Nesta semana, após uma figurinista da Globo ter revelado que sofreu assédio por parte de Jose Mayer, o tema do assédio sexual no ambiente de trabalho veio à tona. Esse tipo de situação é, infelizmente, mais comum do que se imagina e pode ocorrer em qualquer tipo de empresa, como exemplificam alguns dos relatos abaixo, de pessoas que preferiram não se identificar.
Meu chefe vivia falando do meu corpo e das roupas que eu escolhia. Se usava um vestido ou saia, dizia que eu estava 'toda sexy'. Outro dia, quando apareci de batom vermelho, chegou a dizer que eu estava 'parecendo uma ninfeta'. Algumas vezes, passava a mãe no meu cabelo, no meu ombro, e falava alto na agência para todos ouvirem que 'tinha sorte o homem que me pegasse'. Nunca tive coragem de ir até o RH porque ele era o chefe, e tive medo de me queimar na área, mas pedi demissão depois de três meses passando por isso.' - A. N.
"Meu superior pegou o número do meu celular e vivia mandando mensagens aos finais de semana, à noite, de madrugada me chamando para sair e dizendo que estava com saudades. Durante as férias, inclusive. Eu sempre esquivei, recusei, mas ele nunca desistiu. Sempre comentava das minhas roupas, me chamava de 'morena bonita', falava como gostava das minhas pernas e insistia em me abraçar na frente de todos, me deixando desconfortável e constrangida. Nunca denunciei porque ele é um importante profissional da área jurídica, então acho que só iria ficar ruim pra mim. Continuei aguentando a situação por mais de um ano até sair de lá' - M. F.
"Ficar sozinha com o meu chefe no escritório virou rotina. Fui pra uma reunião em outra cidade com ele. Pegamos o carro e fomos para Santos de manhã. Depois de um dia todo com o cliente, subimos para São Paulo e o assunto no carro não estava me deixando confortável. Ele começou a falar mal da mulher e, quando finalmente consegui trocar de assunto, ele falava da época que ele era jovem e ia para baladas. Bebia e fumava, transava com as meninas chapado de maconha e outras experiências que não me deixava ficar confortável com ele no carro. Assim que chegamos próximo a minha rua, eu achei que estava tudo bem, mas ele voltou a tocar no assunto da mulher… disse que o casamento não ia bem e que eu o estava provocando. Um absurdo! Assim que ele parou em frente de casa, insistiu para irmos num bar e eu disse que queria ir para casa imediatamente. E quando saí meio desesperada do carro ele disse que era para eu sair correndo mesmo…. disse que eu deveria sair correndo do carro dele porque ele tinha um monstrinho interno que nao podia ser acordado e que se eu nao saísse imediatamente do carro dele ia dar errado. Só me lembro de sair correndo, literalmente, do carro dele e ir para casa chorar. Não consegui dormir aquela noite, porque foi muito chata a situação. (...) Os dias seguiram bem mal. Um dia, fui comer uma banana e ele simplesmente virou pra mim e disse que não conseguia se concentrar mais no que estava falando. Ou quando uma menina que trabalhou comigo estava tomando sorvete e ele soltou outro comentário nojento. Fiquei seis meses lá. Comecei a procurar emprego e prometi que nunca mais iria trabalhar numa agência de novo'. - K. M.
De acordo com registros do Tribunal Superior do Trabalho, apenas nos meses de janeiro e fevereiro deste ano, as Varas do Trabalho de todo o País receberam 763 novos casos de assédio sexual. Mas o que fazer quando se é vítima de assédio?
Segundo a advogada especialista em direito do trabalho, Maria Lúcia Benhame, a primeira atitude é procurar o setor de recursos humanos da empresa e fazer uma queixa formal. "Ter provas na denúncia é fundamental, pois o assediado corre o risco de ser acusado de que não aconteceu nada. Algumas provas que podem ser apresentadas são gravação, testemunha e e-mail", explica.
Já o profissional de RH Bruno Alves, da escola de educação corporativa Omeltech, diz que o primeiro passo é falar com o assediador: "Inicialmente, é importante deixar claro ao agressor que a atitude tomada não foi correta. Caso a atitude se repita é importante controlar os impulsos emocionais e começar a reunir provas do ocorrido, com isso, é possível falar com a empresa e quem sabe até mesmo com o sindicato. É necessário ter provas como testemunhas, documentos, cópias de memorandos, e-mails, etc".
A especialista em psicologia organizacional do trabalho e conselheira do Conselho Regional de Psicologia do Paraná Carolina Walger sugere que o caso seja encaminhado para diversos setores, respeitando uma hierarquia. "A orientação é que a vítima tente resolver a situação, inicialmente, com o próprio assediador. Se isso não for possível ou não tiver efeito, recorrer à sua chefia imediata para relatar o caso e pedir providências. Se essa alternativa não for possível ou não surtir efeito, deve procurar o departamento de recursos humanos da organização", opina.
Porém, há casos em que a empresa não toma atitudes, muitas vezes porque o assediador ocupa cargos de chefia e de direção. Caso isso aconteça, o indicado é procurar o sindicato da categoria e, se possível, o auxílio de um advogado. Em última instância, deve-se procurar uma delegacia para registrar um boletim de ocorrência.
Se comprovado o assédio, a vítima pode pedir para mudar de área e se afastar do assediador, mas a empresa tem de concordar. "A vítima pode pedir o afastamento, o deslocamento para outra área, a demissão e pode denunciá-lo para a polícia. Contudo, a decisão do que será feito com o assediador por parte da organização cabe à gestão da mesma, envolvendo a chefia, área de recursos humanos e etc", explica a psicóloga.
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