Nossos pensamentos e memórias são o que possuímos de mais privado. Em uma época em que é possível descobrir por onde caminhamos, o que conversamos ao telefone e como gastamos dinheiro, uma das poucas informações que não podem ser obtidas sem nosso consentimento é nosso pensamento. Comunicamos nossos pensamentos usando fala e escrita, mas essas formas de comunicação são controladas pelo detentor dos pensamentos e memórias. Agora, foi demonstrado que é possível descobrir o que guardamos na memória medindo a atividade cerebral. Esses resultados iniciais estão longe de permitir a "leitura da mente" como sonham os escritores de ficção científica, mas demonstram que é possível extrair memórias sem consentimento. O experimento foi feito com voluntários. Olhando uma tela de TV e com a cabeça em um equipamento de ressonância magnética, os voluntários foram submetidos a estímulos visuais. Surgia uma imagem com listas horizontais. Após meio segundo era mostrada uma imagem com listas verticais. Após um segundo, aparecia um número. Se ele fosse um, o voluntário deveria tentar memorizar a primeira imagem. Se fosse dois, deveria memorizar a segunda. Durante os 11 segundos seguintes, enquanto o voluntário memorizava a imagem, o aparelho de ressonância media a atividade cerebral. Ao final, o aparelho havia coletado os dados e o voluntário era apresentado a uma das duas imagens e devia dizer se era aquela que o computador havia pedido que ele memorizasse. Num experimento simples como esse, memorizamos a imagem correta em mais de 98% dos casos. Os pesquisadores descobriram que as imagens coletadas do cérebro pela máquina são diferentes e dependem da imagem que a pessoa se esforça para memorizar. Conhecido o padrão de atividade cerebral para cada uma das imagens memorizadas, o experimento pode ser repetido com uma pequena diferença: o computador não é informado de qual imagem o voluntário memoriza. O interessante é que mesmo sem esse conhecimento, e contando somente com as medidas diretas da atividade cerebral, é possível descobrir qual das duas imagens estava sendo memorizada pelo voluntário - em outras palavras, qual pensamento ele estava processando durante os 11 segundos em que tentava memorizar uma das imagens. Conclusão: é possível deduzir o que uma pessoa está pensando medindo somente a atividade de seu cérebro. Esse experimento é muito simples e está muito longe de permitir a "leitura" de pensamentos complexos, mas o importante é que, pela primeira vez, foi possível descobrir o que uma pessoa está pensando sem que ela nos revele esse pensamento. Experimentos como esse mostram que pensamentos e memórias são objetos materiais, passíveis de ser medidos e observados. Algo que os cientistas suspeitavam faz muito tempo mas que nunca havia sido demonstrado experimentalmente. *Biólogo - fernando@reinach.com Mais informações: Decoding reveals the contents of visual working memory in early visual areas. Nature, vol. 458
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