O cenário geopolítico internacional pode mudar com a nova formação dos Brics. Com os seis novos membros, Arábia Saudita, Argentina, Emirados Árabes Unidos, Egito, Irã e Etiópia, o grupo de países emergentes passa a reunir 46% da população mundial e se torna detentor de cerca de 36% do PIB global. Para Isabel Rocha de Siqueira, diretora do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da PUC-Rio, que coordena o Brics Policy Center, é preciso observar de que forma essa expansão irá se refletir em aumento efetivo do impacto das ações dos Brics.
O que a incorporação de novos membros significa?
A gente acompanhou um grupo que centralizava discussões mais econômicas e que, desde a invasão russa à Crimeia em 2014, passou a dar mais lugar à geopolítica. Hoje, a guerra da Ucrânia é um tabu, como visto na Cúpula (dos Brics, que ocorreu na África do Sul no fim de agosto), mas há um potencial, pelo menos discursivo, mais voltado para essas questões geopolíticas. Vai depender muito das dinâmicas internas e, por isso, o bloco deve ficar bastante em evidência nos próximos anos.
O que a expansão significa para o Brasil?
A gente sai com a promessa de um apoio do bloco em relação à demanda histórica do Brasil por um assento no Conselho de Segurança da ONU, mas os Estados Unidos nunca demonstraram inclinação de aprovar esse pedido. Outro potencial vem de iniciativas econômicas, como a rota comercial que está sendo proposta entre EUA e Índia, que atravessaria o Sul asiático e o Oriente Médio até o leste europeu. Ainda não se sabe exatamente os termos dessas parcerias, mas são portas que se abrem para a diplomacia brasileira e para o comércio.
Vários outros países já demonstraram interesse em integrar o Brics. Uma nova expansão pode ser danosa?
Esse é sempre o dilema dos blocos cooperativos. Quanto mais membros, mais difíceis os processos decisórios, e o Brics notoriamente teve poucos mecanismos institucionalizados de tomada de decisão; mesmo critérios para a entrada de países no bloco ainda não existem. Há o aspecto que os processos se tornem mais morosos, mas, quanto mais exclusivista for o Brics, supostamente mais incoerente é o nosso próprio discurso.
O bloco tem hoje capacidade de influenciar o sistema econômico no sentido de impulsionar um desenvolvimento global mais justo?
Combinados, os 11 países têm um PIB potencial que ultrapassa o do G7, mas, em termos de exportação e de indústria, ainda fica atrás. Uma questão que se coloca é a capacidade de formar mão de obra capacitada e acompanhar agendas relacionadas a ciência, pesquisa e tecnologia, como a automatização e digitalização da economia. Isso passa por investimento em educação, é um desafio em termos de liderança econômica. Pensando nas taxas atuais de desigualdade, o bloco pode crescer em poder econômico total, mas isso não significa que a situação das populações vai melhorar.
E frente à emergência climática, é hora de uma postura propositiva do Brics?
Sem dúvidas, mas é preciso considerar que o bloco terá uma proporção ainda maior de países produtores de petróleo e de minérios estratégicos, como os Emirados Árabes e a Arábia Saudita, o que nos deixa um pouco descrentes. Há um enorme desafio de não cair na tentação da falsa transição energética. O Brasil perdeu muito tempo nos últimos anos. A gente vê agora algumas iniciativas importantes, como a COP 30, em 2025, que será em Belém (PA).