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Por que alguns clubes estão mandando seus garotos da base para completar a formação na Europa?

Pensando em venda futura e em aprimorar a formação, equipes do País negociam atletas para o Velho Continente com opção de compra e abrem nova janela de oportunidades

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Por João Coelho
Atualização:

As categorias de base de alguns dos principais clubes do Brasil, como Palmeiras e Corinthians, estão abrindo um novo caminho na Europa. Não é o da venda imediata do atleta, mas de uma etapa anterior a ela. Trata-se de um período de empréstimo, que tanto pode servir como vitrine para clubes mais ricos quanto de aprimoramento na formação desses garotos. A Europa se tornou um mercado atraente para esse modelo de negociação.

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Enquanto, no passado, os clubes brasileiros apenas vendiam suas joias já lapidadas para o Velho Continente, hoje as equipes conseguem emprestar jogadores mais jovens ao futebol do outro lado do Atlântico com valores pré-estipulados. Isso antecipa uma janela de compra e venda e também encurta o tempo de adaptação de brasileiros que possam atuar na Europa um dia. O clube europeu passa a comprar também um garoto que ele já conhece e com quem já trabalhou. Nesta semana, o Corinthians anunciou o empréstimo do garoto João Gabriel, de 17 anos, para a Roma, da Itália. Ele está no clube desde os 12 anos.

“Cada jogador é um projeto individual. Mas, a partir do momento que enxergamos um projeto de um parceiro que tenha capacidade de desenvolver esse jogador que está no processo de transição da base para o profissional, isso se torna algo muito positivo”, afirma Luiz Carlos Azevedo, gerente geral das categorias de base do Flamengo.

Pedro Lima é anunciado pelo Norwich City, da Inglaterra. Foto: Norwich City/Divulgação

João Marcelo Barros, coordenador geral da base do Sport, também enxerga com bons olhos o empréstimo de jovens para o futebol europeu. “Quando se trata do mercado internacional, entendo que os movimentos que são feitos nesse sentido, são feitos para preparar um atleta para um nível de futebol mais competitivo. Essa inserção do jogador num nível de competitividade mais alta é fundamental, principalmente, no período de desenvolvimento.”

Palmeiras tem quatro garotos emprestados

Entre os clubes da Série A do Campeonato Brasileiro, o Palmeiras é o que tem mais atletas nessa condição. São quatro crias da base emprestadas ao futebol europeu no momento. A principal delas é Pedro Lima, meio-campista do time sub-20 do Alviverde e bicampeão da Copa São Paulo de Futebol Júnior pela equipe.

O atleta, de 20 anos, foi emprestado ao Norwich City, da Inglaterra, em agosto deste ano. Antes da transferência ser concretizada, ele havia disputado uma partida pelo profissional do Palmeiras, contra o Bolívar, pela primeira rodada da fase de grupos da Libertadores. Inicialmente, Pedro Lima iria integrar o time sub-21 da equipe inglesa, mas ele foi inscrito pelo Norwich para a disputa da Championship, a segunda divisão do Campeonato Inglês, com o time principal. Além dele, o Palmeiras emprestou outros três jovens da base para times europeus: Vitinho, ao Valerenga, da Noruega; Pedro Bicalho, para o Alverca, de Portugal, e Ruan Ribeiro, ao Valmiera, da Letônia. O goleiro Zé Henrique foi cedido por empréstimo ao Famalicão, de Portugal, no início do ano e retornou ao Brasil em julho.

O Atlético Mineiro também trabalha esse ‘novo mercado’ para as bases. O time tem três jovens atletas emprestados ao futebol do outro lado do Atlântico, todos para clubes do Leste Europeu: Matheus Araújo e Emanuel, cedidos ao DFK Dainava, da Lituânia, e Felipe Felício, emprestado no fim do ano passado ao Levadia, da Estônia.

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Para Thiago Freitas — COO da Roc Nation Sports no Brasil, empresa que gerencia as carreiras de Vinícius Júnior, Lucas Paquetá, Endrick e Gabriel Martinelli —, os clubes que negociam esses atletas têm como objetivo vendê-los e não os aproveitar após o fim do empréstimo. “Esse modelo de negócio tem como objetivo avaliar a capacidade de o atleta se adaptar o quanto antes ao ambiente de treino e convivência na Europa com atletas de várias nacionalidades. Quando um atleta brasileiro segue para a Europa, não é pauta nas negociações seu retorno ao Brasil. Esse retorno é um fracasso da operação.”

Dentro dos clubes, essa visão também encontra respaldo. “Comercialmente, é importante. Indo para a Europa e atuando bem, o atleta abre outros mercados. Geralmente, contratos assim já são feitos com a opção de compra”, disse ao Estadão Deive Bandeira, gerente de mercado e coordenador de scouts do Internacional.

Esse retorno financeiro pôde ser observado, por exemplo, na negociação do zagueiro Otávio, entre Flamengo e Famalicão, de Portugal. O Rubro-Negro emprestou o atleta — cria de suas categorias de base — ao clube português em janeiro deste ano. Em junho, ao término da temporada europeia, o Famalicão exerceu a opção de compra do jogador, em negócio que rendeu 500 mil euros ao Fla, cerca de R$ 2,7 milhões.

“O Otávio cumpriu o ciclo dele de base no Flamengo, teve uma oportunidade de ir para um time de primeira divisão em Portugal, foi bem e viu o clube em questão exercer a opção de compra. Sem dúvida nenhuma, no nosso entendimento, foi muito benéfico para o atleta também”, afirma Luiz Carlos Azevedo.

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Há outros atletas emprestados por outras equipes da Série A do Campeonato Brasileiro ao futebol português. Luan Campos, destaque do América Mineiro na campanha do vice-campeonato da Copinha de 2023, foi emprestado para o Portimonense, clube que disputa a primeira divisão de Portugal. O mesmo aconteceu com Zinho, atacante de 20 anos do Grêmio, que também foi para o time de Portimão. Ambos os contratos têm duração de um ano e contam com opção de compra. Mesmo não dando certo, esses garotos ganham experiência na Europa e complementam suas formações, principalmente no quesito tática.

Experiência no exterior

Sandro Orlandelli, membro da Uefa Academy e especialista na identificação de talentos da Federação Inglesa de Futebol, entende ser muito “rica essa oportunidade de jovens atletas fazerem uma experiência no exterior”. “Com certeza, isso vai agregar muito na questão de valores de vida e em relação ao estilo de jogo. Se a transferência for para uma liga mais forte, sem dúvida esse atleta já vai começar a se adaptar mentalmente e evoluir o sincronismo gestual para esse tipo de futebol que exige tomadas de decisões e gestos técnicos muito rápidos”, completa.

Há ainda o caso do Botafogo, que teve sua SAF (Sociedade Anônima do Futebol) comprada por John Textor em março de 2022 e passou a fazer parte de um conglomerado de clubes de propriedade do empresário americano, chamado Eagle Holdings. Entre as equipes integrantes estão Botafogo, Lyon, Crystal Palace e RWD Molenbeek, da Bélgica.

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Foi para o clube belga que o Botafogo emprestou o meio-campista Kayque, cria da base do Nova Iguaçu, mas que foi adquirido pelo clube carioca logo após subir para o profissional. Ele foi negociado em julho deste ano com o futebol europeu e o empréstimo também terá duração de um ano.