“A ideia de que o suicídio é um ato de liberdade e um exercício de livre arbítrio está errada”, afirma o psiquiatra José Alberto Del Porto, pós-doutor pela University of Illinois at Chicago (EUA) e professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
“A doença mental limita a liberdade da pessoa e a capacidade de escolha. É importante lembrar que o suicídio está na maior parte das vezes atrelado a uma doença passível de tratamento e prevenção”, continua o especialista.
A explicação de Del Porto é baseada em dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), que apontam que mais de 90% dos casos de suicídio estão associados a distúrbios mentais e, portanto, podem ser evitados se as causas forem tratadas corretamente.
Para dar visibilidade ao problema, o Brasil realiza desde 2014 atividades de conscientização com a campanha Setembro Amarelo. A iniciativa foi trazida ao País pelo Centro de Valorização da Vida (CVV) e pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP). Neste ano, uma das iniciativas do mês apoiadas pelo CVV é centrada na hashtag #NãoÉSóTristeza, criada pela Pfizer.
“O objetivo é falar abertamente sobre essa questão de saúde pública que é o suicídio. A principal barreira da prevenção é o tabu, o estigma contra o tema”, afirma Robert Paris, presidente do CVV. Os especialistas explicam que a conscientização da população é o primeiro passo para diminuir o número de casos de suicídio. “É muito importante levar a sério os sinais, estender a mão. Muitas vezes a gente fala: ‘ele está triste. é assim mesmo’, mas precisamos quebrar esse tipo de discurso”, insiste Paris.
Números divulgados durante o lançamento da campanha da Pfizer comprovam que ter uma forte rede de apoio é essencial. O estudo, realizado pela Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados, mostra que, embora a prevalência da depressão seja maior nas mulheres, o suicídio ainda é mais comum entre os homens. No Estado de São Paulo, 80% das vítimas de suicídio ao longo de 2013 e 2014 eram homens e 72,3% deles tinham entre 15 e 64 anos de idade.
“Percebemos que normalmente as mulheres contam com um apoio maior, e às vezes os homens são mais cobrados para manter um desempenho social”, pondera Paris. A conclusão é que, sem uma rede de apoio e somando-se as maiores taxas de dependência de drogas e álcool entre o sexo masculino, as consequências dos transtornos mentais são mais fatais para os homens.
Outros fatores de risco são histórico familiar para a doença, poucos vínculos sociais e solidão, desemprego, traumas e episódios de abuso ou maus-tratos na infância, além da presença de doenças, principalmente as mais graves como câncer e aids.
Quer ajudar, mas não sabe como? O presidente do CVV explica que os voluntários do centro recebem treinamento para saber como conversar com as pessoas nessa situação, porém, todos podem ajudar de alguma forma. “Esse tema é uma tarefa de muitas mãos. É preciso falar a respeito e ser aberto. As pessoas precisam saber que podem procurar ajuda”, explica Paris.
Os especialistas defendem que o principal é ouvir, acolher e nunca julgar os sentimentos do outro. A partir daí, vale incentivar a busca por ajuda profissional. “O suicídio é um ponto final de um processo que muitas vezes começa anos antes. Temos que aproveitar essa janela de oportunidade para acolher o paciente e fazer a prevenção”, ressalta o presidente do CVV.
Del Porto também deixa uma mensagem final: “Muitas vezes a depressão é desqualificada, como se fosse uma simples questão de falta de força, de caráter, uma fraqueza moral. Isso é um mito. Depressão é doença e a pessoa precisa ser incentivada a procurar ajuda adequada”.
Para quem está procurando ajuda, o Centro de Valorização da Vida (CVV) oferece apoio online no site http://www.cvv.org.br, pelo telefone 141 (ou 188 no Rio Grande do Sul), via Skype (acesso pelo site), ou e-mail (mensagem enviada também pelo site). Em todos os canais, o atendimento é feito por voluntários treinados e a conversa é anônima, com sigilo completo sobre tudo que for dito.
Para saber como ajudar alguém próximo, confira também nossa conversa com doutora pela Faculdade de Medicina da USP e coordenadora da Comissão de Estudos e Prevenção de Suicídio da Associação Brasileira de Psiquiatria:
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