Regulação federal barra as licenciaturas 100% digitais e ainda traz dúvidas e receios

Para cursos já ativos haverá um prazo de adaptação de 2 anos; especialistas defendem regras e MEC promete fiscalizar programas

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Foto do author Renata Okumura

Neste ano, o governo federal resolveu mudar as regras para a formação de professores no País. As mudanças nas licenciaturas são um primeiro passo em uma nova regulamentação na educação a distância no ensino superior. Especialistas defendem que a mudança é necessária para garantir a boa preparação. Por sua vez, as faculdades dizem que vão se planejar e há qualidade na oferta do ensino no formato digital; e ainda existe receio no impacto na oferta de cursos.

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No fim de maio, o Ministério da Educação (MEC) deu aval à resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE) com as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para a Formação Inicial em Nível Superior de Professores da Educação Escolar Básica, com cursos de licenciatura que passam a ter, no mínimo, duração de quatro anos, com 3,2 mil horas, das quais ao menos metade (1,6 mil horas) deve ser realizada de forma presencial.

A resolução entrou em vigor em 1.º de julho. Mas se prevê uma regra de transição: os cursos de formação de professores que se encontram em funcionamento deverão se adaptar aos termos da resolução no prazo de dois anos. “A Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (Seres) do MEC é responsável por zelar pelo cumprimento da legislação educacional, e supervisão das instituições”, disse o ministério. “Nos processos de reconhecimento e renovação de reconhecimento dos cursos de licenciatura, será verificada a adequação das instituições de educação superior (IES) às novas diretrizes.”

Aula em Etec; formação de professor passa a ter 4 anos, com 3,2 mil horas, das quais ao menos metade deve ser feita de forma presencial. Foto: TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO

De acordo com o recém-divulgado Censo da Educação Superior de 2023, do total de 9,9 milhões de matrículas em cursos de graduação, 1,7 milhão de vagas estão em cursos de licenciatura. Dentro dessa área, Pedagogia, Educação Física e Matemática estão entre os maiores cursos de graduação. Ainda conforme os dados, 67% das matrículas dos cursos de licenciatura são em EAD.

Avanços

Na avaliação de Natália Fregonesi, coordenadora de Políticas Educacionais do Todos Pela Educação, a homologação das novas diretrizes apresentou diversos avanços. “Há uma especificação melhor de como deve ser o estágio obrigatório desses licenciandos e tem uma questão sobre a formação pedagógica para os graduados não licenciados, que é o que a gente chama usualmente de complementação pedagógica.”

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Para ela, a limitação da carga horária EAD nas licenciaturas é positiva. “Quando a gente fala de uma sólida formação inicial, ela exige uma intensa articulação entre a teoria e a prática, uma vivência nas escolas da educação básica desde o começo do curso e, principalmente, o desenvolvimento de habilidades relacionais que só podem ser asseguradas de forma presencial.”

O professor Marcos Garcia Neira, pró-reitor adjunto de Graduação e professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), entende que “a explosão de cursos de licenciatura a distância na última década foi acompanhada do crescimento da evasão e da redução da qualidade”. Na USP, toda a graduação (licenciatura e bacharelado) é presencial.

”Para os cursos integralmente a distância, trata-se de uma mudança de grande impacto para os estudantes matriculados em 1.º e 2.º ano. O recomendável é que a gestão estabeleça o quanto antes um canal de diálogo com o corpo discente e docente para que possam, conjuntamente, elaborar e reorganizar os componentes curriculares faltantes”, diz ele.

Marcos Nepomuceno Duarte, pró-Reitor de Graduação da Universidade Presbiteriana Mackenzie, afirma que as novas diretrizes foram entendidas como um esforço na busca da melhoria da formação dos novos professores. “Assim como amplos setores da sociedade brasileira, a universidade compartilha do entendimento de que a formação de professores – seja para o ensino básico, fundamental ou médio – é central para que nosso País ofereça educação de qualidade.”

Risco

Flávio Murilo Gouvêa, reitor da Universidade Estácio de Sá, avalia que a adaptação das novas diretrizes para a formação de professores também depende das novas regras para o ensino a distância no Brasil que estão em discussão pelo Ministério da Educação. “Eu tenho participado de vários fóruns, inclusive do MEC, a respeito.”

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Para ele, “o aumento da exigência de aulas presenciais pode reduzir a oferta de alguns cursos”. “A nossa preocupação, honestamente, é o aluno. Nós fazemos todos os dias muitos esforços para que o aluno tenha a melhor experiência.”

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O reitor observa que a instituição conhece muito mais o aprendizado do aluno de EAD do que do estudante do ensino presencial. “O aprendizado do nosso aluno digital é on. Pela nossa plataforma, a gente consegue saber o que o aluno aprendeu ou não, onde a gente pode fazer um reforço maior de aprendizado. No caso do ensino presencial, o estudo acontece em off, na sua casa.”

Para a Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), a recente normatização traz consigo desafios e preocupações fundamentais sobre a qualidade e a oferta dos cursos de licenciatura. “Necessidade de melhorar a regulação dos cursos de licenciatura na modalidade a distância, o diagnóstico dos desafios na formação docente e a valorização do magistério, incluindo formação, carreira e condições de trabalho.”

Segundo a entidade, a melhoria da qualidade dos cursos de educação a distância deve ser acompanhada de regulamentações que não comprometam a oferta desses cursos, pois a modalidade é uma porta de entrada para muitos estudantes que, de outra forma, não teriam acesso à educação superior, além de ter sido essencial para a formação de professores em diversas regiões do Brasil. “Defendemos que, desde que a qualidade seja garantida, a modalidade de ensino não deve ser um critério de restrição ao acesso. Acompanhar a implementação das diretrizes com atenção será vital para evitar um retrocesso na democratização do ensino superior no Brasil.”

Como ficou a carga horária das licenciaturas:

  • 880 horas dedicadas às atividades de formação geral;
  • 1.600 horas dedicadas ao estudo de aprofundamento de conhecimentos específicos;
  • 320 horas de atividades acadêmicas de extensão;
  • 400 horas dedicadas ao estágio curricular supervisionado.

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Qual a diferença?

A resolução anterior já previa a carga horária total de 3.200 horas para os cursos de licenciatura. A principal novidade diz respeito aos cursos de educação a distância (EAD). Conforme o MEC, para esses cursos,há a obrigatoriedade de que as 320 horas de extensão, as 400 horas de estágio e mais 880 horas da parte específica, ou seja, 50% da carga horária do curso, sejam realizadas integralmente de forma presencial.

Quando passa a valer?

Está em vigor desde julho, mas há um prazo de dois anos para adaptações

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