“Eu não duvidaria que nem mesmo uma hora se passa na minha vida sem música”. Jack White é a expressão perfeita de alguém que não se cansa da música.
Conhecido por ter liderado a banda White Stripes nos anos 2000 e a ascensão da música independente ao lado do grupo The Strokes, Jack expandiu a sua presença na área – ou da área na sua vida – nos últimos anos.
Agora, o músico também lidera a banda The Raconteurs, é dono de uma loja de discos e fundador do estúdio e selo Third Man Records.
Neste ano, White ainda resolveu lançar dois discos, Fear of the Dawn e Entering Heaven Alive, e pretende trazer essa “explosão” musical ao Brasil.
No próximo dia 12 de outubro, o músico se apresenta mais uma vez no Popload Festival. Além dele, o evento trará outros nomes da música indie, como Pixies e Cat Power, no Centro Esportivo Tietê, em São Paulo.
Ao Estadão, Jack contou sobre o impacto da pandemia da covid-19 na arte, a inspiração que leva da música brasileira com a Tropicália e os Mutantes e prometeu que o rock sobreviverá à passagem do tempo.
Você escolheu lançar dois álbuns esse ano. Por que você escolheu isso e como foi fazer dois trabalhos quase ao mesmo tempo?
Isso meio que aconteceu por acidente. Eu estava escrevendo e gravando músicas e elas continuavam vindo. Algumas eram mais “intensas” e outras, mais “gentis”.
E isso geralmente acontece comigo, não é novo para mim. Esses tipos de músicas se encaixam bem em apenas um lançamento. Eu sempre fiz isso desde os primeiros lançamentos do White Stripes.
Mas, dessa vez, não estava funcionando. Elas eram muito diferentes. Então as mais felizes e as mais quietas começaram a se separar em dois discos.
E você acredita que a pandemia mudou a maneira como você pensa as suas músicas?
Eu acho que a pandemia afetou todas as pessoas, mas os artistas, mais especificamente, são vítimas dos seus ambientes. Eles sempre são mais suscetíveis às mínimas mudanças. Não é surpresa que você tenha visto tantas artes novas surgindo nos últimos anos.
Se você diz a um vendedor de seguros, por exemplo, que ele não pode sair de casa, talvez ele comece a ler livros ou assistir a muita Netflix. Mas, se você diz a um pintor que ele não pode sair, muito provavelmente ele vai começar a pintar um número enorme de quadros.”
Jack White
Você tem uma agenda bem cheia com o The Raconteurs, o seu estúdio, seu selo, etc. Como é essa presença da música no seu dia-a-dia?
Eu não duvidaria que nem mesmo uma hora se passa na minha vida sem música. Se não é algo tocando na cozinha, sou eu cantarolando na varanda da frente ou entrando no carro e colocando música.
Eu não poderia me imaginar sem que eu fosse dessa maneira. Seria muito estranho ser forçado a não ouvir ou tocar música.
Os seus últimos álbuns trouxeram bastante influência do blues. A Madman from Manhattan, mais especificamente, também me lembrou muito a bossa nova. Existem artistas brasileiros que te inspiram?
Sim. Essa canção, mais especificamente, conversa muito com algo tipo os Mutantes ou o estilo de música da Tropicália, misturado com jazz.
É engraçado se ver tocando coisas que você não sabe o motivo ao certo do porquê está tocando aquilo. Eu não penso: “Vou escrever uma música country” ou “vou compor um blues hoje”. Mas às vezes eu me pego tocando essas coisas.
Você tem uma relação especial com o Brasil, já que você fez um show histórico em Manaus em 2005. Quais são as suas expectativas para voltar para cá em um festival?
Os shows no Brasil são sempre incríveis. As plateias são sempre tão elétricas e cheias de energia. A América Latina no geral, mas mais especificamente o Brasil, não é igual a nenhum outro lugar no mundo.
Eu amo saber que não terá nenhum problema. Quando eu faço shows aí, o público nunca vai ser o problema. Pode haver problemas com o equipamento, o microfone ou alguém da banda doente, mas nunca haverá com a plateia.”
Jack White
E, há 20 anos, eu comecei a gostar da energia dos festivais. Antes, eu não gostava. Me parecia muito errado tocar música ao ar livre. Eu sempre achei que isso teria que ser feito em lugares fechados.
Agora, eu tenho entendido mais sobre como eu posso fazer isso.
E como você vê o aumento do uso de celulares durante os shows?
Eu gosto de experimentar a ideia das pessoas terem os celulares guardados em bolsas, como vários comediantes vêm fazendo em stand-ups. Eu acho que é um experimento interessante para o rock and roll.
Ao mesmo tempo, também é interessante que as pessoas tenham a própria liberdade. Se você tem 12 anos e está em um show do BTS, o celular é muito importante e é parte da experiência. Vai de cada artista esculpir seu próprio universo e sua própria experiência.
Eu realmente tenho me interessado pela ideia das pessoas eliminando essa “parte da mente” delas e passando essas horas como se elas estivessem assistindo a um filme. Os resultados têm sido impressionantes e as pessoas recebem isso de forma positiva.
Com o White Stripes, você teve uma influência importante no rock alternativo. Como você enxerga as novas bandas que vêm fazendo sucesso com o rock and roll hoje em dia, como Måneskin ou Greta Van Fleet?
É ótimo ver qualquer banda de rock se dando bem. Na verdade, ver qualquer músico se dando bem é impressionante para mim. É muito difícil ter a atenção das pessoas e se conectar com um público grande.
Também é muito difícil conseguir dar um “fôlego” novo ao jazz ou ao rock, que são formatos antigos. Eu tenho ouvido várias pessoas tocando música alternativa, rock ou qualquer coisa em que se use guitarras, baterias e sintetizadores. Há muita música interessante em 2022.
As pessoas costumam dizer que o rock está morto. Você acredita nisso?
Você pode voltar há uns anos e encontrar várias músicas que bandas escreveram nos anos 1970. Acho que um dos casos mais famosos é um álbum do The Who dizendo que o rock está morto [sobre Rock Is Dead—Long Live Rock!, lançado em 1972].
Quer dizer, eles estão dizendo que o rock and roll está morto desde 1972. E olhe todas as bandas que surgem a cada 10 ou 15 anos.”
Jack White
A última grande explosão [do gênero] foi com o rock de garagem no começo dos anos 2000 com os Strokes e o White Stripes. Eu acho que, com a internet, isso vai ser diferente e não vamos ver cenários assim acontecerem.
Serão mais artistas individuais em diferentes partes do mundo. E todos eles se reúnem na internet para formar uma comunidade global.
*Estagiária sob supervisão de Charlise de Morais
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