SÃO PAULO - Em apoio aos estudantes das 194 escolas ocupadas contra a reorganização escolar do governo Geraldo Alckmin (PSDB), artistas e voluntários farão uma Virada Cultural nas unidades tomadas neste domingo, 7. Paulo Miklos, do Titãs, Edgar Scandurra, do Ira!, Criolo e Maria Gadú confirmaram a participação em shows, que devem acontecer em duas escolas.
Miklos disse, em entrevista ao Estado, que os alunos o inspiraram e que o governo não soube "reagir democraticamente à demandas legítimas dos jovens" e que mantém as decisões "de cima para baixo". Para ele, o governo age com "apatia" diante do movimento dos alunos.
"Prova dessa apatia é que o governo publicou hoje (terça-feira, 1º), no meio desse turbilhão, o decreto que oficializa o fechamento das escolas, ignorando as demandas dos estudantes, dando pouquíssimas informações transparentes sobre o futuro das escolas. Esse tipo de decisão autoritária não será mais aceito", disse. Veja a entrevista completa abaixo.
O festival foi organizado pela organização não governamental (ONG) Minha Sampa, que viu na ação uma forma de mostrar o apoio da sociedade ao movimento dos estudantes.
"Estamos preocupados porque o governo não abre o diálogo com esses alunos e está adotando medidas intimidatórias ao tentar colocar os pais e professores contra as ocupações. Nossa ideia é mostrar que a classe artítisca e a comunidade apoiam esse movimento, que é legítimo, que só busca um direito que deveria ser básico: o da educação de qualidade", disse Anna Lívia Arida, diretora da ONG.
O local dos shows só será divulgado na véspera das apresentações por segurança aos alunos, segundo Anna. Ela disse que a ONG teme que possa haver alguma ação da polícia ou da secretaria para retirar os alunos das escolas que podem receber os shows. "Até porque a ideia não é o show em si, mas mostrar o apoio desses artistas."
Ainda de acordo com Anna, a ONG recebeu o cadastro de 200 bandas para shows em outras unidades. A Virada Cultural também terá oficinas e rodas de conversa na programação. "Abrimos as inscrições e várias pessoas se interessaram. Isso só mostra a força do movimento".
Reorganização. Em setembro, o secretário estadual da Educação, Herman Voorwald, divulgou uma reforma para que as escolas estaduais tenham ciclo único. A medida faz com que 754 unidades ofereçam só os anos iniciais do ensino fundamental (1.º ao 5.º ano), finais (6.º ao 9.º) ou ensino médio. Com isso, mais de 300 mil alunos serão transferidos e 93 escolas, fechadas.
O governo tem enfrentando oposição porque não dialogou com as comunidades escolares antes do anúncio do projeto. As Faculdades de Educação da Universidade de São Paulo (USP), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) já repudiaram os argumentos pedagógicos da proposta. Pesquisadores ligados à Universidade Federal do ABC (UFABC) também apontaram fragilidades no estudo da secretaria que baseou a reforma.
Entrevista com Paulo Miklos:
O que você acha da reorganização escolar do Estado de São Paulo? Acha que a reforma pode ter algum impacto positivo?
O governo do Estado quer fechar mais de 90 escolas sem ter resolvido o problema de superlotação que atinge 15% das salas de aula e sem dialogar com a comunidade escolar. É claro que os estudantes não estão satisfeitos. Como pais e cidadãos paulistas, também não deveríamos estar, principalmente dado que essa política está sendo adotada na marra, sem diálogo com a comunidade escolar.
Você considera que o governo do Estado de São Paulo errou na implementação dessa reforma? Que o governo menosprezou o poder de articulação e organização dos jovens?
Em uma democracia moderna e conectada não existe mais espaço para se tomar decisões sem dialogar amplamente com a sociedade. Fundamental é construir as políticas de educação de forma compartilhada com a comunidade escolar. A proposta de reforma do governo vai mexer em milhares de escolas e fechar quase 100 colégios. Está mexendo na vida das pessoas, alunos e pais. Daí os alunos percebem o problema e gritam, peraí! Sem conversar não vai rolar, não. E o governo tem que estar realmente aberto para debater profundamente e a ceder também, senão não é negociação. Não tem mais espaço para decisões arbitrárias feitas para as pessoas serem enquadradas, não pode mais ser assim. A principal lição que tiramos desse movimento é que são os próprios alunos dizendo para todos nós que é possível participar e nem tudo depende dos governos e políticos, o cidadão tem o poder de mudar o rumo das coisas.
Por que você decidiu apoiar o movimento?
Os alunos me inspiraram, a força vem toda deles. Como pai, me solidarizo com as famílias paulistas preocupadas em preservar o direito de seus filhos à uma educação de qualidade, sem salas superlotadas e como prioridade total de nossos governantes. Como músico, quero que a minha guitarra seja mais do que instrumento musical. Seja instrumento de mudança.
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