SÃO PAULO - Orgulhosos das raízes italianas do clube, os torcedores do Palmeiras ficaram felizes ao saber que o argentino Maxi Stanic, o armador do time, é um oriundo, ou seja, um cidadão com ascendência italiana nascido fora da Bota que volta para a terra dos antepassados. Mas Stanic, que jogou por cinco anos na segundona italiana antes de ir para o poderoso Scavolini Pesaro, mostrou na quadra suas características de argentino legítimo, que vão além de mullets. Ele demonstrou toda a garra portenha num embate que já tem um histórico de acirrada rivalidade, contra a Liga Sorocabana, em Sorocaba. O armador foi vítima de um verdadeiro atentado a um de seus melhores atributos, a excelente visão de jogo: um soco no olho que o obrigou a baixar no hospital.
Stanic ignorou recomendações médicas para parar de jogar por dois meses, tirou o tampão do olho, colocou uns óculos de Kareem Abdul Jabbar e foi à luta. A consagração veio na partida contra o forte Pinheiros, vencida pelo Palmeiras por 90 a 73. O resultado encaminhou sua classificação para os play-offs, confirmada na rodada seguinte. Naquele jogo, o tampinha de 1,78m anotou 16 pontos e distribuiu 15 assistências, e isso segundo as estatísticas nada confiáveis do NBB. A assessoria de imprensa do Palmeiras jura que viu 23 assistências dele.
A baixa estatura achatou as proporções da carreira de Stanic, que acha que poderia ter cumprido uma bela trajetória na seleção argentina e em times de primeira divisão da Europa se tivesse uns dez centímetros a mais. Mas isso nunca o desencorajou na perseguição de seu destino de jogador. "Se você tiver medo, a altura será um problema. Mas eu nunca tive medo. Sempre sonhei ser jogador profissional, e tento fazer as coisas",
O basquete está praticamente no sangue de sua família, que tem origem na Eslovênia, um dos polos da consagrada escola iugoslava. No Europeu de 2009, o país alcançou a semifinal. Durante a Segunda Guerra Mundial, os Stanic cruzaram a fronteira com a Itália. Anos depois, parte deles rumou para a Argentina.
Cheio de energia quando criança, Maxi era obrigado a arremessar quando ia visitar os primos na cidade de Castelar pelo tio-avô materno, Oscar Serio, vulgo Carucha, que militou por muitos anos no basquete da região oeste da Grande Buenos Aires. Como a mãe, até hoje mesária nos jogos do Obras Sanitárias, não aguentava as estripulias do garoto, sempre o despachava para o clube Defensores de Hurlingham, que ficava ao lado de dua casa.
No pequeno clube, Stanic começou a jogar e se federou com apenas sete anos. Aos 14, já era armador reserva no Morón, um clube da primeira divisão argentina (na verdade a segunda, atrás da Liga Nacional).
Aos 15 anos, Stanic integrou o grupo que a imprensa argentina reputa como o embrião da Geração Dourada, aquela que se consagrou com o ouro olímpico de 2004. Ele foi convocado pelo técnico Guillermo Vecchio para participar do Sul-Americano cadete (até 16 anos) de Itanhaém, ao lado de nomes como Victoriano e Leo Gutiérrez. "A nossa geração se beneficiou por uma mudança de mentalidade. Jogadores como Sconocchini, Racca e Sucatzky começaram a ir bem novos para a Europa, onde se tornaram profissionais, e nos mostraram o caminho. A ida da nossa geração para a Europa nos transformou. Ao mesmo tempo, a Liga Nacional (criada em 85) padronizou os times. Todos começaram a jogar como a nossa seleção nacional".
Em 98/99, Stanic ajudou a levar o modesto Pico à terceira colocação da Liga Nacional - na semifinal, foi barrado pelo Atenas de Córdoba de um certo Rubén Magnano, que na final iria se consagrar campeão.
EXPERIÊNCIADepois de passar pelo Boca Juniors, Stanic rumou para a Europa, onde permaneceu por nove anos, entre Itália, França e Espanha. Após o regresso à Argentina, defendeu novamente o Boca e o Obras Sanitarias, que não renovou com ele. Em janeiro, estava sem contrato, quando surgiu a proposta de jogar no Palmeiras.
"Resolvi fazer uma experiência, um contrato de apenas quatro meses. Não vim pelo dinheiro, sobre dinheiro falamos rapidamente. Estou muito contente no Palmeiras, um time que pode enfrentar e derrotar vários adversários. Gostei também do NBB, uma liga que tem muito talento e muito dinheiro", afirma o jogador, talvez exagerando na diplomacia. "Mas o meu futuro vai depender de vários fatores. Posso continuar no Palmeiras, ir para outro clube brasileiro ou até encerrar a carreira", diz, em seu portunhol italianado, o jogador de 35 anos, que terá uma conversa com a família antes de tomar uma decisão. Comenta-se que quatro equipes do NBB estão interessadas no armador, incluindo o forte Brasília. De qualquer forma, a adaptação de Stanic, após apenas 15 jogos no Palmeiras, é praticamente total. "A maneira de jogar no Brasil é totalmente distinta da argentina. Joga-se com menos choque e mais correria, de uma forma menos pensada. Mas o grupo aqui do Palmeiras é muito bom, com boas pessoas. O treinador Betão me dá muita liberdade. Precisamos de um pouco de tempo para adaptar o time, não é fácil trocar o armador no meio do campeonato. Assim que nos entrosamos, melhoramos bastante".
Admirado pelos torcedores, Stanic gosta de jogar no Palmeiras, cuja torcida, no basquete, não deixa nada a dever àquela que comparece à Bombonerita, o ginásio do Boca, segundo ele. "Aqui há muita paixão. A torcida do Palmeira vive mais o clube. O torcedor do Boca é só do futebol. Os palmeirenses ficam perto de sua camisa. Eles a acompanham, seja qual for o esporte".
O Palmeiras inicia a disputa do primeiro play-off de NBB em sua história nesta segunda-feira, em São José, no Vale do Paraíba. Os vice-campeões do NBB na temporada 2011/12 terminaram a fase classificatória na sexta colocação.
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