A recuperação do câncer de mama pode ser muito difícil para a paciente. A cirurgia de retirada da mama, a queda de cabelo e a agressividade da quimio ou radioterapia mexem muito com a autoestima da mulher.
Com todas essas dificuldades e mudanças, o esporte pode ser um um grande aliado da recuperação não só do corpo, mas da autoconfiança e da autoestima. “O esporte tem dois fundamentos que são realmente bem importantes quando a gente fala de câncer, a prevenção e o outro aspecto é pós-tratamento”, explica Fabiana Baroni Makdissi, oncologista do hospital A. C. Camargo.
Segundo a médica, o exercício físico é recomendado tanto para reduzir as chances de a doença voltar quanto para que a paciente saiba do que ela é capaz. “Temos toda a possibilidade de associar o esporte à autoestima das pacientes, porque o exercício tem essa motivação do ‘eu posso’, ‘eu vou’, ‘só depende de mim’”, afirma.
Para a recuperação de Deborah Aquino, 41 anos, a corrida foi muito importante. Antes de descobrir o câncer de mama, em 2014, ela já corria e o tratamento não a fez parar. “Eu tive que dar um tempo entre a cirurgia e a quimio[terapia], fiquei um mês e meio parada de tudo, e quando comecei a quimio, voltei a correr. Óbvio que não do jeito que eu corro”, relembra Deborah, que já completou diversas maratonas. “Corria uns oito quilômetros por semana. Fiz 16 sessões, até a quarta eu corria, depois eu nadava e pedalava.”
Ao terminar o tratamento, a corredora amadora teve pressa em voltar aos treinos. “Eu terminei a quimio dia 13 de junho de 2014 e no dia 16 de junho eu já tinha planilha”, afirma. Apesar de o começo ter sido difícil, Deborah vê que a corrida a ajudou de diversas formas: “Todo mundo que eu conheço que fez [tratamento] acaba sempre em antidepressivo, remédio para dormir, porque a quimio debilita bastante. Você continuar fazendo exercício é ótimo porque você tem uma injeção de endorfina, a serotonina. O esporte é salvador na minha vida. Ajudou a não cair em depressão.”
Além disso, é comum engordar durante o tratamento, por causa do uso de corticoide, e isso não ocorreu com Deborah. “Eu engordei super pouco durante o tratamento. Quando você faz a quimio tem muito corticoide, acaba inchando muito, mas com o esporte você tira a retenção de líquido. Então, pra autoestima foi muito bom.”
Acostumada a correr maratonas, ela encarava a químio como se fosse mais uma. “Você não sabe o que vai acontecer no quilômetro seguinte”, avalia.
A quimio de Deborah acabou em junho e em setembro ela já encarou uma meia-maratona, ou seja, 21 quilômetros, e teve um ótimo desempenho. Apesar de ter de fazer mais esforço que antes, ela voltou mais rápido que esperava. “Para autoestima foi maravilhoso, quatro meses depois do tratamento conseguir fazer uma meia. Dá sensação de que você ainda pode”, afirma.
No entanto, ela tinha um objetivo maior: correr a maratona de Boston, uma das mais almejadas pelos corredores. Para conseguir se inscrever para a prova é preciso se qualificar com um bom tempo, feito que Deborah tinha alcançado em 2014, pouco antes do diagnóstico. “A corrida que encerrou mesmo o ciclo foi Boston. Eu me emocionei muito, eu chorei do começo até o fim, porque passava um filme na minha cabeça. Quando eu cruzei a linha de chegada foi a sensação de que eu coloquei uma pedra em cima de tudo.”
Fabiana explica que o exercício, independente da modalidade, tem o foco da superação, além de ajudar a paciente a se sentir parte do tratamento. “Esses exercícios em que a superação existe, em que você tem a linha de chegada, acaba sendo o exercício que pode estimular mais [a melhora da autoconfiança]”, opina a oncologista.
Em relação àquelas que não conseguem correr, a médica diz que não há problema algum: qualquer atividade física é válida. Segundo Fabiana, o médico deve incentivar a paciente a fazer o que ela consegue, como chamar uma amiga para caminhar e conversar. “Quando ela começa a fazer alguma atividade, isso cria uma cascata e ela percebe que pode fazer outras coisas”, afirma.
Dança. No hospital A. C. Camargo há um grupo de dança para as pacientes que tiveram câncer de mama. Uma vez por semana aproximadamente 20 mulheres se encontram para ensaiar coreografias, fazer atividades lúdicas e, ao mesmo tempo, fazer fisioterapia para recuperar os movimentos dos braços.
“No momento da dança ela [paciente] se volta, ela se envolve com o grupo, com a dança e perde o medo de movimentar o membro”, explica a diretora de fisioterapia do A. C. Camargo, Celena Freire Friedrich.
Larissa Rodrigues Simões, coordenadora do grupo de dança do hospital, reforça a importância do grupo na recuperação dessas mulheres. “A maioria das pacientes, depois de fazer cirurgia, quimio, radio, se sente totalmente deslocada”, explica, “não só com a dança, com o grupo junto, elas veem que as atividades delas podem ser feitas normalmente. Uma apoia a outra e com a dança elas se sentem mais vivas.”
Celena complementa que a interação entre as participantes do grupo também faz com que a fisioterapia seja muito mais agradável.
Criado em 2015, o grupo foi consolidado em 2016 e as pacientes se apresentam em eventos do hospital. “Elas se sentem artistas, bailarinas de verdade. O momento da apresentação para elas é sagrado. A gente tem roupa personalizada, elas se maquiam”, diz Larissa. O frio na barriga, que qualquer um sente antes de uma apresentação, é muito importante para as pacientes. “Elas se sentem importantes. Elas se sentem incríveis.”
“É a conquista do paciente que acha que acabou pra ele, e não acabou”, diz Celena.
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