Cérebro de Maguila será doado para estudos na USP; entenda

Pugilista, morto nesta quinta-feira, sofria de ETC e concordou em doar órgão há seis anos para aprofundar pesquisa acerca da doença

PUBLICIDADE

Foto do author Murillo César Alves
Foto do author Ingrid Gonzaga
Foto do author Felipe Rosa Mendes
Atualização:

Morto nesta quinta-feira, 24, aos 66 anos, José Adilson Rodrigues dos Santos, o Maguila, terá seu cérebro doado à Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) para aprofundar os estudos acerca da encefalopatia traumática crônica (ETC), da qual sofria o lutador. Em 2018, ele concordou em doar o órgão, com o consentimento da família, para a universidade.

Maguila foi diagnosticado com a doença em 2013, que não tem cura. Informalmente, ela é chamada de “demência do pugilista”, resultado dos constantes golpes na cabeça que os lutadores sofrem ao longo da carreira. A FMUSP conta com grupo de pesquisa que estuda justamente o impacto dessas pancadas e concussões em atletas, dos mais diferentes esportes – boxe, rúgbi, futebol, entre outros.

Para realizar a doação do órgão, além de Maguila ter preenchido o termo, em 2018, declarando seu desejo em doar seu cérebro para a FMUSP, é preciso que a família autorize o processo. Além de Maguila, Éder Jofre, ex-pugilista morto em 2022, e Bellini, capitão do Brasil na conquista da Copa do Mundo de 1958 e morto em 2014, também doaram seus cérebros para a FMUSP.

Cérebro de Maguila será doado à FMUSP. Foto: Sérgio Berezovsky/ Estadão

PUBLICIDADE

Eles ficam armazenados no instituto, que conta com o único banco de cérebros do Brasil e da América Latina.“É importante para o País e para USP ter esses experimentos realizados em nosso território”, contou Renato Anghinah, neurologista e professor livre docente na Universidade de São Paulo (USP), ao Estadão em 2022. O médico foi responsável por acompanhar tanto Éder Jofre quanto Maguila nos últimos anos.

“Esse banco é importante pois permite que o Brasil participe de discussões na área científica e esteja em contato com a maioria dos países do mundo.” O estudo visa criar medidas de prevenção para a doença. No caso de Bellini, inicialmente acreditava-se que o zagueiro sofria do mal de Alzheimer, que destrói a memória e outras funções do cérebro. Os resultados da pesquisa, divulgados em congresso, revelaram o quadro de ETC.

Publicidade

O que é a encefalopatia traumática crônica?

A encefalopatia traumática crônica é uma doença no encéfalo – uma das regiões do cérebro – causada por traumas e choques mecânicos constantes (“crônicos”). Ela é comum em atletas, mas também é observada em soldados e ex-combatentes de guerras.

É causada por uma degeneração progressiva de células cerebrais, causada por diversas lesões na cabeça. Para o diagnóstico clínico é preciso que o paciente realize exames de imagem e ultrassom. O histórico de lesões e sintomas presentes na encefalopatia - como depressão, raiva, perda de memória etc - ajudam no diagnóstico.

“Mais ou menos 50% das lesões cerebrais em jogos de contato são causadas pela desaceleração e aceleração do cérebro. Não precisa encostar na cabeça do indivíduo para ter lesão no cérebro”, explicou Anghinah. “Num momento, um jogador e seu cérebro estão a 30 km/h. Aí ele sofre o tackle. E, milissegundos, a velocidade vai a zero. O cérebro está solto e chacoalha dentro da caixa craniana. Um atleta pode sofrer um tackle, sem choque de cabeça, e cair desacordado no gramado. E nem bateu a cabeça. Por quê? Porque a desaceleração brusca pode lesar o cérebro.”

Não há um tratamento específico ou cura para a encefalopatia, mas medidas de suporte para os pacientes podem ser tomadas. Dentre estas, destaca-se a construção de um ambiente seguro, iluminado e confortável. Em casos avançados da demência, medidas paliativas podem ser adotadas ao invés de internações hospitalares.

Quem foi Maguila

Publicidade

Nascido em Aracaju, Sergipe, Maguila teve 77 vitórias (61 nocautes), 7 derrotas e um empate em seu cartel como profissional, tendo sido campeão brasileiro, das Américas e mundial de boxe na categoria peso-pesado.

Dentre suas derrotas no ringue, Maguila teve duas emblemáticas contra dois dois maiores de todos os tempos da modalidade: George Foreman, em 1990, e Evander Holyfield, em 1989. Contra Holyfield, o combate valia o cinturão do WBC.

Ele se aposentou dos ringues no ano 2000. Ao longo de sua carreira, Maguila se notabilizou pelo carisma das entrevistas pós-luta, onde citava uma imensa lista de agradecimentos. Depois, chegou a trabalhar na TV Record ao lado de Tom Cavalcante no programa “Show do Tom”.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.