Capacitismo: pessoas com deficiência explicam o que é e como evitá-lo

Criação de estereótipos, falta de representação, espaços inacessíveis e efeitos psicológicos são alguns dos efeitos desse tipo de preconceito

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Por João Pedro Malar
Atualização:
Pessoas com deficiência falam sobre os efeitos diários do capacitismo, o preconceito contra PCDs, em suas vidas Foto: Fatine oliveira / Arquivo Pessoal I Mariana Rosa / Arquivo Pessoal I Luciana Viegas Caetano / Arquivo Pessoal

Quantas pessoas com deficiência trabalham com você? Ou são colegas de estudo? Amigos? Essas perguntas podem parecer desconexas, mas fazem parte de uma reflexão para entender algumas das consequências do capacitismo na sociedade.

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O termo pode parecer estranho, mas tem ganhado espaço em discussões nas redes sociais. Afinal, o que é o capacitismo? Em entrevista para o Estadão, cinco pessoas com deficiência (PcDs) responderam a essa pergunta e explicaram como o capacitismo as afeta no dia a dia.

O consenso é que o capacitismo é uma forma de preconceito com pessoas com deficiência, e está enraizado na sociedade. Como o termo diz, envolve uma pré-concepção sobre as capacidades que uma pessoa tem ou não devido a uma deficiência, e geralmente reduz uma pessoa a essa deficiência.

Na prática, o capacitismo não envolve apenas termos ofensivos, olhares de julgamento ou invasões de privacidade. Ele está ligado à uma ausência de pessoas com deficiência em diversos espaços da sociedade.

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Dados do censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010 apontam que cerca de 24% da população - 46 milhões de brasileiros - têm algum tipo de deficiência, outro levantamento do IBGE, com outra metodologia, aponta que existem 13 milhões de pessoas com deficiência (pouco mais de 6% da população brasileira) no Brasil. No mercado de trabalho, porém, existem apenas 440 mil profissionais com deficiência em trabalhos formais.

Mas como o capacitismo se manifesta no dia a dia e como evitar reproduzir falas e atitudes capacitistas? Confira o depoimento de cinco pessoas com deficiência sobre o tema:

"Fiquei com um grande conflito, e achava que a culpa era da deficiência"

A publicitária Fatine Oliveira, que estuda a representação de mulheres com deficiência no Instagram seu mestrado na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), tem 35 anos e se tornou cadeirante aos oito, devido aos efeitos da distrofia muscular que possue. Para ela, o capacitismo é “algo opressor, preconceituoso, que categoriza determinadas formas de deficiência”.

Ela observa que ele se manifesta de forma sutil, de diversas maneiras: o olhar de estranhamento na rua, as falas de dó, a surpresa pela pessoa ter feito algo que seria visto como impossível, as pessoas que conversam com ela em tom infantilizado, além de comentários como “dar uma de João sem braço” e chamar alguém de “retardado”.

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Todas essas atitudes têm, em comum, a visão prévia de como é ser uma pessoa com deficiência e o que ela pode ou não fazer, mesmo sem conhecê-la. Fatine conta que, enquanto crescia nas décadas de 1980 e 1990, notava que as pessoas sempre falavam de pessoas com deficiência em um tom de coitadismo.

Fatine Oliveira tem 35 anos e atualmente realiza uma pesquisa de mestrado envolvendo o capacitismo Foto: Fatine Oliveira / Arquivo Pessoal

“Nunca achei que as coisas que eu fazia, só porque eu estava na cadeira de rodas, eram extraordinárias. Era meu modo de viver. Eu fiquei com um grande conflito, e achava que a culpa era da deficiência”, comenta ela, mostrando que o capacitismo também se manifesta na super exaltação de uma pessoa com deficiência, e que isso também cria determinados modelos de comportamento e comparação que não são saudáveis.

O conflito que Fatine sentia consigo foi resolvido quando ela percebeu que isso era algo comum em pessoas com deficiência: “Encontrei blogs de pessoas com deficiência e vi que outras pessoas se sentiam deslocadas. Tive uma sensação de que o problema não era comigo, que tinha algo além”.

A publicitária ressalta que o capacitismo, muitas vezes, se misturava com o machismo. Ela explica que as pessoas “acham que mulher com deficiência não pode ter filhos”, já que, no olhar que mistura os dois preconceitos, as mulheres com deficiência não seriam capazes de realizar atividades associadas a mulheres.

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“Meu corpo não era visto como corpo feminino, não esperavam que eu tivesse namorado, e eu não entendia porque não poderia ter essas coisas, sou uma pessoa como qualquer outra”.

Para ela, o contato com pessoas com deficiência é o principal para superar o capacitismo. “Estudei em escolas regulares, não necessariamente inclusivas, mas que se tornaram inclusivas com a minha chegada. Tive muito acolhimento dos amigos, na escola e na universidade, que duram até hoje, e eles passaram a ter outra compreensão da deficiência com o contato”, explica.

Mas ela alerta que é importante respeitar o consentimento das pessoas com deficiência, perguntando se pode ajudar, se a pessoa precisa de ajuda, o seu nome. Ela lembra de episódios em que pessoas tiraram fotos ou tocaram nela sem sua permissão, e que isso pode inclusive permitir assédios a mulheres com deficiência.

Uma vantagem que Fatine aponta é que, hoje, as pessoas com deficiência estão muito mais presentes na sociedade e na internet, e é possível conversar com eles e acompanhar conteúdos, como o que ela produz em seu blogue. Mas ela deixa um aviso: “Tem gente disposta a ensinar, outras não, e está tudo bem”.

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'Deficiência não faz ninguém menor'

Para a jornalista Mariana Rosa, de 43 anos, se chamar de pessoa com deficiência é algo recente. Ela conta que apenas “saiu do armário” sobre sua deficiência no começo de 2020. Deficiente visual, ela não tem visão em um olho e possui cerca de 30 a 40% de visão no outro, mas a ausência de um elemento aparente de deficiência faz com que ela já tenha ouvido pessoas que duvidassem de sua deficiência.

“Parece que não tenho a deficiência, os suportes que eu preciso são simples, leitor de tela, lupa. As pessoas olham pro meu corpo e como a questão do olho não é aparente, nem sempre parece que eu sou deficiente”, explica.  Para Mariana, o capacitismo é “essa possibilidade que as pessoas têm de hierarquizar as vidas humanas, elegemos o que é normal, o que achamos que é. Mas isso é algo absolutamente arbitrário, uma construção social, que varia na época e sociedade”. E, nessa construção, o que não é “normal” é visto como desvio, um problema.

Mãe de uma criança de sete anos que é cadeirante, a jornalista comenta que suas experiências a permitiram perceber que “a deficiência não faz ninguém menor, tem muitos aspectos de complementaridade, bonitos”.

A jornalista Mariana Rosa é deficiente visual, e destaca que o capacitismos e mistura com outros preconceitos, como o machismo Foto: Mariana Rosa / Arquivo Pessoal

Mas muitos não compartilham dessa visão. Ela lembra que chegou a ouvir de médicos que “se fosse cega, quem cuidaria da filha? É uma mistura de machismo e capacitismo, achar que apessoa cega não seria capaz de cuidar apenas por não ter a visão, como se não pudesse dar afeto, atenção. Machismo de achar que só a mulher cuida da filha, a responsabilidade não é só minha”.

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Ela observa que o capacitismo é algo estrutural da sociedade, e que muitos o reproduzem “sem perceber”, já que ser capacitista é o “normal”. “Tem a ver com a expectativa que se coloca sobre essas pessoas [com deficiência], que é baixa, a incapacidade de presumir competências, de pessoas com deficiência não serem vistas como sujeitos, que não podem decidir de si, não ter protagonismo”, explica.

Ela lembra que, quando descobriu que estava desenvolvendo baixa visão, ouviu no trabalho que sua carreira “acabou”, pois não poderia mais escrever. “Outro colega, que deveria fornecer a estrutura adaptada para mim, disse que a parte boa era que a empresa poderia colocar na lei de cotas, pois a empresa estava defasada e vai poder bater a meta”, lembra Mariana.

“É muito ruim ouvir isso, a gente não se acostuma com linguagem violenta, não deveria se acostumar. É difícil, a gente vai se aprendendo a se colocar, pois quando nos colocamos, educamos”, destaca.

Ela comenta que superar o capacitismo envolve “aprender, aumentar o repertório”, mas que as pessoas devem ter iniciativa para fazer isso por conta própria. “Nós somos pessoas, a deficiência é componente, não o todo, não é toda a identidade”, comenta a jornalista.

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Outro ponto que ela julga essencial é a convivência, que deve ocorrer desde os primeiros anos de vida: “a humanidade se empobrece quando temos a convivência apequenada, o repertório de mundo diminui. Não podemos apenas saber conviver com um único grupo de pessoa, nossa geração viveu em escolas segregadas, e não temos repertório para conviver, respeitar, olhar sem estranhamento”.

“Na conversa, não suponham que sempre precisamos de ajuda, perguntem antes, não façam coisas por nós, a intenção pode ser boa, mas a gente percebe que por trás dela tem um julgamento de que eu não sou capaz. Sempre presuma de que eu sou capaz, talvez de um jeito que você desconheça, e que se eu precisar de ajuda, eu vou pedir”.

'A gente nunca é visto como humano, ou é o coitado ou é o super-herói'

Vitória Bernardes é representante da organização Amigos Múltiplos pela Esclerose (AME) no Conselho Nacional de Saúde, envolvida diretamente com a luta contra o capacitismo. Após ser vítima de arma de fogo, ela se tornou cadeirante, e notou uma mudança na forma como era tratada pelas pessoas.

“Passei a ser vista de forma diferente do que era vista antes, e não foi de uma forma positiva. Foi uma forma de ser impedida de ocupar todos os espaços, ser questionada da capacidade de entender coisas, de falar por mim. Entendi que era pelo fato de ter me tornado uma pessoa com deficiência”, relata ela.

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Ela considera que o capacitismo é “a ideia falaciosa de que existe uma capacidade plena. E quando falamos disso esquecemos que ela não existe, mas quem possui essa ideia falaciosa é quem está no poder. Ele é uma estrutura de dominação, como o racismo, machismo, que tenta desconectar desses valores construídos para explicar porque permanecemos na margem da sociedade”.

Vitória Bernardes atua como conselheira no Conselho Nacional de Saúde, e destaca a importância da representação política Foto: Daiane Lopez Peixoto

Assim, ela considera que o capacitismo tem como função evitar que as pessoas questionem a baixa presença de pessoas com deficiência no mercado de trabalho, ou sua representação política. Hoje, no Congresso Nacional, há apenas dois congressistas com deficiência: o deputado federal Felipe Rigoni (PSB-ES), que é cego, e a senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP), que é cadeirante.

Um problema ligado ao capacitismo é o que Vitória chama de “individualização” de uma estrutura social: “a imprensa também sempre fala de superação, a pessoa que contraria as expectativas e dá certo, sendo que as expectativas criadas dizem respeito a um capacitismo que os coloca como incapazes. Quando é expectativa é baixa, qualquer coisa que fazemos parece ser grande”.

“Fala-se muito das histórias individuais sem reconhecer que é difícil pois as barreiras em diversas áreas, como educação, mercado de trabalho, impedem que PcDs possam ocupar espaços. As cicatrizes são coadjuvantes da história, e a nossa história é de ser humano como qualquer outro”, ressalta a conselheira.

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Ela considera que é importante refletir a forma como as pessoas com deficiência são referenciadas em espaços em que não estão presentes, citando expressões como  “será que vou ter perna pra isso”: “Parece que é só uma expressão, mas é um recorte, uma ideia de incapacidade para nós.É muito simbólico o quanto só somos lembrados quando somos usados como exemplos do que não se pode fazer, do que é incompleto, ruim”.

“A gente nunca é visto como humano, ou é o coitado ou é o super-herói. É importante pensar que a violência com a pessoa com deficiência vem fantasiada no lugar de cuidado, proteção, as violências para outros grupos podem ser mais explícitas, mais agressivas”, alerta, lembrando de vezes que foi abordada na rua por pessoas que questionavam quem tinha “deixado ela sair”.

Indo além da necessidade das pessoas se informaram sobre o tema, ela opina que a forma mais poderosa de superar o capacitismo é ter pessoas com deficiência “ocupando espaços, sendo vistas”. “Os espaços podem ganhar com a gente, mas se não estamos nele, continuamos sendo vistos como corpos estranhos. Garantir essa inclusão é o primeiro passo, o mais revolucionário para que aumentem o repertório sobre quem nós somos. Se não ocupa esse lugar mais básico, vira um efeito dominó da exclusão”, afirma.

Vitória também é mãe, e destaca o efeito que o capacitismo também tem em sua filha. “Falavam ‘ai que bom, ela vai poder cuidar de você’. É muito ruim tentar construir uma ideia sobre o corpo, e o da minha filha, de que ela tem que cuidar de mim, isso inverte os papéis, coloca um peso nela”, relata.

“É muito triste quando você já tem tantas inseguranças, e que nem vem tanto da deficiência, vem da cobrança, de que você vai estar sempre sendo julgada, acham que vai estar sempre falhando, é mais um fator de adoecimento”, afirma Vitória, citando os impactos que o preconceito tem na saúde mental das pessoas com deficiência.

“O que dá o direito de alguém, que você não conhece, vir, interferir, falar, dar uma receita mágica sobre a vida, que você não pediu? E isso envolve o capacitismo”, questiona, concluindo com a reflexão de que “a gente é muito estudado, mas não construímos esse conhecimento”.

'Tive que redesenhar o desejo, a história, sobre o que queria ser'

O ator, diretor e roteirista Victor Di Marco comenta que um marco bem grande envolvendo o capacitismo em sua vida ocorreu quando ele tentou entrar na faculdade, no curso de artes visuais, e não pode concluir o processo seletivo pois, devido à sua deficiência motora, não conseguia fazer uma prova prática de desenho.

“Eu já sofri muitos tipos de capacitismo, mas eles eram 'bem feitos', porque ele nem sempre vem de uma forma direta, é um olhar, um gesto de pena ou cuidado, e dessa vez foi quando eu senti de uma forma bem violenta”, lembra ele. Com 24 anos, Victor explica que, com esse episódio teve que “redesenhar o desejo, a história, sobre o que queria ser”.

Para ele, o capacitismo “é um preconceito, mas muito mais do que isso, é uma opressão, que as pessoas com deficiência sofrem. É uma opressão que está na nossa mente, na nossa estrutura social, e parte do princípio de que pessoa com deficiência não são capazes de serem autônomas, terem uma vida”.

O diretor, que também produz vídeos no Instagram sobre o tema, comenta que, por ser estrutural, o capacitismo está presente em todas as pessoas, mesmo que elas não admitam. “O ato de se entender capacitista implica em não querer ser capacitista, e para isso precisa ir atrás, ver pessoa com deficiência que fazem conteúdo, livros”, sugere ele.

Mas é o afeto que, na opinião de Victor, mais importa na luta contra o capacitismo: “as pessoas não estão acostumadas a terem amigos, namorados, com deficiência, se você tem uma relação de afeto, você começa a falar sobre uma real mudança”.

Ele comenta que seu desejo é de que a deficiência “seja lida apenas como uma deficiência, não como um rótulo”, e que não seja exigido dele de que, para ser tratado como “normal”, precise esconder sua deficiência. “Antes da deficiência, vem a pessoa”, resume. O ator destaca que a própria pessoa com deficiência precisa passar por um processo de autoaceitação, consequência do capacitismo. “Ele faz com que a gente se odeie, que a gente ache que não é digno de ter uma vida, que a gente odeie nosso corpo. Superar envolve um amor próprio, uma aceitação, e isso é algo diário, não é algo que eu acho que seja finito, é uma prática diária”.

O diretor também destaca a importância dos ambientes inclusivos, que já começam na escola, criticando um decreto recente do Governo Federal sobre o tema: “Se você não cresce com diversidade, não acha que diversidade é algo normal”.

Ele conclui destacando que esperar ver mais espaço para as pessoas com deficiência falarem sobre suas vidas e os temas que consideram importantes. E para quem quer ser anti capacitista, uma sugestão é deixar de lado expressões como “que mancada, retardado, dar uma de João sem braço, to cego, to surdo”: “Se para de usar, rompe com o pensamento que elas representam”.

'Deficiência no Brasil é ligada muito à dignidade'

Luciana Viegas Caetano atua como professora em escolas inclusivas há alguns anos, mas apenas recentemente descobriu que fazia parte do grupo com quem tinha tanto contato. Em 2019, ela foi diagnosticada pela primeira vez com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Ela considera que seu diagnóstico, na verdade, só veio por causa do filho, que tem três anos e é autista.

“Já tinha sido diagnosticada com bipolaridade, depressão, várias doenças mentais, e nunca olhavam pra mim pensando que poderia ser autista, até que um médico notou que eu tinha reações comuns a de autistas adultos”, lembra ela.

Mesmo sem ser diagnosticada, a professora já lidava há anos com os efeitos do TEA, que varia em diferentes graus ou níveis de suporte - dependendo da classificação. “A sala de aula é um ambiente muito intenso de estímulos”, explica ela, e esses estímulos geram fortes crises de enxaqueca e muito cansaço.

Luciana Viegas Caetano foi diagnóstica com Transtorno do Espectro Autista em 2019, já adulta Foto: Luciana Viegas Caetano / Arquivo Pessoal

Luciana também faz um aviso importante quando se fala do TEA: “estamos falando do autismo da Luciana, tem o do meu filho, de outras pessoas. O que nos faz ser chamados de autistas é a dificuldade na conversação, a forma como o cérebro funciona. Ele funciona diferente, é uma percepção diferente de mundo, eu recebo mais informações do meu cérebro”.

Ela considera que essa grande variação, um pouco mais conhecida na sociedade, também tem seu lado negativo, pensando em seu contexto como uma autista com grau de s. “Às vezes parece que quer dizer que é um autismo melhor que o outro, não gosto de dizer que meu autismo é leve, tem coisas que não leves de se levar”.

A professora atribui seu diagnóstico tardio a alguns fatores, mas em especial uma mistura de machismo, capacitismo e racismo. Ela conta que já ouviu que não teria autismo pois “era casada": "como se pessoa com autismo não pudesse se casar”.

“Passei por vários processos dolorosos de racismo na infância, e era muito quieta, imitava os colegas, mesmo sem entender porque eles faziam o que faziam. Quando duvidei que meu filho era autista, ouvi que ele talvez fosse apenas mal educado”, lembra ela.

Luciana comenta que o capacitismo “tem a mesma função de outros preconceitos, é uma forma de opressão que as pessoas com deficiência sofrem”. Ela explica que um espaço “capacitista” é um espaço inacessível, e uma forma simples de identificá-los é ver se, afinal, há algum PcD nele.

Ela destaca que conhecer mais sobre o tema é entender também que ainda existem formas de acessibilidade, de comunicação, que são ignoradas, e que é necessário de informar sobre o tema. Saber que uma pessoa com deficiência auditiva, por exemplo, pode falar, pode ouvir com um aparelho auditivo e não precisa saber, necessariamente, a Língua Brasileira de Sinais (Libras).

“Deficiência no Brasil é ligada muito à dignidade. Tem os dois tipos de estereótipos. Elas não são tratadas como pessoas, vira algo intocável, ou algo inútil. Isso começa a surgir com o autismo, quando falam que todo autista é super inteligente, ‘apesar de autista’, como se precisasse ser super inteligente para ter valor”, opina ela.

A professora considera que é difícil para pessoas sem deficiência entenderem as inacessibilidades de um espaço, e por isso mesmo ele deve ser ocupado por pessoas com deficiência. Além disso, ela considera importante “conviver, ter afetos, relações como qualquer outra pessoa com uma PcD”.

Depois de entender que uma pessoa com deficiência é uma pessoa como qualquer outra, ela considera importante “tratar PcDs como pessoa, não infantilizar, não achar que ela é incapaz”. “Quando fala que a PcD é pessoa, quer dizer que ela namora, beija, transa, trabalha, dá a luz, ela é uma pessoa, e deve ter autonomia como qualquer outra pessoa”.

“Representatividade é importante, precisa disso em todos os espaços, ver pessoas que são orgulhosas do que são, e que recebem afeto, são olhadas”, ressalta Luciana, que também faz um pedido: “Conviva com pessoas com deficiência, siga nas redes sociais, ouça elas. Eu só entendi a importância da inclusão quando tive um amigo surdo”.

*Estagiário sob supervisão de Charlise Morais

**Atualizada em 19/10/2020, às 13h12

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