Um profissional de Humanas que conheça de neurociência, um profissional das Ciências Biológicas que entenda de Tecnologia, alguém de Tecnologia da Informação que saiba conceitos de Administração: no futuro, será assim o perfil dos profissionais mais valorizados no mercado. E eles já são bastante cobiçados atualmente. As fronteiras entre as carreiras estão cada vez mais tênues, com os conhecimentos entre campos diversos se relacionando.
Além de lidar com a multiplicidade de saberes, os profissionais têm de se preparar para um mundo em que o “trabalho” se distancia de “emprego” - e cada um pode inventar novas formas de trabalhar. “O crescimento do empreendedorismo é uma questão estrutural que atinge todas as áreas. Por vontade ou necessidade, o profissional está encontrando outras maneiras de oferecer seu serviço”, afirma Rodolfo Ambiel, presidente da Associação Brasileira de Orientação Profissional (Abop).
Com esse cenário, algumas carreiras tendem a ganhar mais destaque no mercado. Nestas páginas, apresentamos algumas delas, nas áreas de Humanas, Biológicas e Exatas.
Dentro de cada carreira há uma série de possibilidades, dá para fazer transições, refazer escolhas.'
Rodolfo Ambiel, presidente da Associação Brasileira de Orientação Profissional (Abop)
Espere o inesperado. Mas é sempre bom estar atento porque as tendências de mercado mudam. Os cenários econômicos se transformam cada vez mais rapidamente, e uma área hoje com boas perspectivas pode não ser tão atraente em dez anos, ou até menos. “A gente vive num período de muita instabilidade. É impossível fazer certas previsões”, diz o presidente da Abop. Já pensou investir dinheiro e anos de estudo em algo que não gosta, para depois não ter nem o retorno esperado na carreira?
E, mesmo que um campo seja uma “aposta certa” em termos de retorno financeiro, é preciso primeiramente se questionar se aquela área é mesmo a indicada para o seu perfil. “Nem todo mundo pode trabalhar em TI, nem todo mundo vai ser feliz com isso”, alerta Ambiel. Assim, embora as perspectivas do mercado devam ser levadas em consideração para a escolha profissional, esse não deve ser o fator determinante para a escolha da carreira. Para ter sucesso em qualquer que seja a área de atuação, o profissional tem de saber se adaptar.
Abrir o leque é uma outra sugestão para épocas desfavoráveis. “É preciso saber onde aplicar seu conhecimento, sem se limitar”, aconselha Rodrigo Soares, diretor da Hays, empresa que trabalha com recrutamento. Com um mundo em constantes mudanças, outro segredo para ser um profissional sempre em alta é nunca parar de se atualizar, diz a coordenadora do ESPM Carreiras, Marcia Portazio, e procurar pós-graduações sempre que possível.
Humanas: Com um pé na tecnologia e outro na ciência
Quando fazia faculdade de Direito, Fernanda Tasinaffo foi chamada para estagiar no setor jurídico de uma empresa de internet. Logo percebeu que as questões importantes da sua prática profissional não seriam citadas na graduação. “Por ser uma área nova, despertou minha curiosidade. É um trabalho ativo, que mistura de tudo um pouco.”
Além de aprender com seus colegas mais experientes e estudar por conta própria, aos 23 anos, Fernanda achou que seria importante se aprofundar no tema e atualmente está cursando uma pós-graduação em Direito Digital no Damasio Educacional. “É um curso bem prático. Discutimos assuntos recentes, como a suspensão do WhatsApp e a disputa sobre o Uber.” Ela sabe que está seguindo um caminho promissor do ponto de vista de salário e empregabilidade, mas garante que sua principal motivação é a satisfação pessoal. “Eu me encontrei no digital.”
A interface do Direito com a tecnologia é só um dos vários exemplos de nichos promissores para profissionais de Humanas nos próximos anos. “Os avanços da tecnologia influenciam praticamente todas as carreiras. Cada vez mais veremos uma inter-relação de áreas”, afirma Marcia Portazio, coordenadora do ESPM Carreiras.
Da mesma forma que cresce a necessidade de advogados especializados no digital, ocorre com administradores, comunicadores e profissionais de Marketing, cita Márcia. “A administração de uma empresa de e-commerce tem suas especificidades e o marketing do e-commerce ou nas redes sociais, também.”
Portazio lembra ainda que a Neurociência tem tido influência crescente sobre carreiras das Humanidades, da Psicologia à Educação, passando pelo Marketing. Segundo ela, profissionais que consigam aplicar esses conhecimentos ao seu campo de atuação terão um futuro promissor. “O desenvolvimento científico está com o foco nas pessoas, na aplicação para o seu bem-estar.” A professora cita um curso da ESPM de Neurociência aplicada ao consumo como exemplo de campo.
Para advogados, administradores e economistas, um caminho promissor é também a área de Compliance, diz Rodrigo Soares, diretor da Hays, companhia de recrutamento. “As empresas vêm olhando com mais cuidado para seus balanços, para evitar fraudes, dar mais transparência e segurança a seus parceiros.”
Outra tendência em Humanas é o crescimento da área de Psicologia. Em companhias, o psicólogo pode atuar em Recursos Humanos. “O gerente de RH é extremamente valorizado. Não existe uma empresa sólida se não houver um bom profissional nesse posto”, diz o diretor da Hays.
Mas os psicólogos também tendem a ganhar força fora das corporações. “Temos visto cada vez mais casos de depressão, ansiedade. A busca pela psicologia reflete que as pessoas estão se preocupando com o bem-estar”, diz Rodolfo Ambiel, presidente da Associação Brasileira de Orientação Profissional (Abop).
Exatas: Apesar da crise, TI segue crescendo
Como a maioria dos universitários, Vitor Ricchetti, de 22 anos, se preocupa com as provas, os trabalhos, as notas e as disciplinas optativas para cursar. Diferentemente da maioria dos estudantes, entretanto, Ricchetti não se preocupa se terá um emprego quando se formar. Provavelmente poderá escolher onde trabalhar, porque vai atuar em TI, setor que mesmo em meio à crise se mantém em expansão. O déficit atual de profissionais qualificados no Brasil é estimado em 50 mil, segundo a Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação.
“Entrei na área de TI porque gostava mesmo, sem expectativas sobre salário ou vagas. Mas sei que o mercado está muito favorável, então acredito que tenho boas chances de conseguir um emprego que me garanta qualidade de vida.”
Ricchetti cursa o segundo ano de Sistemas de Informação em Comunicação e Gestão da Escola Superior em Propaganda e Marketing (ESPM). “Sempre fui ligado a computador. Entrei no curso pensando em desenvolver games, mas agora prefiro a parte de análise de dados e estatísticas. Hoje imagino trabalhar com business intelligence ou desenvolvimento web.” O business intelligence, ou inteligência de negócios, visa a transformar dados brutos em informações relevantes para a estratégia de uma empresa. É a Informática misturada à área de Negócios e Administração e, portanto, setor indicado para um profissional com características híbridas.
E há oportunidades em outros nichos. “Empresas de TI seguem com alta demanda. É um mercado imenso, com destaque para Telecomunicações e desenvolvimento de games e de aplicativos móveis”, diz Rodrigo Soares, diretor da Hays, empresa de recrutamento.
Além de competência técnica, certas características comportamentais levam alguns profissionais a se destacar, como uma boa comunicação e capacidade de inovar, segundo Soares. Ele também diz que a capacidade de planejar e ter uma visão empreendedora também fazem diferença.
Se há vagas para TI, há carreiras que enfrentam tempos difíceis, caso da engenharia. A crise atingiu com força o setor de construção civil, o que afeta diretamente empregos e salários. Mas, ainda que o momento pareça delicado, engenharia continua sendo um campo promissor, defende Marcia Portazio, coordenadora do ESPM Carreiras. “Temos uma demanda por infraestrutura muito grande. Continuaremos precisando dos engenheiros civil, de energia, naval, agrônomo, de meio ambiente.”
Biológicas: A serviço da saúde e da qualidade de vida
Formado em Farmácia em 2007, Tarcísio Liberato entrou no Instituto Butantã para trabalhar com a produção de vacinas e soros. Foi assim que acabou se envolvendo com a Biotecnologia. Gostou da área e resolveu se especializar, se tornando um pesquisador. Já fez mestrado e agora, aos 32 anos, está cursando doutorado em Biotecnologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Minha pesquisa é para entender o microambiente tumoral, estudando as moléculas do câncer melanoma.”
O setor de pesquisas é amplo, há muito a se desenvolver e traz a satisfação pessoal de ajudar a melhorar a vida das pessoas, diz Liberato. Ele, porém, alerta aos interessados que o caminho tem obstáculos. “O mais difícil é a falta de verbas para estudos de alto impacto.”
O campo de um biotecnólogo, no entanto, é amplo - pode atuar na produção de alimentos, no melhoramento animal, no ramo ambiental, na indústria de cosméticos e medicamentos - e tende a crescer. O profissional precisa de um perfil multifacetado para encarar esse ramo complexo, que envolve conhecimentos diversos: tem um pouco de Química, Física, Estatística e Informática.
Mas o esforço compensa. “Esse profissional já está muito bem cotado no mercado. E ele pode ter várias formações (Farmácia, Biologia, Medicina). O que define não é a graduação, mas a experiência e a vontade de aprender”, afirma Rodrigo Soares, diretor da Hays, empresa de recrutamento. Como muitas empresas que atuam em Biotecnologia são multinacionais, investir no inglês aumenta as chances de crescer.
A Tecnologia está chegando ainda a outras áreas das Ciências Biológicas. A tendência é de que atinja com força crescente os profissionais da Saúde de maneiras variadas, mudando as formas de diagnósticos com equipamentos cada vez mais precisos, aumentando a importância dos exames e tratamentos genéticos, levando à produção de próteses mais eficientes.
“A cirurgia robótica e a Bioinformática (uso de técnicas computacionais para o processamento de bioinformações) já são uma realidade e devem crescer”, afirma a coordenadora do ESPM Carreiras, Marcia Portazio.
O fenômeno da introdução da Tecnologia na Saúde leva à valorização de profissionais específicos, mas deve alterar a atuação cotidiana da maioria, acredita Marcia. “Um pediatra, um gastroenterologista, um cirurgião: todos vão precisar desses novos conhecimentos.”
O envelhecimento da população é outro fator com potencial para dar boas oportunidades de trabalho, projeta o presidente da Associação Brasileira de Orientação Profissional (Abop), Rodolfo Ambiel. Ter mais idosos influencia na maior demanda por médicos geriatras, mas também por fisioterapeutas, educadores físicos e outros profissionais que se especializem em atender esse público. “A população idosa é crescente no mundo todo. Além do aumento da expectativa de vida, as pessoas estão vivendo com mais saúde.”
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.