Ele foi de astro mirim do skate ao alcoolismo e se reconstruiu com apoio de Michael Phelps

Ryan Sheckler conquistou ouro no X Games aos 13, teve reality show na MTV e atuou com The Rock; em entrevista ao ‘Estadão’, fala sobre os impactos da exposição e a precocidade dos skatistas atuais

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Foto do author Bruno Accorsi
Atualização:

Ryan Sheckler furou a bolha do skate nos anos 2000 rumo ao mundo das celebridades. De talento precoce, já fazia manobras complexas aos seis anos e não demorou para ganhar notoriedade. Com apenas 13, tornou-se, em 2003, o mais jovem medalhista de ouro do X Games. A partir dali, colecionou mais conquistas, acumulou patrocínios e ganhou oportunidades que transcendiam o esporte, caso do reality show Life of Ryan, transmitido na MTV entre 2007 e 2009, quando já era um adolescente.

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Hoje com 34 anos, o americano teve de lidar com muita exposição desde cedo. Foi durante as gravações do programa que descobriu que os pais iriam se divorciar. Chorou e foi apelidado de Crying Ryan (Ryan Chorão, em tradução livre), zombaria adotada por muitos do próprio universo do skate que o consideravam um vendido. Mesmo afetado, continuou brilhando como atleta.

Na vida adulta, esbarrou com um problema no consumo exagerado de álcool e teve de lutar contra o vício. Encontrou apoio na família, nos amigos e até no multimedalhista olímpico Michael Phelps para se reabilitar.

Ryan Sheckler é um dos grandes nomes do skate mundial. Foto: Zorah Olivia / Red Bull Content Pool

Sheckler assume a responsabilidade pelo próprio alcoolismo e evitar apontar o reality ou qualquer outro fator externo como culpados por sua derrocada. Entende, contudo, o quanto ter sido exposto tão jovem impactou sua saúde mental. Por isso, se preocupa com a atual geração de skatistas, que se destacam cada vez mais jovens.

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“Acho que você tem de deixar as crianças serem crianças”, disse Ryan Sheckler, ao Estadão, durante passagem por São Paulo para participar de uma exibição da Red Bull Drop In América do Sul, na pista do Bom Retiro. “Eu tento ajudar os mais jovens e deixar que ele saibam os erros que eu cometi, e é tudo que eu posso fazer. Eu não posso dizer para ninguém o que fazer, mas vou mostrar que eu cometi erros que gostaria de não ter cometido.”

Hoje, o posto de medalhista de ouro mais jovem do X Games é de Mia Kretzer, de 9 anos. Rayssa Leal conquistou a prata olímpica com 13. É comum ver crianças e pré-adolescente competindo, e este cenário tem levado o esporte a ser tratado de forma diferente nas famílias, como forma de ascender na vida.

“Se você forçar uma criança a andar de skate, se você forçar uma criança a qualquer esporte e ela ficar esgotada, ela não vai querer fazer isso de novo. Mas se você deixar uma criança entrar em qualquer esporte, pode ser o skate, e deixá-la naturalmente descobrir qual é o amor por aquilo, então ela vai prosperar”, diz. “Comecei a andar de skate porque era uma forma de brincar com meus amigos. É por isso que eu amava. Era como se essa fosse minha fuga.”.

O que começou como uma fuga levou o californiano a uma vida de popstar, cercado de celebridades. Chegou até a fazer participações menores em filmes e atuou ao lado de Dwayne Johnson, o The Rock, na comédia “O Fada do Dente”, lançado em 2010, ano seguinte ao fim do programa da MTV, que só teve a última temporada por obrigação de contrato. Ryan, então com 19 anos, não queria mais fazer parte do reality show. Naquela época, já era adepto da vida noturna frenética e do consumo de álcool.

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“Tive o programa da MTV quando tinha 17 anos, viajava pelo mundo desde os 10. É um estilo de vida muito intenso, e eu vi o que muitos skatistas mais velhos estavam fazendo. Eu não tinha ninguém me dizendo que parte desse comportamento não era sustentável, não iria fazer minha carreira ir mais longe. Realmente sou grato por ter sido tão focado desde dos oito anos até os 17, quando não me importava com bebida, não me importava em sair. Eu não queria fazer nada disso. Foi ali que o verdadeiro fogo e o verdadeiro amor pelo skate realmente se mostraram na minha carreira”, relembra.

Ryan Sheckler é um dos grandes nomes do skate mundial. Foto: Tim Aguilar / Red Bull Content Pool

O estilo de vida desregrado se estendeu por muitos anos, como uma válvula de escape. “Algumas coisas aconteceram na minha vida, e coisas que estavam muito fora do skate, que eu realmente não sabia como lidar. Eu definitivamente me voltei para o álcool, era divertido. Festas eram divertidas para mim, e eu ainda podia andar de skate e fazer uma manobra. Então, eu ia para a festa e no dia seguinte nós íamos fazer mais manobras. Isso se transformou nesse tipo de ciclo”.

Sheckler entendeu que precisava se tratar em 2016 e pediu à mãe que o levasse para uma clínica de reabilitação. Saiu de lá para tentar nova vida, mas teve uma recaída em 2020, depois de decidir que voltaria a beber com moderação e acreditar que não reacenderia o vício. Tal decisão, contudo, o levou a uma segunda internação.

No meio processo de recuperação, recebeu uma ligação do nadador Michael Phelps, maior vencedor das Olimpíadas com 28 medalhas, que também teve problemas com o álcool. As palavras do multicampeão, junto ao apoio que já recebia da família e amigos, o motivaram a seguir em frente.

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Sóbrio desde a segunda reabilitação, Sheckler casou-se com a noiva Abigail em 2022, com que tem teve a filha Olivia, um ano depois, e passou a seguir a fé cristã. O skatista respeita as escolhas individuais, mas não quer que outros jovens repitam sua história.

“Se vocês querem festa, festejem, mas se vocês também querem andar de skate quando tiverem 35 anos, vocês têm de fazer mudanças. Qual seria meu conselho para as crianças, os adolescentes e até os jovens adultos? Não vou dizer para você parar de festejar, mas vou dizer para você dar uma olhada profunda dentro de si e dizer: ‘estou feliz, mostrando meu potencial máximo e ajudando alguém?’ Como realmente você se sente? Se todas essas perguntas que você se faz não têm respostas realmente boas, então talvez você comece a mudar alguns dos seus comportamentos”, diz.

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