André Oliveira x Augusto Melo: por que a eleição presidencial do Corinthians já começou a esquentar?

Acusações, ameaças de morte e disputa por apoio dão o tom do que promete ser a votação mais acirrada da história do clube

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Foto do author Rodrigo Sampaio
Atualização:

Faltando cerca de um mês para a eleição presidencial do Corinthians, o clima no Parque São Jorge começou a esquentar com a definição dos nomes que farão parte do pleito marcado para novembro. A chapa da situação, Renovação e Transparência, indicou o conselheiro André Luiz Oliveira, mais conhecido como André Negão, para tentar manter o grupo do ex-presidente Andrés Sánchez no poder. A oposição se atém à candidatura única de Augusto Melo, segundo colocado no último pleito, e está confiante em conseguir encerrar um domínio de 16 anos na política corintiana. Acusações, ameaças de morte e disputa por apoio dão o tom do que promete ser a votação mais acirrada da história do clube.

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Neste domingo, os candidatos se encontraram pela primeira vez frente a frente, em debate foi promovido pelo programa Mesa Redonda, da TV Gazeta. Os dois aspirantes à presidência do clube passaram mais tempo fazendo ataques pessoais e aos grupos políticos de cada um do que apresentando ideias e planos para o futebol, por exemplo. Entre os temas abordados, ambos falaram sobre orçamento, a gestão do atual presidente Duílio Monteiro Alves, reformulação do elenco e a permanência do técnico recém-contratado Mano Menezes.

Esta será a primeira vez no Corinthians em que apenas dois nomes serão colocados à mesa dos sócios. A demora na definição por parte do grupo da situação se deu, em parte, pela rejeição de alguns associados à indicação do nome de André Luiz Oliveira. Vice-presidente do Conselho Deliberativo e um dos fundadores da Renovação e Transparência, o candidato vai concorrer à presidência pela primeira vez e, segundo ele, a resistência ao seu nome ocorre por causa do “racismo estrutural”.

“Estou no clube há 30 anos”, disse André Luiz Oliveira, na cerimônia que o confirmou como candidato. “Neste período, estudei e me preparei para este desafio. Sou graduado em tecnologia de gestão esportiva no País, curso de gestão financeira. Participei de vários fóruns e palestras voltadas à gestão de clubes. Por duas vezes, fui gestor administrativo deste clube”, completou.

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André Luiz Oliveira (esq.) e Augusto Melo (dir.) concorrem à presidência do Corinthians. Foto: Reprodução/Instagram/@andrenegaooficial e Reprodução/Instagram/@augustomelo

André Luiz Oliveira não é unanimidade dentro da própria chapa, mas conta com o apoio irrestrito do ex-presidente Andrés Sanchez, responsável pela contratação de Ronaldo e por viabilizar a construção do estádio em Itaquera.

O candidato trabalhou como secretário parlamentar de Andrés e chegou a se candidatar para vereador por duas vezes, mas não conseguiu se eleger. Em 2016, ele foi levado em condução coercitiva pela Polícia Federal (PF), no âmbito da Operação Lava Jato, para depor sobre suposto recebimento de propina no valor de R$ 500 mil da construtora Odebrecht em razão das obras da Neo Química Arena. Não foi indiciado na operação da Polícia Federal. André acabou detido por porte ilegal de arma, mas pagou fiança e foi liberado. “Fui investigado por seis anos e não acharam nada. Sequer fui indiciado. Ganhei um atestado de idoneidade. O processo da Lava Jato foi arquivado a pedido do Ministério Público”, afirma o candidato.

A relação com o jogo do bicho na zona leste de São Paulo também pesa contra André Luiz Oliveira, que já garantiu em outras oportunidades ser um assunto do passado, anterior à sua trajetória no clube. “A minha atuação há muitos anos é no ramo da construção civil. Escrevi jogo do bicho por um tempo muito curto, durante a crise econômica que o país viveu nos anos 1980. Foi uma questão de sobrevivência, em uma década em que muitas pessoas estavam passando dificuldade. Mas tudo já foi resolvido. Não devo nada”, diz.

Ele sobreviveu após ficar quase três semanas internado depois de levar sete tiros em uma suposta tentativa de assalto. O conselheiro foi, ainda, diretor administrativo no segundo mandato de Andrés e vice-presidente na gestão de Roberto de Andrade.

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Apoio, acusações e ameaças

As polêmicas envolvendo o nome de André Luiz Oliveira contribuíram para o Renovação e Transparência não conseguir o cobiçado apoio da Chapa 82 (Movimento Corinthians Grande), grupo formado por conselheiros e ex-presidentes de conselhos com grande influência na política dentro do Parque São Jorge. Essa turma, neste ano, vai apoiar o candidato da oposição Augusto Melo. Os esforços para tentar vencer o pleito passaram, inclusive, pela articulação de uma candidatura única contrária à Renovação e Transparência, considerada a única alternativa para superar o grupo de Andrés Sánchez.

Na eleição de 2020, que elegeu Duílio Monteiro Alves presidente, Augusto Melo teve 939 votos, 142 a menos do que o atual mandatário. O candidato ganhou força nos bastidores ao mesmo tempo em que também teve o seu nome envolvido em polêmicas. Augusto, que foi diretor das categorias de base na gestão Roberto de Andrade (2015-2018), foi acusado de fazer parceria como agente de jogadores na época em que trabalhou no União Barbarense, em um projeto que visava recolocar a cidade de Santa Bárbara d’Oeste na rota da Copa São Paulo.

Ao Estadão, a assessoria de Augusto Melo negou a existência de relação comercial com o União Barbarense, alegando que o candidato trabalhou sem remuneração por dois anos e recebia apenas uma fatia dos jogadores negociados, mas que não era responsável pela carreira dos atletas. O candidato também é provocado nos bastidores do clube por ter sido condenado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo por crime tributário, no valor de R$ 342 mil à época. “Como disse, sou Ficha Limpa. Meu adversário não pode dizer o mesmo. Foi condenado à prisão por sonegação de impostos. Que credibilidade teria um sonegador para discutir com bancos e com o governo as dívidas do clube?”, diz André Luiz Oliveira.

Empresário do ramo têxtil, Augusto Melo admite a condenação por dois anos e dez meses e explica que o processo é herança de uma empresa, no Brás, que havia negociado no início dos anos 2000. Segundo Melo, o proprietário da fábrica acabou morrendo e as dívidas foram cobradas dos antigos proprietários. Ele acordou com a Justiça em pagar o valor com serviços de assistência social (cesta básica), mas como não contestou a decisão, acabou sendo condenado. Tentou recuperar sua condição de réu primário e não conseguiu.

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“O grupo do Andrés já entendeu que não consegue mais recuperar a própria imagem e tenta arrastar todo mundo para o mesmo buraco. Não vai acontecer. Vamos manter um bom nível. Como visto, a empresa estava totalmente regularizada quando a vendi. A tal dívida ocorreu muitos anos depois, já com outro proprietário. Agora tentam, sem sucesso, fazer estardalhaço com isso. Puro desespero”, afirma o candidato da oposição.

Augusto Melo relata que tem sido ameaçado de morte frequentemente durante a campanha no clube. O empresário afirmou que as intimidações vêm acontecendo principalmente via telefone, por meio de números privados. Em uma das chamadas, uma voz desconhecida alertou o candidato para ter “cuidado com sua vida”, e que ele tem “um lugar no céu” garantido. Augusto afirma, ainda, que uma das ameaças se estendeu à sua filha, também por meio de um telefonema. Em maio, ele registrou um Boletim de Ocorrência (B.O.) no 52º DP da Polícia Civil queixando-se das ameaças.

Peso da temporada e dívidas

O futebol apresentado em campo pelo Corinthians pode ser determinante para o sucesso da chapa Renovação e Transparência em novembro. Duílio corre risco de ser o primeiro presidente em 35 anos a deixar o cargo sem um troféu e vive sua pior temporada no comando do clube. Depois de escolher o inexperiente Fernando Lázaro para começar o ano como o treinador, ele optou pela controversa contratação de Cuca, condenado na Suíça por manter relações com uma garota de 13 anos, e que acabou ficando apenas sete dias no cargo depois de grande rejeição da torcida e da opinião pública. A solução encontrada foi Vanderlei Luxemburgo, com passagens vitoriosas pelo clube no início dos anos 2000, mas sem trabalhos relevantes na última década.

O Corinthians está a apenas duas posições fora da zona de rebaixamento do Brasileirão, com 15 pontos. Para não terminar o ano no vermelho, o clube aposta suas fichas na Copa do Brasil, na qual é semifinalista — mesmo em vantagem nos playoffs da Copa Sul-Americana, Luxemburgo deu de ombros para o torneio continental. Em junho, a diretoria anunciou a venda de 40% dos direitos econômicos que detinha de Gustavo Mantuan ao Zenit (RUS), clube ao qual o meia estava emprestado, por 2 milhões de euros (R$ 10,4 milhões).

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O Corinthians voltou a fazer negócio com os russos dias depois e acertaram a venda do atacante Pedro, joia da base, por 9 milhões de euros (cerca de R$ 46 milhões) — o jogador fica no clube até dezembro. As negociações irritaram parte da torcida, que julgou baixo os valores pagos pelos “crias”.

O maior desafio do próximo presidente será a geração de novas receitas. O Corinthians tem uma dívida de R$ 1 bilhão, como aponta o Relatório Convocados 2023: Finanças, História e Mercado do Futebol Brasileiro, desenvolvido pelo economista Cesar Grafietti, em parceria com a OutField e Galapagos Capital. Na coletiva que definiu a sua candidatura, André Luiz Oliveira afirmou que tem em mente a dificuldade para sanar as contas, mas garantiu ser possível equacioná-las.

“O Corinthians arrecada R$ 800 milhões por ano e tem todas as condições de chegar a R$ 1 bilhão no curto prazo, com a geração de receitas. Mas é preciso gastar melhor esse dinheiro. Utilizando melhores critérios para as contratações, é possível montar um time para brigar em qualquer competição. Não vamos cortar investimentos do clube nem endividá-lo. Apenas vamos contratar melhor. Usaremos melhor a ciência de dados, traremos um executivo de futebol que conheça o mercado, melhoraremos o scouting”, argumentou André Luiz Oliveira ao Estadão.

Com trabalho nos juniores, Augusto Melo defende que um dos caminhos para o clube voltar a ser protagonista é o investimento pesado nas categorias de base. Ele criticou as vendas de Mantuan e Pedro. “O Corinthians é conhecido como um clube que vende barato. Em 2024, não vai ser assim”, afirmou ao Estadão. “Também não podemos ficar contando apenas com ingressos caros (para gerar receita). Devemos ter uma visão de planejamento voltado para o futuro. Estamos conversando com grandes empresas de países de Itália, Holanda e França para abrir o clube ao mercado. Tenho certeza que quando sanarmos nossas dívidas, voltaremos a ser protagonistas.”

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O candidato também defende uma mudança radical em todos os setores do clube. “O Corinthians precisa de uma reformulação, com uma gestão técnica. O caso do Luan, por exemplo, jamais deveria ter chegado a esse ponto de o jogador ser agredido. Isso é inaceitável.”

Dentro do clube, os candidatos e seus aliados disputam cada palmo de terreno na intenção de convencer os associados com suas ideias. As confusões são frequentes, a exemplo do que ocorre também no dia da votação.

Quando é a eleição para presidente do Corinthians?

A eleição do Corinthians está marcada para ocorrer em novembro, mas ainda não há data definida. Além do presidente, serão eleitos também dois vice-presidentes e os membros do Conselho Deliberativo. Tem direito a voto os associados com mais de cinco anos de presença no quadro, maiores de 18 anos e com todas as obrigações financeiras em dia. Vale ressaltar que o direito não se estende ao programa Fiel Torcedor. Estima-se que três mil votantes devem participar da eleição neste ano.

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