A série Conquest, que trouxe Keanu Reeves para gravações em São Paulo, e também tinha Bruna Marquezine no elenco, nunca irá ao ar. A produção foi cancelada após polêmicas nos bastidores e um suposto “comportamento errático” do diretor responsável, Carl Erik Rinsch. O cineasta teria gastado uma parte da verba do programa em artigos de luxo. O caso foi revelado em uma matéria extensa publicada pelo The New York Times.
Segundo o jornal norte-americano, a Netflix, que comprou a produção, enfrentou grandes outros nomes do streaming para arrebatar a série, ofertando US$ 55 milhões, ou R$ 269 milhões. A empresa ainda ofereceu liberdade criativa e orçamentária ao cineasta responsável, mas, como retorno, nunca recebeu um único episódio.
Rinsch é acusado de gastar parte da verba de Conquest para investir em criptomoedas e no mercado de ações, além de comprar uma frota de Rolls-Royces e roupas de grife, conforme o jornal. O cineasta se recusou ao pedido de um pronunciamento do jornal, mas, em uma postagem já apagada do Instagram, criticou a matéria por questionar sua sanidade mental. Leia mais abaixo.
O NYT analisou mensagens de texto, e-mails e um processo judicial movido pela esposa em um caso de divórcio e apontou que, logo após assinar o contrato para a produção de Conquest, o comportamento de Rinsch se tornou “errático”. Depois de a Netflix cancelar a série, o diretor começou a mover uma ação com um pedido de indenização de US$ 14 milhões, ou R$ 68 milhões, por quebra contratual.
À época em que adquiriu os direitos, a Netflix viu na produção a possibilidade de criar “uma franquia de ficção-científica tão bem-sucedida quanto Stranger Things”, conforme o jornal. Inúmeros problemas, porém, foram ignorados pelo serviço de streaming, como o fato de Conquest não possuir um roteiro completo, além do passado “nebuloso” de Rinsch em Hollywood, que havia realizado apenas um filme, 47 Ronin, também com Keanu, anteriormente.
As filmagens da série se iniciaram em São Paulo em 2019. À época, a prefeitura da capital paulista moveu uma série de órgãos para as gravações e interditou quatro quarteirões da Avenida Paulista. Keanu Reeves apareceu em uma foto com o então governador João Doria, que havia se reunido com o ator, o diretor e a produtora da série, Gabriela Rosés Betancor, para organizar os trâmites da realização.
Ao todo, nove secretarias municipais foram envolvidas, além da Companhia de Engenharia e Tráfego (CET), da Guarda Civil Metropolitana (GCM), de subprefeituras e de setores de iluminação e limpeza urbana. Segundo o comunicado publicado no site da prefeitura à época, a capital paulista retrataria um local de “acolhimento humanitário de refugiados” em um futuro distópico.
Segundo o NYT, porém, as filmagens na maior metrópole do País enfrentaram problemas. Um representante do sindicato dos atores precisou visitar o local das gravações após uma denúncia de assédio moral por parte do diretor. O Estadão entrou em contato com o Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões no Estado de São Paulo (Sated-SP) para confirmar a informação, mas ainda não obteve retorno.
Rinsch teria sido diagnosticado com autismo e transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), segundo informações do jornal. À época, a esposa do cineasta e pessoas próximas se preocupavam com um excesso de consumo de Vyvanse, remédio usado para tratar o TDAH, que pode gerar efeitos colaterais como mania, delírio e psicose.
Após uma nova leva de US$ 11 milhões, ou R$ 53 milhões, enviados a Rinsch após um pedido feito pelo diretor durante a pandemia da covid-19, o comportamento do cineasta se tornou ainda mais “errático”, com “teorias estranhas” sobre o coronavírus.
Executivos da Netflix começaram a receber e-mails do diretor, que dizia ser capaz de mapear “o sinal do coronavírus que emana de dentro da Terra”. À esposa, Rinsch também alegava poder prever a queda de raios e o início de erupções vulcânicas.
Em 2021, a empresa decidiu, por fim, parar de financiar Conquest. O diretor, então, teria começado a usar a verba que ainda lhe restava para investir em criptomoedas e comprar carros de luxo.
Rinsch se recusou a falar com o jornal norte-americano. Em uma postagem já deletada do Instagram, porém, feita após a publicação da matéria, ele chamou o texto de “impreciso”. Segundo o diretor, ele havia previsto que a publicação iria “discutir o fato de que de alguma forma perdi a cabeça… (Alerta de spoiler)… Não perdi”.
Ao NYT, a Netflix alegou que a empresa forneceu todo o apoio à série, mas optou pelo cancelamento após perceber que ela nunca seria finalizada. “Depois de muito tempo e esforço, ficou claro que Rinsch nunca iria concluir o projeto que concordou em fazer”, disse um porta-voz do serviço de streaming, Thomas Cherian.
*Estagiária sob supervisão de Charlise de Morais
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