Crítica ao Enem, escola e preconceito contra o mundo do trabalho; leia artigo

Educação envolve formação para a autonomia e para o mundo do trabalho; é preciso ensinar a debater de forma respeitosa diante da diferença de opiniões

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Por Claudia Costin
Atualização:

Nos últimos dias, ocorreu debate acirrado sobre questões do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) envolvendo o agronegócio. Críticos afirmavam que os formuladores das questões estariam ligados ao PT, hoje no governo federal.

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Na verdade, como esclareceu Manuel Palácios, dirigente do Inep (órgão responsável pelo exame), essas perguntas são do banco de itens da prova, elaborados a partir de edital de 2020, portanto na administração anterior. Além disso, foram cobradas questões de interpretação de um texto. A resposta correta não dependia, portanto, da visão do aluno, e sim da compreensão do que foi escrito pelo autor.

Mas que lições ficam do episódio? Afinal, em educação devemos aproveitar cada oportunidade para aprender.

Enem é o maior vestibular do Brasil; foram mais de 3,9 milhões de inscritos neste ano Foto: Felipe Rau/Estadão

Infelizmente, temos de admitir que há sim visão preconceituosa contra o setor produtivo, e, em especial, contra o agronegócio, entre nós educadores. E, toda vez que temos preconceitos, nos arriscamos a enxergar a realidade de forma fragmentada e a agravar a cultura de ódio tão presente hoje em boa parte do mundo.

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É preciso enfrentar isso com coragem. A educação deve ser preservada como política de Estado, e não de governo, mas não pode ser isolada da sociedade. A escola é o local onde se ensina, além do saber letrado, a debater de forma respeitosa mesmo diante da diferença de opiniões.

O agronegócio, por exemplo, não é bandido nem mocinho. Sim, há uma parcela de pessoas nesse setor com atitudes prejudiciais à sustentabilidade, mas não dá para generalizar. Neste sentido, temos de educar as novas gerações para cuidar do ambiente, não desmatar, e promover agricultura sustentável. Esse setor tem se modernizado e pode dar cada vez mais oportunidades de trabalho ao jovem no campo, inclusive com oferta de cursos profissionalizantes voltados a um agronegócio mais verde.

Além disso, há de se vencer os preconceitos contra o próprio setor produtivo e contra uma educação que prepare para o mundo do trabalho. A educação deve preparar para a vida, o que inclui a cidadania, a fruição do belo e instigante – o domínio das artes- e o exercício de uma profissão. Mas não há vida que exclua o mundo do trabalho e formar para a autonomia também está associado a isso. Ninguém é plenamente autônomo se depende de caridade alheia.

E como mudar isso? A Base Nacional Curricular Comum, documento que estabelece os objetivos de aprendizagem em cada etapa escolar, já trata da questão de aprender com o outro e da comunicação não violenta. O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 4, aprovado por 194 países (entre eles o Brasil), também vai na mesma direção.

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A formação de professores, tanto a inicial como a continuada, deve incluir a Educação para a Paz, o que envolve a escuta desarmada e a educação midiática. Com isso, os mestres estarão ainda mais preparados para instilar estas atitudes nos estudantes.

Além disso, é necessário engajar o setor produtivo, fazer com que entendam e apoiem as escolas no seu desafio de educar. Não é fácil, mas sem que a sociedade toda se envolva, não melhoraremos a qualidade da educação não desarmaremos preconceitos e a cultura do ódio.

*É presidente do Instituto Singularidades e foi Diretora Global de Educação do Banco Mundial

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