A Universidade Harvard, nos Estados Unidos, anunciou na última semana que vai restabelecer os testes padronizados como requisito de admissão e se torna a mais recente entre as principais instituições de ensino americanas a mudarem seus processos seletivos.
Estudantes que se candidatarem para ingressar em Harvard a partir do outono de 2025 serão obrigados a enviar pontuações dos testes SAT ou ACT (provas padronizadas, parecidas com o Enem brasileiro).
A universidade disse, porém, que alguns outros resultados de testes serão aceitos em “casos excepcionais”, incluindo o International Baccalaureate (certificado emitido por uma organização independente, com sede na Suíça).
Antes, Harvard havia afirmado que manteria sua política opcional de testes até a turma de entrada do outono de 2026.
Poucas horas após o anúncio de Harvard, o CalTech, um instituto de ciência e engenharia, também disse que estava restabelecendo seus requisitos para candidatos à admissão no outono de 2025.
As escolas estavam entre quase 2 mil faculdades americanas que eliminaram os requisitos de pontuação de testes nos últimos anos, tendência que se intensificou na pandemia, quando foi mais difícil para os estudantes acessarem locais de teste.
A eliminação dos requisitos de pontuação de testes foi amplamente vista como ferramenta para ajudar a diversificar as admissões, encorajando estudantes pobres e minorias que tinham potencial mas não obtinham boas notas nos exames. Mas apoiadores dos testes afirmaram que, sem as pontuações, ficou mais difícil identificar estudantes promissores.
Ao explicar sua nova decisão, Harvard citou estudo da Opportunity Insights, que descobriu que as pontuações dos testes eram melhor ferramenta para prever o sucesso acadêmico na faculdade do que as notas do ensino médio. Além disso, esses resultados podem ajudar os responsáveis pelas admissões a identificarem estudantes talentosos de grupos de baixa renda que poderiam passar despercebidos.
“Os testes padronizados são um meio para todos os estudantes, independentemente de seu contexto e experiência de vida, fornecerem informações que preveem o sucesso na faculdade e além,” disse Hopi Hoekstra, decano da Faculdade de Artes e Ciências, em comunicado sobre a mudança.
“Em resumo, mais informações, especialmente informações tão fortemente preditivas, são valiosas para identificar talentos em todo o espectro socioeconômico,” ela acrescentou.
O CalTech, em Pasadena, Califórnia, disse que o restabelecimento dos requisitos de testes reafirmou o “compromisso da escola, como uma comunidade de cientistas e engenheiros, de usar todos os dados relevantes em seus processos decisórios.”
Harvard e CalTech juntam-se a um número crescente de escolas, notáveis por sua seletividade, que desde então reverteram suas políticas, incluindo a Universidade Brown, Universidade Yale, Dartmouth College, Instituto de Tecnologia de Massachusetts, o MIT, Universidade Georgetown, Universidade Purdue e a Universidade do Texas em Austin.
Harvard vive momento de guinada
Para Harvard, a mudança ocorre em um momento de transição, e talvez um retorno a políticas mais conservadoras.
Em junho, a Suprema Corte derrubou o uso de critérios raciais nos processos seletivos envolvendo Harvard e a Universidade da Carolina do Norte, levantando temores de que, com o fim da ação afirmativa, essas escolas se tornariam menos diversas.
E, em janeiro, a primeira presidente (cargo com funções similares às de um reitor no Brasil) negra de Harvard, Claudine Gay, renunciou sob pressão de críticos que disseram que ela não agiu com força suficiente para combater o antissemitismo no câmpus após o ataque de outubro do Hamas contra Israel.
Além disso, houve acusações crescentes de plágio em seu trabalho acadêmico, o que ela nega.
Alan Garber foi nomeado presidente interino, enquanto o decano da faculdade de Direito, John Manning, tornou-se o reitor interino, o segundo cargo administrativo mais alto da universidade.
Manning é considerado um forte candidato potencial para substituir Gay. Seu histórico se destaca por suas associações conservadoras, tendo sido assistente do ex-juiz da Suprema Corte americana Antonin Scalia.
No clima atual no câmpus, um retorno às pontuações de testes pode ser visto como um retorno à tradição. Isso também pode abordar preocupações de muitos pais de que o processo de admissão ao ensino superior, especialmente em instituições de elite, é inescrutável e desconectado do mérito.
As aplicações para Harvard caíram 5% este ano, enquanto muitas das outras instituições similares viram aumento, sugerindo que a recente turbulência pode ter afetado sua reputação. Mas ainda assim, recebeu número impressionante de inscrições de graduação — 54.008 — e admitiu apenas 3,6%. Exigir pontuações de testes poderia tornar mais gerenciável a triagem de inscrições.
Testes padronizados fazem uma boa seleção?
Críticos dos testes padronizados há muito levantam preocupações de que os testes ajudam a fomentar a desigualdade porque alguns estudantes mais ricos melhoram suas pontuações por meio de tutoria de alto custo.
Mas estudos recentes encontraram que as pontuações dos testes ajudam a prever notas durante a faculdade, chances de formatura e sucesso pós-diploma. Também apontam que as pontuações desses exames são mais confiáveis do que as notas do ensino médio.
No entanto, Robert Schaeffer, diretor de educação pública na FairTest, organização que se opõe aos testes padronizados, disse que a análise da Opportunity Insights havia sido criticada por outros pesquisadores.
“Esses estudiosos dizem que, quando você elimina o papel da riqueza, as pontuações dos testes não são melhores do que o GPA (média de notas) do ensino médio,” ele disse, acrescentando que não está claro se esse padrão é verdadeiro para faculdades com processos seletivos altamente competitivos, como Harvard.
Schaeffer disse que ao menos 1.850 escolas permanecem com a política de testes opcionais, incluindo Michigan, Universidade Vanderbilt, Wisconsin e Universidade de Syracuse. “A grande maioria das faculdades não exigirá pontuações de testes.”
Uma exceção, ele disse, poderia ser o sistema da Universidade da Carolina do Norte, que está considerando um plano para exigir testes, mas apenas para aqueles estudantes com um GPA abaixo de 2.8.
Reconhecendo as preocupações dos críticos, Harvard disse que reavaliaria a nova política regularmente. A instituição disse que as pontuações dos testes seriam consideradas juntamente com outras informações sobre experiência, habilidades, talentos, contribuições para comunidades e referências do candidato. Eles também serão analisados no contexto de como outros estudantes estão se saindo na mesma escola de ensino médio.
“Os oficiais de admissões entendem que nem todos os estudantes frequentam escolas bem estruturadas, e aqueles que vêm de origem econômica modesta ou são a primeira geração na família a frequentar a faculdade podem ter tido menos oportunidades para se prepararem para testes padronizados,” disse William Fitzsimmons, decano de admissões e ajuda financeira de Harvard, em comunicado.
Harvard disse que, no interesse de selecionar um corpo estudantil diversificado, aprimorou a ajuda financeira e intensificou o recrutamento de estudantes de minorias ao se juntar a um consórcio de 30 universidades públicas e privadas que recruta alunos de comunidades rurais. /Este artigo foi originalmente publicado no The New York Times.
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