Anunciado no fim de janeiro, o acordo que renomeou o Pacaembu pela primeira vez em seus 83 anos é apenas mais um envolvendo a venda de naming rights dos estádios brasileiros. Pelos próximos 30 anos, o complexo esportivo passará a ser chamado “Mercado Livre Arena Pacaembu” e a Allegra Pacaembu, concessionária que administra o local, ganhará até R$ 1 bilhão do gigante do e-commerce que batiza o complexo esportivo. Trata-se do maior contrato do tipo já negociado, mas não o primeiro deles no Brasil.
A venda dos direitos dos nomes dos estádios e arenas ainda não é uma prática tão popular no Brasil quanto nos Estados Unidos e Europa, mas tem crescido por aqui. Prova disso é que nove estádios venderam seus naming rights a empresas recentemente: Mercado Livre Arena Pacaembu, Allianz Parque, MorumBis, Neo Química Arena, Ligga Arena, Arena Fatal Model Barradão, Arena MRV, Casa de Apostas Arena Fonte Nova e Arena BRB Mané Garrincha.
“As novas arenas são relativamente recentes e a existência de novas propriedades e novos planos de negócios também. As marcas, por sua vez, estão entendendo melhor como encaixar essas propriedades nas suas estratégias de marketing”, explica Armênio Neto, especialista em negócios do esporte e sócio-fundador da Let’s Goal. “Com o passar do tempo e de forma acelerada, esse segmento vai ficando mais maduro e os naming rights passarão a ter mais valor, inclusive financeiro”, acrescenta o executivo, que comandou o departamento de marketing do Santos entre 2010 e 2013, período em que desenvolveu e executou o plano de carreira para que o clube mantivesse Neymar no Brasil.
Naming rights é o direito aplicado à concessão da propriedade nominal de um determinado local, como um equipamento esportivo, a uma marca. Em troca, a empresa obtém o direito de pôr seu nome em local, estabelecimento ou espaço cultural, por um determinado prazo negociado no acordo. As companhias passam, então, a explorar a visibilidade dos espaços que renomeiam. No Brasil, os casos mais conhecidos envolvem clubes de futebol.
Cada contrato tem sua particularidade. As parcerias envolvem valores e tempos de contrato diferentes. Há a possibilidade da inserção nos acordos, de exploração de outras propriedades além de somente o nome do estádio.
O primeiro clube a batizar o nome de seu estádio a partir de um acordo comercial foi o Athletico-PR. Em 2005, a agremiação do Paraná fez acordo com a Kyocera Mita América, transformando a Arena da Baixada em Kyocera Arena. Hoje, o local se chama Ligga Arena. Antiga Copel Telecom, a companhia de tecnologia pagou R$ 200 milhões ao clube paranaense para rebatizar o estádio em Curitiba. O contrato é de 15 anos.
Especialistas no assunto alegam que uma das maiores dificuldades para conseguir vender o nome de um estádio é o fato de dificilmente criar-se o hábito de chamá-lo pelo nome da empresa. Esse costume, porém, está mudando. O Allianz Parque, arena do Palmeiras construída no mesmo terreno do antigo Palestra Itália, teve sucesso nesse sentido, já que o nome da seguradora alemã pegou com facilidade. O acordo foi feito em 2014, quando a arena palmeirense foi inaugurada, e a empresa pagou R$ 300 milhões por um contrato de 20 anos ao clube paulista.
Em 2020, o Corinthians fez parceria com a Hypera Pharma, conglomerado farmacêutico para transformar o seu estádio em Itaquera em Neo Química Arena. Também vai ganhar R$ 300 milhões por um acordo de duas décadas.
Só no fim de 2023 que o São Paulo repetiu seus rivais paulistas e batizou o Morumbi pela primeira vez em 63 anos graças ao acordo com a Mondelez, conglomerado multinacional de alimentos dono de marcas de chocolate como Bis, Sonho de Valsa e Oreo. O time tricolor receberá R$ 30 milhões anuais, chegando a R$ 90 milhões pelo acordo de três anos. É um contrato curto. Durante o período, o estádio será chamado de “MorumBIS”, em alusão ao Bis, uma das marcas de chocolate mais famosas que pertence à empresa de alimentos.
“Estamos falando de uma receita fundamental na composição de um plano de negócios de qualquer produto de esporte e entretenimento. Quanto maior a indústria investir, tenho certeza de que o segmento vai se desenvolver com muito mais rapidez, tendo a capacidade de se aproximar da experiência oferecida em outras regiões de mercado mais maduro, como América do Norte, que é uma referência”, diz Ivan Martinho, professor de marketing esportivo da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM).
Site de acompanhantes dá nome ao estádio do Vitória
Patrocinadora do clube desde fevereiro, a Fatal Model, maior plataforma brasileira de profissionais do sexo, apresentou no fim do ano passados duas propostas para que os torcedores rubro-negros escolhessem a forma com a qual a marca irá se associar ainda mais ao time no Brasileirão: aquisição dos direitos do nome do clube, com investimento de R$ 200 milhões, por um período de dez anos, ou a compra dos naming rights do Estádio Manoel Barradas, o Barradão, por R$ 100 milhões.
Os sócios aprovaram a segunda oferta e, em breve, o estádio passará a se chamar Arena Fatal Model Barradão. Os R$ 100 milhões serão usados na reforma do estádio, que vai ganhar uma cobertura já em 2024. O acordo valerá por dez anos.
“Associar nossa marca a um clube centenário e tradicional como o Vitória nos traz a visibilidade que precisamos para nossa causa, levando essas discussões para lugares que ainda não foram alcançados”, afirma Nina Sag, porta-voz do Fatal, segundo a qual o objetivo do site de acompanhantes é “estimular um debate necessário sobre o mercado de acompanhantes e trazer dignidade para uma profissão que é legalizada no País desde 2002″.
Ela faz a avaliação de que a parceria é benéfica para as duas partes. “Ao passo em que investimos e ajudamos o clube financeiramente, a repercussão gerada tem sido muito positiva para que nossos valores de igualdade e respeito sejam disseminados”. De acordo com levantamento encomendado pelo site de acompanhantes, a divulgação dos naming rights rendeu ao Fatal um retorno de mídia de R$ 126 milhões, com mais de 3 mil novos seguidores no Instagram na primeira semana de dezembro do ano passado, além de 1 milhão de impressões no Twitter em postagens no mesmo período.
Plataforma de apostas investe na Fonte Nova
Se o Barradão será rebatizado, a Arena Fonte Nova, maior estádio da Bahia, teve seu nome alterado pela segunda vez. Depois de dez anos da parceria com a Itaipava, marca de cerveja do Grupo Petrópolis, o estádio em Salvador passou a se chamar Casa de Apostas Arena Fonte Nova após o acordo com a plataforma de apostas esportivas. Segundo o consórcio responsável pela administração do estádio, a empresa pagará R$ 52 milhões pelos próximos quatros anos. Serão R$ 13 milhões anuais.
“É um acordo pioneiro e histórico para uma empresa do setor de bet, que pela primeira vez dá nome a uma das principais arenas do Brasil, onde são realizados eventos de alcance global”, comenta Anderson Nunes, diretor de negócios da Casa de Apostas.
Segundo o executivo, são quatro anos de contrato, com contrapartidas para todos os jogos e eventos de entretenimento durante este período. “O que podemos dizer é que será uma parceria de sucesso, com ótimos frutos tanto para a Casa de Apostas Arena Fonte Nova, quanto, principalmente, para o público”.
Naming rights de estádios no exterior
No exterior, a venda dos naming rights é um assunto consolidado e uma prática bem comum. Existem inúmeros estádios que já negociaram seus direitos de nome. Veja alguns exemplos:
- Inglaterra: Emirates Stadium, do Arsenal, Etihad Stadium, do Manchester City, Vitality Stadium, do Bournemouth, American Express Community, do Brighton, e o King Power Stadium, do Leicester City.
- Alemanha: Allianz Arena, do Bayern de Munique, BayArena, do Bayern Leverkusen, Signal Iduna Park, do Borussia Dortmund, Volkswagen Arena, do Wolfsburg, Red Bull Arena Leipzig, do RB Leipzig.
- França: Groupama Stadium, do Lyon e o Orange Vélodrome, do Olympique de Marseille.
- Itália: Allianz Stadium, da Juventus e Gewiss Stadium, da Atalanta.
- Espanha: Cívitas Metropolitano, do Atlético de Madrid.
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