Por que investir no ensino técnico? ‘Estamos desperdiçando a juventude do País’

Especialista defende educação profissional como “inclusão produtiva digna” para as novas gerações, além do impacto no desenvolvimento econômica do Brasil

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Foto do author Renata Cafardo
Atualização:
Foto: Andre Seiti/Fundação Itaú
Entrevista comAna Inouesuperintendente do Itaú Educação e Trabalho

Ana Inoue, superintendente do Itaú Educação e Trabalho, organização do terceiro setor mantida pela Fundação Itaú, acredita que o potencial de desenvolvimento dos jovens e do Brasil está atrelado à educação profissional e tecnológica. “Eles serão os adultos que vão cuidar da democracia, da Amazônia, da economia, do Judiciário, do futuro do País. Se não cuidarmos deles, não sei de que País estamos falando, de que futuro estamos falando”, diz Ana.

Conhecida também como ensino técnico, a modalidade aparece em pesquisas como preferência de grande parte dos estudantes, que enxergam o ensino médio como uma etapa desconectada do mundo do trabalho.

Estudo encomendado pela entidade para pesquisadores do Insper mostra crescimento no PIB se o Brasil expandisse a quantidade de alunos em cursos de ensino médio técnico. Segundo a pesquisa, o impacto positivo seria entre 1,34% e 2,32%, em longo prazo, quando a probabilidade de conseguir vaga na educação profissional e tecnológica dobra ou triplica.

A premissa é de que a pouca abrangência do ensino médio técnico no País não está associada a um baixo interesse dos estudantes e a conclusão é a de que esses alunos formados geram maior produção para a economia.

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Ana Inoue, superintendente do Itaú Educação e Trabalho Foto: Andre Seiti/Fundação Itaú

O Brasil está entre os cinco países com menor porcentual de estudantes matriculados na educação profissional, entre 45 nações analisadas pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A entidade alerta ainda sobre o alto índice de jovens entre 18 e 24 anos que nem estudam e nem trabalham, os chamados “nem-nem”.

Leia a entrevista completa.

Como você vê o resultado da pesquisa que mostra o aumento no PIB com mais investimento em educação profissional e tecnológica?

O estudo mostra que, ao triplicar as matrículas no ensino técnico, o PIB brasileiro tem aumento de até 2,32%. Isso é decorrente de maior empregabilidade e rentabilidade promovida a partir da formação profissional. Então, estamos desperdiçando a juventude do País, a inteligência, a criatividade, os sonhos, a perspectiva de sermos um país potente e justo. Todo esse potencial perdemos ao não investir nos jovens e deixarmos de desenvolver políticas públicas eficientes que representem avanços na formação profissional dos jovens.

A educação profissional pode ser vista como uma forma de inclusão para os jovens?

Sim, a educação profissional é um caminho muito importante de formação e de inclusão produtiva digna para as juventudes. Eu digo digna porque, muitas vezes, quando se fala de inclusão dos jovens pensa-se em um trabalho precário ou alienado. Não se trata disso. Não é o que os jovens precisam nem querem, nem é o que o Brasil precisa. Temos de nos preocupar em cuidar das nossas juventudes. Eles serão os adultos que vão cuidar da democracia, da Amazônia, da economia, do Judiciário, do futuro do País. Se não cuidarmos deles, não sei de que País nós estamos falando, de que futuro nós estamos falando.

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E o impacto para o desenvolvimento do País?

O desenvolvimento econômico do País vai ser consequência de ter uma população ativa, criativa, atuante. E só vamos ter isso se a gente cuidar da juventude. São cursos técnicos de qualidade, não é só profissionalizante. Precisam ser regulamentados, com currículo. Conseguir cuidar das nossas juventudes significa diminuir o sofrimento futuro de toda uma geração e diminuir o sofrimento também para o País. A gente precisa considerar que realmente esse é um futuro que merece ser sonhado e desejado.

E como devem ser as políticas nesse sentido?

As políticas precisam ser intersetoriais. Não vamos resolver isso só com a educação. Precisamos ter políticas voltadas para o mundo do trabalho. Precisamos de todos os atores. De um lado o governo; de outro lado, o setor produtivo, as universidades. Recentemente tivemos a aprovação do marco legal do ensino técnico, uma nova lei, a criação da política nacional de educação profissional e tecnológica. Isso envolve ter avaliação, governança, articulação dessas áreas, juntar o governo, gestores da educação, instituições formadoras e o setor produtivo.

Quais áreas precisam ser prioritárias?

Quando olhamos para o cenário do século 21, precisamos considerar que a economia verde, a economia digital, a economia criativa, dos cuidados e da saúde. São questões muito presentes e que estão determinando o mundo do trabalho. Isso tudo precisa ser considerado para desenhar essa política e a oferta de educação profissional para os jovens. Embora esteja na Constituição que a qualificação para o mundo do trabalho é responsabilidade da educação, não conseguimos fazer isso acontecer para 80% dos jovens, que não vão para a universidade. Mas a educação profissional é um momento em que você pode entender o trabalho como uma prática educativa. Ela pode ser uma mobilizadora muito grande, uma articuladora entre teoria e prática. É fazer do trabalho um princípio educativo, de fato.

Há o estigma de que o estudante de ensino técnico não vai para a universidade, que seria uma formação menor.

Isso é um preconceito. O ideal é que a educação profissional seja só uma parte da etapa inicial do desenvolvimento de qualquer pessoa. Ela precisa ser contínua ao longo da vida. Quando uma pessoa faz Medicina, sai da faculdade, ela ter de continuar se formando. A pessoa que fez o ensino técnico também terá que continuar se formando, pode ir do ensino técnico para o ensino superior. A formação de cidadãos brasileiros precisa ser uma continuidade. Ela vai começar lá na escola e terminar no fim da vida da pessoa, com muitas oportunidades de formação e de atualização.

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