos debates do instituto há bastante tempo, mas ganhou força após um desafio proposto pelo prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), em abril de 2021.
“A prefeitura do Rio está criando um Centro de Inovação na região portuária, que funcionará como um ecossistema de empresas e startups”, afirma. “O prefeito sugeriu que, nesse espaço (de 10 mil m²), o Impa oferecesse uma graduação para profissionais de tecnologia. A partir disso que começamos a desenhar o projeto”, conta Viana.
O modelo teve inspirações nacionais, como a Ilum Escola de Ciência, instituição de ensino superior vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia e ao Ministério da Educação (MEC). Também mira referências no exterior, como o Instituto de Tecnologia de Massachussets (MIT), nos Estados Unidos.
Mas segundo Viana, mesmo se comparado às instituições fora do País, o Impa tem uma proposta inovadora. “Estamos criando uma estratégia que não conhecemos no Brasil ou no exterior, que é um curso que combina Matemática com áreas de tecnologia”, diz.
As inscrições para o processo seletivo devem ser abertas em breve. “Mas precisamos cumprir algumas etapas do processo de credenciamento do curso, que tramita no MEC (Ministério da Educação)”, afirma. “Se tudo funcionar bem, a ideia é lançar o processo seletivo durante o 2º semestre de 2023.”
Na sexta-feira, 11, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e uma comitiva de ministros foram ao local onde vai funcionar o Impa Tech.
Processo seletivo
O processo seletivo oferecerá 100 vagas para ingresso. A seleção será feita por meio de edital próprio, com normas, datas e critérios de seleção que ainda serão divulgados.
Viana adianta que o desempenho de alunos em olimpíadas de conhecimento, em particular na Olimpíadas Brasileira de Escolas Públicas (Obmep), será um fator importante na seleção. “É uma maneira de garantir que traremos alunos com gosto e talento pela Matemática”, afirma.
Desde 2005, o Impa organiza a Obmep, que conta com mais de 18 milhões de jovens todo ano. “É natural que utilizemos esse instrumento como um parâmetro de seleção”, afirma. Para trazer mais universalidade ao processo, interessados também poderão se inscrever pelo Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).
Está nos planos também uma 2ª fase de seleção formada por entrevista com os candidatos. E ainda uma 3ª fase, com um curso de nivelamento e seleção dos estudantes. Essas possibilidades ainda não estão confirmadas, mas seguem em estudo.
“Temos vários elementos que podem entrar na seleção, mas, de qualquer modo, o ponto de partida é priorizar o desempenho em olimpíadas de conhecimento.” Outras instituições de ensino superior de ponta no Brasil, como a Universidade de São Paulo (USP) e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) também usam as olimpíadas de conhecimento como uma das formas de ingresso.
Bolsas de estudo
Alunos aprovados no processo seletivo terão direito a bolsas de estudo, além de alojamentos próximos ao Impa.
“Também firmamos um compromisso com a prefeitura, que vai ceder apartamentos e propriedades que serão utilizados como moradia pelos estudantes”. diz.
Viana ressalta, porém, que esses apoios aos estudantes estarão condicionados à efetiva realização do aporte do governo federal. “A modalidade exata a gente ainda não definiu”, aponta.
A previsão é de R$ 55,9 milhões em repasses ao longo de quatro anos.
Educação e tecnologia
Como vai funcionar?
- Duração. O curso terá 4 anos de duração e acontecerá de forma presencial, no Porto Maravalley, localizado na região portuária do Rio de Janeiro, em uma área de 10 mil m².
- Processo seletivo. O processo seletivo está sendo construído, mas Viana garante que haverá ingresso pelo Enem ou pelo desempenho em Olimpíadas, além de uma segunda fase com entrevistas. É possível que haja uma fase final um curso de nivelamento e seleção dos estudantes, mas ainda em estudo.
- Calendário acadêmico. Seguirá o mesmo da pós-graduação do Impa. São dois períodos de 4 meses e 1 período de verão com de 2 meses (março a junho, agosto a novembro e período de verão, nos meses de janeiro e fevereiro).
- Formação. O curso terá 4 pilares formativos: Matemática, Ciências da Computação, Ciência de Dados e Física. Após um ciclo básico, com matérias comuns, o estudante pode escolher em qual área quer seguir.
- Bolsas de estudo. Estudantes terão direito a bolsas de estudo para viver na cidade do Rio de Janeiro durante o curso, além de alojamentos próximos ao Impa. A quantidade de bolsas e os valores serão definidos conforme os recursos colocados à disposição pelo governo federal.
Ensino conectado ao mercado
Cursos universitários em áreas de tecnologia sofrem com alta evasão de estudantes: quase 70% desistem do curso antes de acabar, conforme mostrou o Estadão. Questões financeiras, mercado aquecido e dificuldades para equilibrar trabalho e estudo explicam as desistências. Grades curriculares, pouco atrativas para os estudantes também são outro fator negativo.
Para ir na contramão disso, o Impa quer levar a realidade do mercado de trabalho para a sala de aula por meio da resolução de desafios reais. “Empresas apresentam problemas reais que não conseguem resolver e os alunos, acompanhados dos professores, buscam uma solução”, diz Viana.
Essa metodologia é utilizada pela instituição nos cursos de pós-graduação, mas agora a ideia é expandir. “Queremos reproduzir esse modelo na graduação, mas em escala bem maior, com mais alunos e empresas participando”, destaca. Segundo ele, é um tipo de formação que tem apresentado bons resultados.
“É uma maneira de inserir o aluno no mercado de trabalho”, afirma. “Na experiência com a pós, vemos que as empresas começam a cobiçar os estudantes logo após esses desafios, porque percebem a alta capacidade e o bom desempenho deles. Em geral, os estudantes terminam os projetos com propostas de emprego”, revela.
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