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Uma alimentação consciente no paraíso da comilança

CEO da Korin fala sobre os desafios de comercializar orgânicos no País

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Por Juliana Carreiro
Ovos orgânicos da Korin Alimentos  

Falta de incentivos fiscais, lacuna no campo da pesquisa e carência de incentivos governamentais. O CEO da Korin Alimentos conta o que está por trás do custo dos orgânicos no Brasil

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Promover o equilíbrio entre a saúde humana, a preservação do homem no campo e o uso dos recursos naturais, este é um dos objetivos da agricultura natural. O método foi criado na década de 30, no Japão, por Mokiti Okada, criador da Igreja Messiânica Mundial, como alternativa para o uso excessivo de agroquímicos no solo, cujas consequências negativas o preocupavam. Segundo ele, a qualidade do solo é primordial para a obtenção de boas colheitas e a sua fertilização consiste no fortalecimento de sua energia natural. 

Em 1994, foi fundada a Korin Agropecuária, com a missão de fomentar, escoar e comercializar a produção dos agricultores praticantes da agricultura natural. Hoje a empresa tem mais de quarenta fornecedores de orgânicos que recebem uma capacitação para replicar o modelo de Mokiti Okada. Para falar sobre o desafio de manter um mercado exclusivamente de orgânicos, eu conversei com o CEO da Korin Alimentos, Luiz Carlos Demattê. 

-Como a Korin Alimentos se relaciona com a Agricultura Natural? 

L.C.D.

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"A Korin foi fundada com a missão de comercializar os frutos da agricultura natural, que tem como objetivo a construção de um mundo ideal. Segundo Mokiti Okada, um mundo isento da doença, da pobreza e do conflito. Dentro da filosofia de trabalho que ele desenvolveu, para o ser humano atingir esse estado, é necessário que a agricultura seja natural, porque as práticas agrícolas, que não seguem os seus princípios, são bastante impactantes para a saúde humana. A Korin é uma empresa que conseguiu servir como um exemplo, um modelo para mostrar que é possível aplicar essa visão na prática.  

Nós da Korin e a Fundação Mokiti Okada participamos dos movimentos que resultaram nos marcos regulatórios para que a produção dos orgânicos tivesse condições de crescer no nosso País. Porque não faz sentido praticar a agricultura natural, se as pessoas não tiverem acesso a esses alimentos. Então, o nosso grande desafio sempre foi escalonar o sistema, os processos, as produções, de tal forma que a gente pudesse atender aos anseios da sociedade que veem crescendo. As pessoas estão ficando cada vez mais conscientes, capazes de tomar decisões em relação ao alimento, porque ele tem um efeito direto sobre o nosso bem-estar, sobre a nossa saúde".

-A Korin trabalha em parceria com mais de 40 produtores rurais. Como é essa relação com os fornecedores?

L.C.D.

"O nosso objetivo sempre foi promover soluções nos sistemas produtivos. O frango vem de uma cadeia produtiva, o ovo de outra, o peixe, a carne bovina, os vegetais, a batata, o tomate, a cenoura, as folhas, cada uma tem quase um universo de coisas acontecendo ali. Então, como a gente tem os cereais, o arroz, o feijão, o mel, que vem crescendo, cada uma delas tem suas especificidades e seus produtores. Nós temos o mel que vem de Minas Gerais; o peixe que vem do Mato Grosso do Sul e Norte de São Paulo; temos a truta, que vem do Sul de Minas; o arroz vem do Rio Grande do Sul; os cereais, do Paraná; a produção de frango, do interior de São Paulo.

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Quando a gente começa a comercializar um produto nós vamos dando condição para que esses produtos tenham um canal de comercialização, um escoamento, e um escoamento com valor, para que os produtores, que vão se inserindo nessas cadeias, consigam capturar uma parte desse valor que a Korin tem enquanto marca, isso é uma das coisas que traz sustentabilidade para o sistema. E a gente vem fazendo todos os esforços para disponibilizar para o maior número possível de pessoas e fazer com que esses sistemas cresçam, tornem-se robustos, resilientes. Mas a gente sofre bastante porque de fato os orgânicos ainda são nichos, ainda não é o mainstream, mas ano a ano o setor vem crescendo".

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-Como você tem visto a profissionalização desses produtores?

L.C.D.

Seria necessário um apoio maior, sem dúvida, para possibilitar o aumento da profissionalização, porque o agricultor tem uma dificuldade enorme de fazer a transição (agroecológica). Quando ele pretende, por exemplo, chegar no nível de uma certificação orgânica, ele tem lá todo um trabalho que leva tempo e não consegue ainda capturar o valor daquele produto, valor que ele precisaria para bancar a certificação. De maneira geral, um agricultor de pequena escala, ele não é um cara capitalizado, depende de recursos que fiquem em condições mais favoráveis. Isso até vem acontecendo, mas uma coisa é falar que existe o recurso, outra coisa é o recurso se destinar a mecanismos, a processos de transição agroecológica.

-Você acha que falta incentivo federal, estadual, municipal? 

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L.C.D.

"Em todos os níveis, sem dúvida nenhuma, eu acho que ainda falta para os nossos governantes, para os nossos legisladores, um conhecimento maior do impacto benéfico que esses sistemas trazem, falta uma visão mais clara do quanto isso gera valor. Quando eu falo em valor, eu estou falando no valor ambiental, no valor paisagístico, no valor social, na saúde".

-O aumento da demanda pelos orgânicos poderia auxiliar na diminuição dos preços destes produtos?

L.C.D.

"Se produzir mais, só o efeito sobre o transporte, a armazenagem, a logística, e a cadeia de suprimentos já seria benéfico. Por exemplo, o milho não-orgânico pode ser colocado em um armazém e misturado com outros, eu coloco 500 toneladas de milho, depois vou pegar 500 toneladas de milho. Mas quando você fala em milho orgânico, você não consegue misturar com  outros, eu tenho que ter um silo ou uma estrutura dedicada a isso. E essa estrutura dedicada custa mais caro. 

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Então é importante os consumidores compreenderem que não é simplesmente uma questão de visar o lucro, obviamente, ele é necessário, mas não queremos que sejam produtos elitizados. Outro fator importante é a questão da carência de pesquisa e de recursos que o Estado ou instituições pudessem oferecer para que a gente resolvesse alguns gargalos na produção de orgânicos e com isso, obviamente, contribuir para que a escala aumente e que os custos caiam. Porque existem muitos gargalos ainda que trazem uma dificuldade do sistema fluir". 

-O que está por trás desse preço?

L.C.D.

"Por trás desse preço está todo um mecanismo de certificação, a questão logística, as escalas são menores e, consequentemente, o custo unitário é maior, tem a questão fiscal. Há impostos que deveriam ser balanceados. Por exemplo, quando eu transporto milho, se eu pego milho que vem lá do Mato Grosso do Sul tem o ICM, que incide sobre o preço da mercadoria. Tem um percentual de 6 a 12% dependendo das taxações. Quando eu trago um milho orgânico, ele tem um preço maior, então, o ICM também é maior, tem um efeito dominó. 

Agora, se eu trago um milho orgânico de lá, pensando no benefício que ele deixa naquele local, porque ele melhora o solo, não usei inseticidas, herbicidas, uma série de substâncias que geram impacto ambiental, esse benefício ambiental que é óbvio, que já está claro, o benefício na biodiversidade, deveria ser valorizado pelos governantes. Assim, ao invés de cobrar 6% do ICM, poderiam cobrar 4, aí a cadeia receberia esse milho em melhores condições e o produto chegaria no mercado mais barato. É importante dizer sobre a questão do preço, que ninguém tem interesse em colocar o valor de um produto lá em cima, porque ele reduz o seu mercado, é uma consequência de todas essas situações que desfavorecem a precificação, desfavorecem a planilha de custos desses sistemas".

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-Quando a gente pensa em orgânico lembra mais da parte de hortifruti, é difícil pensar em carne, ovo, frango. O que está por trás de uma produção de um frango orgânico, por exemplo? 

L.C.D.

"Então, quando nós vamos para uma cadeia animal a complexidade é maior ainda. Porque um produto, por exemplo, uma folha orgânica, ela está ali, passou por uma seleção, é limpa e embalada. Agora, um produto de origem animal passa por um processo industrial, por um processo de certificação e de inspeção sanitária, que é o Serviço de Inspeção Federal, Estadual ou Municipal. Quando eu falei do milho, por exemplo, é o alimento desses animais, então tem um efeito dominó, um efeito de escala. Por conta dos tributos, o custo vai majorando na medida em que a cadeia vai chegando lá na ponta para o consumidor final. 

Não se pode usar todas essas substâncias que são normalmente utilizadas com a finalidade de ampliar a produção, nem antibióticos... A gente desenvolveu tecnologia e conhecimento para não precisar disso e é perfeitamente possível, temos índices produtivos muito bons, comparáveis a qualquer outro sistema. Porque existe um efeito ambiental. Existem bilhões de animais no mundo recebendo antibióticos, promotores de crescimento, antioxidantes, quimioterápicos, inseticidas, vermífugos, carrapaticidas, que ambientalmente trazem impacto. E aquilo que traz impacto ambiental vem pra gente de um jeito ou de outro." 

Este post é parte da rede Conexão Solo Vivo.

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