Há quem diga que gatos, com seus alongamentos e movimentos expansivos, são praticantes de ioga naturais. Uma cafeteria na Vila Mariana, na zona sul de São Paulo, porém, resolveu ir além, trazendo um item diferente no cardápio. Afinal, por que não incluir os felinos em aulas de ioga e, de quebra, ajudar um gatinho a encontrar o seu tutor?
Foi essa a ideia das irmãs Bruna e Luana Paroni, de 26 e 31 anos, respectivamente, idealizadoras da Gateria Cat Café, aberta em 2022, que possui parceria com ONGs de animais. Desde setembro, 75 pessoas já passaram pela YOGAteria, que também inclui os gatinhos que fazem do local o seu lar temporário. Em média, de 17 a 21 felinos vivem no Jardim dos Gatos, espaço reservado da cafeteria. Todos estão disponíveis para adoção.
Leia também
“Achamos que tem tudo a ver. É um momento de relaxamento, de conexão e enxergamos os gatos como um ‘filtrinho de energia’”, comenta Bruna. Geralmente, as aulas ocorrem aos finais de semana, antes mesmo da abertura do café, mas há planos para expandir a ideia. O limite por aula, visando o bem-estar dos humanos e dos felinos, é de 15 pessoas e é comum que as vagas se esgotem rapidamente.
“Temos a intenção de abrir cada vez mais turmas. Estamos estudando [fazer aulas] durante a semana, até para grupos, casais”, diz a idealizadora. A próxima experiência será a especial de Dia das Mães, por R$ 130, que abrange um “passaporte” para mãe e filho, ou filha. As vagas, porém, já estão esgotadas, mas é possível acompanhar a abertura das próximas pelas redes sociais da cafeteria.
Os gatos sobem no mat, deitam no colo, passeiam
O Estadão acompanhou uma das aulas da YOGAteria no sábado passado, 11, e atestou: basta estender o mat – o “tapetinho” de ioga – para que os gatos logo se acomodem para participar da aula. Os mais velhos apenas deitam no tapete para curtir o momento de relaxamento. Os filhotes, na maioria das vezes, são mais agitados: brincam com o mat, se encaixam no colo dos participantes e percorrem o local, curiosos com o “acontecimento”.
O início da aula e da música escolhida pela instrutora Evelyn Mandagaran, porém, dá um tom mais calmo. Dependendo da Asana – nome dado às posturas do ioga –, os gatinhos se acomodam em cima dos praticantes, relaxam no mat ou dormem afastados.
Quem teve uma companhia especial durante toda a aula foi a técnica em Tecnologia da Informação Lorena Sanchez, de 24 anos. Ela estava participando pela primeira vez da YOGAteria no dia em que a reportagem visitou o local. Conheceu o café pelo Instagram e, de cara, resolveu ir para participar da experiência. Uma das filhotes da Gateria também curtiu a experiência, e ora se acomodava em seu colo e ora em seu tapete.
“Eu fiz aula de ioga hoje? Médio, mas acho que essa é a intenção mesmo”, brincou. Lorena, que acabou de sair da casa dos pais para ir morar com o namorado, deixou o local decidida. Contou que pretende adotar a gatinha, que já tem até um nome escolhido: Daenerys, inspirado na personagem de Game of Thrones.
A técnica de enfermagem Anita Flávia Jeronymo, de 24 anos, como Lorena, precisou adaptar a aula para deixar que um dos filhotes do local dormisse em seu mat. Ela também estava ali pela primeira vez e também tinha ficado sabendo do local por meio do Instagram.
“Eu estava procurando por experiências diferentes e adorei. Ainda mais com um gatinho. Eles deixam tudo mais gostoso”, comentou.
Yoga ‘gentil’
A instrutora Evelyn Mandagaran mora perto da cafeteria e conta que assumiu as aulas da YOGAteria porque estava “no momento certo e no lugar certo”. Ela conheceu Bruna quando foi pela primeira vez ao local, depois passou a dar aula para as duas idealizadoras e, em seguida, foi convidada a fazer parte do projeto.
Um casamento perfeito. “Foi a união do que eu amo fazer com o que eu gosto de ter à minha volta, que são os animais”, diz.
Evelyn explica que a prática é adaptada ao espaço em que os felinos estão. Por esse motivo, quem experimentar a YOGAteria vai encontrar uma aula mais focada em relaxamento, e não com um estilo de ioga vigoroso.
“Nós propomos um ioga bem mais inclusivo, acessível e gentil”, afirma. “Se houver muitas movimentações, não vou permitir essa interação [entre humanos e gatos]. Queremos que eles cheguem perto, que façam carinho, que ‘amassem pãozinho’. [...] É um ioga mais voltado para o interno do que para o externo.”
E tem algo mais que os gatos propiciam. “Muitas vezes, estamos carregados de pensamentos, afazeres, cobranças e autocobranças. Quando você está aqui, você para, respira fundo e se permite entrar na energia deles durante uma hora”, diz.
Evelyn diz acreditar que os felinos são a “expressão do amor”. “Nós, por meio do ioga, buscamos conquistar e acessar esse amor dentro de nós porque, no fundo, a nossa essência é feita de amor. Então como não ser perfeito? Eles são um ‘veículo’ para acessarmos melhor isso que já temos dentro de nós”, explica.
Além disso, observar os movimentos dos gatos durante uma aula de ioga também pode ser um enorme aprendizado na questão física do corpo. “Ao longo dos anos, vamos pressionando muito o corpo, trazendo nossas tensões para as articulações e os músculos. [Os gatos] se alongam, se exercitam instintivamente, coisa que também deveríamos fazer.”
Como adotar um gatinho da Gateria Cat Cafe?
Quem se apaixona por um gato fazendo a YOGAteria ou apenas os visitando no Jardim dos Gatos (veja como fazer uma visita abaixo) e decide adotá-lo passa pelo processo de “adoção responsável”. O interessado precisa preencher um formulário que será analisado pela ONG responsável.
Em cerca de uma semana, a ONG entra em contato para fazer uma entrevista com o possível tutor. Segundo as idealizadoras da Gateria, há uma série de exigências, como ter a casa telada e ser maior de idade. Caso seja aprovado, o interessado vai até o café buscar o gatinho e passa pelo “ritual de adoção”.
“Todos os gatos ganham um kit de adoção com brindes de todos os nossos parceiros, como comedouro, ração, areia”, diz Bruna. Os funcionários da cafeteria ainda tiram uma foto do gato para fixá-la na “árvore das adoções”. No último sábado de abril, a árvore chegou a 200 fotos fixadas – ou seja, 200 gatinhos já foram adotados na Gateria.
Quando um gato é adotado, uma nova vaga é aberta no Jardim dos Gatos. Todos os que chegam ao local precisam estar castrados e passar por um protocolo de vacinas e exames.
De todas as adoções, houve duas, em especial, que mais tocaram as idealizadoras. Bruna cita o acolhimento, lá, de AJ, um gatinho diagnosticado com peritonite infecciosa felina (PIF) – doença viral que faz com que o animal perca os movimentos do corpo.
À época, o local precisou fazer rifas e sorteios para arcar com o tratamento. “Ele ficou entre a vida e a morte e ficamos completamente desesperados, porque é um tratamento muito caro”, diz Bruna.
A história de AJ, porém, teve um final feliz: hoje, ele está completamente curado e em uma casa nova. “A intenção era que ele voltasse para a Gateria para ser adotado, mas eu fiz lar temporário para ele, me apaixonei perdidamente e, hoje, ele é meu ‘filho’”, brinca Bruna.
Já Luana menciona a adoção de Blanche, uma gatinha cega. O local precisou fazer adaptações para recebê-la, mas foi ela quem rapidamente se adaptou à Gateria. “Nós a subestimamos, porque no fim ela ‘deu um baile’ na gente”, brinca. Blanche acabou sendo adotada por uma médica, que nunca havia sido tutora de nenhum gato e dedicou visitas recorrentes à cafeteria para entender as demandas da gatinha.
Como ir à Gateria apenas para visitar os gatos?
É possível visitar o Jardim dos Gatos e aproveitar para tomar um café em qualquer dia de abertura da Gateria – o local funciona de terça a domingo. Antes, porém, é necessário comprar uma entrada para o Jardim.
O valor é R$ 19,70 por pessoa e dá direito a 30 minutos em meio aos gatinhos. Segundo as idealizadoras, uma parte é revertida para os cuidados dos gatos no local e outra, doada para as ONGs parceiras. Veja como comprar aqui.
Há uma série de regras para entrar no Jardim: não pegar os gatinhos no colo, a menos que eles se acomodem nos visitantes; tirar fotos sem flash; não fazer muito barulho; esperar os gatos despertarem, caso estejam dormindo; não se alimentar no local e respeitar o espaço dos felinos.
A cafeteria permite que os visitantes levem café para o local, mas com a tampa bem fechada. Além disso, crianças menores de 12 anos precisam estar acompanhadas dos pais ou responsáveis.
Também é possível visitar a Gateria apenas para tomar um café ou um brunch. O local oferece um cardápio bem extenso de cafés quentes e gelados, chás, croissants, pães de queijo, toasts, quiches, bowls e doces.
Bruna e Luana comemoram a visibilidade da Gateria e consideram que o local se tornou um “novo agente no processo de adoção”. “Conseguimos doar gatos que imaginávamos que não teriam adotantes”, diz Bruna. A cafeteria já conseguiu, segundo Luana, fazer até com que gatos mais idosos – uma de 10 e outro de 12 – encontrassem um novo lar.
Bruna, porém, define o maior sonho da Gateria: “Se fosse para falar um sonho de verdade era que a gente não tivesse mais nenhum gato para doar. Infelizmente, esse é um sonho irreal”. “Mas conseguir passar essa informação [sobre cuidados com animais] é muito importante”, completa Luana.
Serviço - Gateria Cat Cafe e YOGAteria
Onde: R. Dr José de Queirós Aranha, 358A - Vila Mariana
Horários: Ter a Sex das 10h30 às 18h; Sáb e Dom das 9h30 às 19h
Telefone: (11) 94150-1843
Valor do Jardim dos Gatos: R$ 19,70
Valor da YOGAteria: a partir de R$ 75
Acompanhe as redes sociais da Gateria Cat Cafe para saber das próximas datas da YOGAteria.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.