MEC incentiva prêmios a melhores escolas e professores para reduzir defasagem na alfabetização

Programa inclui também avaliações e apoio para espaços de leitura nas escolas; 56% das crianças de 7 anos não sabem ler e escrever no Brasil

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Foto do author Renata Cafardo
Atualização:

O Ministério da Educação (MEC) lançou nesta segunda-feira, 12, uma política de alfabetização das crianças de 6 e 7 anos que incentiva prêmios para as melhores escolas, gestores e professores. O governo também vai criar uma avaliação só para medir a alfabetização.

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Provas constantes e dinheiro para as melhores práticas são parte importante do programa de alfabetização do Ceará, Estado que foi governado pelo atual ministro da Educação, Camilo Santana (PT), e que se tornou referência de ensino sobre leitura e escrita no País.

Educadores mais à esquerda, no entanto, criticam um modelo de bônus que valorize as melhores escolas e não ajude as que têm pior desempenho. O governo federal não deixou claro que tipo de prêmio será oferecido e se ele será em dinheiro ou não. Camilo mencionou durante o anúncio do programa que está sendo “construída com a Unesco” uma premiação nacional. O lançamento do programa também teve a participação de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Avalições feitas em 2021 mostram que 56,4% das crianças de 7 anos no Brasil não estavam alfabetizadas. O País também ficou entre as últimas colocações no PIRLS, exame internacional que avalia a leitura de crianças do 4º ano. A pandemia ainda agravou as lacunas de alfabetização entre alunos mais velhos e um dos grande problemas hoje são estudantes até de 5º e 6º ano (10 e 11 anos de idade) que não sabem ler e escrever plenamente.

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Especialistas ouvidos pela reportagem elogiam o modelo de colaboração entre União, Estados e municípios, mas veem desafios, como a capacidade de transferir verbas. Em 2012, na gestão Dilma Rousseff (PT), o governo federal lançou outro programa inspirado no modelo cearense, mas não teve o mesmo êxito do Estado nordestino nos anos seguintes após problemas na implementação e continuidade das ações.

“Queremos garantir que 100% das crianças brasileiras sejam alfabetizadas ao fim do 2º ano do fundamental. E também a recomposição da aprendizagem das crianças impactadas pelas pandemia”, disse o ministro. O Compromisso Nacional Criança Alfabetizada, segundo ele, pretende incluir também a recuperação dos déficit de aprendizagens de alunos de 3º, 4º e 5º anos. E ainda “fomentar oralidade, leitura e escrita” na educação infantil, de zero a 5 anos, segundo a cartilha distribuída pelo MEC.

Crianças em sala de alfabetização em Granja, no Ceará Foto: TIAGO QUEIROZ / ESTADÃO

O programa terá o investimento de R$ 3 bilhões - R$1 bi em 2023 e R$ 2 bi nos outros anos - e pretende ajudar Estados e municípios a elaborar programas para formar professores alfabetizadores, elaborar materiais didáticos e para criar políticas locais de alfabetização. O Brasil tem 5.568 municípios, que são em geral os responsáveis por essa etapa de ensino, já que têm mais escolas que atendem o 1º e 2º ano do fundamental.

Se for dividido de maneira igual, esse valor resultaria em cerca de R$ 540 mil durante 4 anos para cada cidade. O governo, no entanto, diz que adotará critérios como “a proporção de crianças não alfabetizadas; as características socioeconômicas, étnico-raciais e de gênero; e a presença de crianças que compõem o público-alvo da educação especial inclusiva” para a destinação das verbas.

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Durante o anúncio, Lula disse que as escolas públicas brasileiras não são boas como antigamente. “Hoje é normal que um advogado, um prefeito, um pequeno empresário procure escola particular. Tem gente que gasta quase metade do salário que ganha para colocar os filhos em escola particular porque a escola pública não adquiriu o estado perfeito para o nosso povo”, disse o presidente, que culpou o “descaso do Estado” e a pandemia pelos problemas da educação.

Segundo ele, o compromisso com a alfabetização não foi uma ideia que MEC “tirou do seu chapéu” e, sim, “construído com especialistas” e com colaboração de Estados e municípios. “Não há nada mais importante que as crianças exercerem o direito de serem alfabetizadas”, disse. A política será instituída por meio de decreto, assinado nesta segunda-feira pelo presidente. Os Estados e municípios precisam aderir ao compromisso oficalmente para receber apoio técnico e financeiro.

O MEC pretende também pagar bolsas para articuladores de políticas de alfabetização estaduais, regionais e municipais e ainda criar uma plataforma virtual para capacitar docentes. Outra frente do Compromisso Nacional Criança Alfabetizada será o incentivo financeiro do MEC para que as escolas públicas tenham espaços de práticas da leitura “apropriados à faixa etária e ao contexto sociocultural, ao gênero e ao pertencimento étnico-racial dos educandos”, diz o documento do MEC. “As escolas terão o cantinho da leitura, uma novidade, que estimula a criança a ler”, disse Camilo.

Com relação à premiação, o texto do documento do MEC diz que é preciso “identificar, reconhecer, premiar e disseminar práticas pedagógicas e de gestão exitosas no campo da garantia do direito à alfabetização”. Ele estipula prêmios que serão dados pelo governo federal, como os oferecidos para gestores, e outros que seriam de Estados e municípios, a escolas e professores. Não está claro quem pagará pelos prêmios em todas as instâncias e se haverá valores em dinheiros. O MEC informou que os detalhes ainda estão sendo discutidos.

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Repercussão

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A ideia geral do programa é a de juntar esforços do governo federal, dos Estados e dos municípios conjuntamente para enfrentar a questão da alfabetização, o regime de colaboração. Além do apoio do MEC, Estados que aderirem ao compromisso terão de auxiliar seus municípios em políticas voltadas à alfabetização. Esse caráter - inspirado também no modelo do Ceará - é elogiado pelos especialistas, já que os municípios precisam de ajuda financeira e técnica para políticas públicas.

“É um ótimo documento, com um novo papel para o ministério, apoiando os Estados com pessoal financiado pelo MEC. Mas é uma carta de princípios, para se converter em execução tem muitos passos e muitas definições, como por exemplo a capacidade de transferir esses recursos”, diz o pesquisador de políticas educacionais e professor da Universidade de Stanford, Guilherme Lichand.

Ele questiona ainda quais serão os parâmetros das avaliações de alfabetização. O ministério anunciou que vai realizar um exame, o Saeb Alfabetização - o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) voltado ao 2º ano do fundamental. Mas ainda não apresentou como será a prova. Hoje essas crianças só fazem exames amostrais.

Lichand é um dos autores de uma análise elaborada por pesquisadores da Universidade de Stanford que indica que o País não avalia a alfabetização das crianças de forma adequada nem seguindo as melhores práticas mundiais. Segundo o documento, divulgado em maio, as provas no Brasil não conseguem medir a capacidade das crianças de compreender textos e fazer conexões entre leitura e conhecimento prévio. O estudo também questiona a efetividade de provas de fluência leitora, cada vez mais comuns no País, que medem o ritmo com que as crianças leem.

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No mês passado, o MEC apresentou os critérios que serão considerados a partir de agora no País para definir que a criança está alfabetizada. Entre os parâmetros para alunos de 7 anos, que estão no 2º ano do fundamental, estão escrever bilhetes e convites e ler textos simples, tirinhas e histórias em quadrinhos.

A especialista em alfabetização Patricia Diaz, diretora executiva da Comunidade Educativa Cedac, afirma que a política é “enorme avanço” com a relação que se tinha no governo anterior, principalmente pela ênfase na formação do professor que será avaliada e credenciada pelo MEC, assim como os materiais didáticos. “Não é uma ideia de programa único, garantindo a autonomia dos municípios, mas tem uma fiscalização da qualidade, para que isso chegue na ponta com cuidado”, diz.

No entanto, ela critica o incentivo à premiação de escolas e professores que se saírem melhor nas avaliações. “Muitas vezes o melhor está diretamente ligado à melhor condição. O risco é ficar uma corrida pelo prêmio que passa por cima dessa necessidade de trazer todo mundo junto para uma mesma mobilização.”

Patrícia ainda diz ainda que “não adianta só apontar que terão livros na sala de aula” e, sim, qual a qualidade desses livros, que tipo de trabalho será feito com eles. “Isso precisa estar na formação dos educadores, os livros não podem ser muito simples que não exigem esforço das crianças ou ter professores que fazem perguntas muito básicas (sobre as obras), dessa forma as crianças não avançam.”

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A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), que reúne sindicatos de professores, diretores e outros funcionários de escolas, divulgou uma nota criticando a política do governo do PT. “O programa carece de fundamentação teórica para a alfabetização infantil no Brasil, na medida em que mantém intocável o controverso método fônico, exclui dos compromissos a alfabetização de jovens e adultos, estimula a mercantilização nas áreas da formação docente e de materiais didáticos, foca os resultados exclusivamente em testes padronizados (Saeb alfabetização)”, diz o texto. Afirma ainda que a política é “um mix institucional que compreende políticas implementadas nos governos Dilma, Temer e Bolsonaro”, sem identidade própria.

Presente ao anúncio, o presidente da União Nacional do Dirigentes Municipais de Educação (Undime), Luiz Miguel Garcia, disse que é importante que a política olhe para a diversidade das cidades e escola brasileiras. O anúncio teve a presença ainda do vice-presidente Geraldo Alckmin, do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, da ministra da Saúde, Nísia Trindade, do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF) e de oito governadores de Estado.

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