Fazia 16 graus numa noite recente em Nova York. Na área externa da loja Lord & Taylor, na 5ª Avenida, Papai Noel em pessoa dançava a música “Mmm Yeah”, do popstar teen Austin Mahone, que cantava ao vivo para centenas de adolescentes. Tratava-se da inauguração das vitrines de Natal da marca, um evento que tem se tornado cada vez mais comum nas lojas de Manhattan. Após o show, as cortinas que cobriam as vitrines foram abertas, revelando bolos cobertos com pasta americana , uma casa vitoriana feita de pão de mel e muitas outras delícias natalinas. “Essa época é como o Super Bowl para nós”, afirma Liz Rodbell, presidente da Lord & Taylor.
Nas duas semanas antes do Dia de Ação de Graças, todas as principais lojas de departamento de Nova York (Bloomingdale’s, Bergdorf Goodman, Saks e Barneys New York) seguem o exemplo e mostram suas vitrines de Natal que, em alguns casos, são planejadas por mais de um ano. Nada disso é novidade para os comerciantes que precisam garantir uma forma de se destacar em relação à concorrência. Em geral, as justificativas deles são festivas ("essas vitrines são um presente para Nova York", dizem), mas as motivações também estão bem ligadas aos números.
Segundo o Spending Pulse, serviço da MasterCard que acompanha todos os tipos de pagamentos no varejo, 24% das vendas anuais das lojas de departamento são feitas em novembro e dezembro. Em 2015, as festas chegam com uma onda de notícias ruins: muitas redes registraram quedas na vendas nos últimos meses, os estoques estão lotados e os gastos dos consumidores estão em queda (3,3% desde fevereiro nas lojas de departamento, segundo o Spending Pulse).
Neste contexto, o Natal surge como uma luz no fim do túnel. “É o maior investimento visual do ano”, afirma Joshua Schulman, presidente da Bergdorf Goodman, recusando-se a revelar os valores gastos. Para montar a vitrine deste Natal, a Bergdorf firmou parceria com os especialistas Linda Fargo e David Hoey, que instalaram mais de 7 milhões de cristais Swarowski nas vitrines (70 vezes mais do que foi usado na última cerimônia do Oscar). Elas mostram cenas fantásticas, a exemplo de um macaco adivinho olhando para uma bola de cristal. As roupas exibidas nos manequins também foram feitas com exclusividade por marcas como Naeem Khan e DC Greene e estão disponíveis para quem tiver dinheiro suficiente para adquiri-las. No ano passado, um cliente perguntou a respeito de um vestido Dolce & Gabbana confeccionado para esse fim (mas o valor de cinco dígitos era muito exorbitante e a peça acabou doada para o Fashion Institute of Technology).
A Saks também não mediu esforços para se certificar de que seu Natal seja deslumbrante. Suas vitrines centrais mostram seis maravilhas do mundo feitas de gelo (entre elas um Taj Mahal e um Coliseu). O tema glacial está presente em todas as lojas da rede (mesmo em locais quentes como Palm Beach, na Flórida), na correspondência enviada para clientes e nos novos produtos licenciados do período de festas - como o balm labial, os ursinhos natalinos e as joias (algumas de US$ 250 mil). “O que temos de fazer é transformar isso em vendas”, diz Mark Briggs, vice-presidente executivo da HBC Creative (a unidade promocional interna da Hudson’s Bay Company, proprietária da Saks), lembrando que, após o lançamento das vitrines no ano passado, o volume de clientes transitando na loja de Nova York aumentou. “O que não queremos é que as pessoas venham e digam ‘puxa, muito bom’, se dirijam até a vitrine, tirem fotos, as coloquem no Instagram e vão embora. O que queremos é convertê-las em clientes.”
Não que as vitrines sozinhas levem as lojas para o sucesso, mas analistas do setor acreditam que elas podem ajudar. “As empresas agora têm de se comunicar com a Geração Z e os que nasceram já no novo milênio”, afirma Oliver Chen, diretor-gerente da empresa de serviços financeiros Cowen and Company. “Eles pensam muito a respeito da integração dos negócios on e offline, a razão para ir a uma loja, quando a expectativa é mais alta. Realmente depende dos varejistas fazer o equilíbrio correto entre a encenação e a questão comercial.”
Na Barneys, outra gigante nova-iorquina, o tema do Natal é “Chillin’ Out” (gíria para relaxar, acalmar-se). As vitrines mostram uma escultura do artista especializado em vidro Dale Chihuly e uma pista de carrinho de corrida com minicarros Lexus em meio a árvores. “Nunca fizemos algo tão ambicioso”, afirma o diretor criativo Dennis Freedman. “Varamos várias noites para chegar a esse resultado.” Todas as unidades da Barneys nos Estados Unidos apresentam a etiqueta “Chill Out”, além de embrulhos e cartões de presente temáticos. Há também menus especiais nos restaurantes das lojas e marshmallows em palitos, cobertos com chocolate branco e coco, também com o selo “Chill Out”, serão distribuídos aos compradores nos finais de semana.
Para muitos executivos, a arte das vitrines e a ciência do comércio estão intimamente ligadas. “Eu acredito 100% que a decoração leva às vendas”, afirma Freedman. “A razão para entrar - aqui ou no concorrente - é que as pessoas sentem-se bem. Você se relaciona com o ambiente." Nenhuma das varejistas entrevistadas informou os ganhos médios no período, mas os fins, deram a entender, justificam os meios. Para Marc Metrick, presidente da Saks, trata-se "da maior oportunidade do ano”. No fim de novembro, a empresa fechou um trecho da 5ª Avenida para inaugurar o primeiro show de luzes de seu Palácio de Inverno, com fogos de artifício e um coral de 200 vozes. Naquela noite, as temperaturas estavam 1 ºC abaixo de zero e Metrick fez um pequeno discurso agradecendo sua equipe e seus parceiros. “Eu não seria um varejista se não lembrasse a todos que, depois do show, a loja está aberta”, disse, reiterando o real motivo da festa.
Tradução de Priscila Arone
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