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Self-service de humor

Opinião | Quem tem medo de vampiro?

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"Sou um cronista. Queria conhecê-lo, mestre."

(Pinterest)  

O casarão do Vampiro de Curitiba se erguia no Alto da Glória. As janelas fechadas e o portão aberto me atraíram. Era meu sonho conhecer o dono da casa. Passei pelo jardim e empurrei a porta destrancada.

O interior exalava um silêncio estridente. No centro da sala, uma cadeira de balanço. As cortinas filtravam a luz, projetando sombras nas paredes.

- Entre - veio a voz rouca.

O Vampiro de Curitiba, se encostava numa estante repleta de livros. Seus olhos penetrantes dominavam o ambiente. Ele me avaliava com a mesma intensidade que revisava suas palavras.

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- Não esperava visitas - disse ele.

Eu gaguejei, sem justificar minha intromissão. Ele ergueu a mão.

- Não importa. O tempo se esgota. Quem é você?

- Sou um cronista. Queria conhecê-lo, mestre.

Ele respondeu, irônico:

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- Cronistas escrevem para preencher o vazio das horas. Eu escrevo para esculpir o silêncio.

As palavras me atingiram como as presas de Drácula. Ele apontou para um sofá coberto de papéis.

- Sente-se.

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Falou-me de seus pesadelos: leitores invisíveis arrancavam pedaços de sua carne durante o sono. Descreveu uma Curitiba onde as ruas se reorganizavam à noite, onde pessoas sumiam nas esquinas, levadas por murmúrios que não se ouviam.

As sombras nas paredes se estenderam em formas humanas. A cadeira de balanço não parava de se mover.

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- Elas chegaram - sussurrou, a voz entrecortada.

- Quem?

- As palavras que não escrevi. Elas me perseguem.

O Vampiro pegou um caderno preto da pilha ao lado da estante e me entregou.

-- As palavras que não escrevi. Elas me perseguem.

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O Vampiro pegou um caderno preto de uma pilha ao lado da estante e estendeu para mim.

-- É o último. O mais importante. Não deixe que elas o encontrem.

O caderno, encardido e sem título, pesava em minhas mãos. Ao abri-lo, vi a mesma frase repetida em todas as páginas, em letras diminutas: "Não leia isso em voz alta."

Antes que pudesse perguntar o que significava, o Vampiro começou a se desvanecer, como uma sombra tragada pela luz.

-- Escreva! -- foi sua última palavra, ecoando pelas paredes do casarão.

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Fiquei imóvel por minutos, antes de sair. Mas algo do casarão veio comigo. As sombras. As palavras. O caderno.

Em casa, tentei usá-lo. Sempre que apagava ou reescrevia qualquer esboço, a frase "Não leia isso em voz alta" ressurgia. Nas madrugadas, o som de uma cadeira de balanço ainda ecoa pelo apartamento -- embora eu não tenha uma cadeira de balanço.

O caderno continua comigo. E sempre que o abro, as páginas estão em branco.

 

Opinião por Carlos Castelo

Carlos Castelo. Cronista, compositor e frasista. É ainda sócio fundador do grupo de humor Língua de Trapo.

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