“O sentimento é que eu sou uma sobrevivente de 2022″. A frase é a definição dada por Bárbara Timo, judoca nascida no Brasil e que luta por Portugal desde 2019. A atleta superou um acidente de carro que quase tirou sua vida, uma anemia profunda, um período de depressão e foi uma das responsáveis por um movimento dos lutadores para melhorias na Federação Portuguesa de Judô. E ainda fechou o ano com o pódio no Mundial.
Bárbara Timo teve uma lesão em um dedo da mão e precisou passar por uma cirurgia para correção do problema logo no começo do ano. Três meses depois, a judoca voltou a competir, foi ao pódio por Portugal em uma competição na Europa e teve o maior susto da vida.
“Em abril eu tive um acidente de carro. Segundo os médicos que nos atenderam, o estranho de tudo foi que todos os cinco que estavam no veículo (quatro atletas e o motorista) conseguiram sair com vida. O esperado, pela gravidade de tudo, era ter acontecido alguma fatalidade. O nosso carro bateu em um caminhão, rodou e bateu em um muro. Todos tivemos algumas lesões, eu tive um problema no ombro que me acompanhou por meses, mas nada além disso”, afirmou a judoca.
Cerca de dois meses depois do acidente, Bárbara Timo passou a se sentir estranha nos treinos. Sem entender muito bem a razão, a judoca se achava cada vez mais fraca, sem intensidade e com dificuldade para algumas coisas que eram necessárias na rotina de esportista. Por causa disso, após algum tempo, ela optou por pedir um tempo longe das competições para o seu clube, o Benfica.
No período longe dos torneios, a judoca seguiu com todo o suporte e acompanhamento do clube. Em uma das séries de exames que fez descobriu o que era a causa de todos os sintomas que vinha sentindo nas semanas anteriores: uma anemia profunda.
“Nunca descuidei da minha alimentação em Portugal, mas já tive episódios de anemia na minha infância e pode ter alguma relação. O lado bom é que tudo que eu estava passando, da fraqueza, falta de intensidade e resistência, estavam me deixando em dúvida sobre o meu rendimento, a minha capacidade e me fizeram ter um momento de depressão. Descobrir que era por conta da anemia me fez achar o motivo e focar para recuperar”, afirmou.
LUTA FORA DOS TATAMES
Não bastasse o acidente no primeiro semestre e a questão médica que a deixou fora das competições por alguns meses, Bárbara Timo ainda tinha um adversário maior para enfrentar em 2022.
No começo de outubro, ela foi um dos seis atletas da seleção portuguesa de judô que escreveram uma carta pedindo a saída do presidente da Federação Portuguesa da modalidade. A razão do pedido foi, entre outros motivos, a falta de compreensão, flexibilidade e sensibilidade por parte do presidente, que resultou em um “clima insustentável e tóxico”.
Por causa disso, Bárbara Timo se tornou o rosto do movimento dos atletas e passou a falar abertamente sobre o movimento. “A gente apenas tentou mostrar o que estava acontecendo e o que a gente não concordava. Apenas isso. Buscamos dialogar e não foi possível, em um primeiro momento. Por conta disso, optamos pela carta e ela ganhou a proporção que teve. A maior parte das pessoas nos apoiou, mas teve uma pequena parcela de pessoas que criticou duramente, principalmente pelo fato de eu ser naturalizada. Acho que o momento que eu passei e a minha preocupação com a saúde mental me fez abrir mais os olhos e buscar uma solução”, afirmou.
Recentemente, Jorge Fernandes, então presidente da Federação Portuguesa de Judô, foi julgado pelos delegados da entidade em assembleia geral e acabou destituído do cargo por 45 votos a 0.
CHAVE DE BRONZE
Mesmo com os altos e baixos do ano, Bárbara Timo chegou para mais um Mundial de Judô como uma das candidatas ao pódio na categoria até 63kg. Sabendo que, nesta edição, a dedicação, concentração e raça em cada uma das lutas seria ainda mais necessária, a atleta não fez feio. Com cinco vitórias em seis lutas, perdendo apenas a semifinal para a japonesa Horikawa Megumi, Timo ficou com a medalha de bronze.
A conquista foi a segunda em um Mundial na carreira de Bárbara como judoca de Portugal. Com o bronze, Timo entrou para um seleto grupo do judô português com mais de uma medalha em competições deste tipo. Além dela, Telma Monteiro conquistou o pódio em cinco oportunidades, com quatro ouros e duas pratas, e Jorge Fonseca foi medalhista em duas vezes, com dois ouros.
“Eu não consigo colocar em palavras o que aconteceu nesse mundial. O pessoal brinca que quando eu tenho um problema médico que me afasta dos tatames eu volto já com pódio garantido e isso aconteceu no Mundial. Acho que foi mais uma vez a prova de que eu posso, que eu consigo. É a minha segunda na carreira, meus melhores resultados são aqui por Portugal e sou grata por isso. Agora é hora de me preparar para 2023 e seguir o planejamento para 2024. Temos 1 ano e meio para os Jogos Olímpicos e a preparação segue”, afirmou.
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