Árbitros brasileiros seguem jogadores e vão à Arábia em busca de dinheiro e profissionalismo

No futebol árabe, trabalhadores da arbitragem não precisam ter mais de um emprego e podem faturar em um jogo valores que só conseguem ao longo de um mês no Brasil

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Foto do author Bruno Accorsi
Atualização:

O mercado de futebol árabe começou a dar sinais de sua força contratando jogadores veteranos e, em pouco tempo, já estavam tirando jovens talentos do Brasil, como Wesley e Alexsander, que trocaram Corinthians e Fluminense por Al-Nassr e Al-Ahli, respectivamente. Mais recentemente, o dinheiro saudita começou a atrair também trabalhadores da área da arbitragem.

O árbitro brasileiro Igor Junio Benevenuto, integrante do quadro da Fifa, é um exemplo dessa tendência. Aos 43 anos, ele aceitou um convite para trabalhar nos Emirados Árabes, como árbitro de vídeo, até março de 2025. Antes, outros profissionais do Brasil foram ao mundo árabe para trabalhar de maneira pontual.

Igor Benevenuto deixou o Brasil para trabalhar nos Emirados Árabes  Foto: Cesar Greco/ SE Palmeiras

O paranaense Paulo César Zanovelli apitou o duelo entre Al-Ahli e Abha, pelas oitavas de final da Copa do Rei da Arábia Saudita, no final de 2023. Também estiveram trabalharam no futebol saudita nomes como Anderson Daronco e Ramon Abbati Abel. Uma parceria de intercâmbio entre a Federação Saudita, a CBF e a Conmebol ainda levou Nailton Oliveira, Alex Ang Ribeiro e Rodolpho Trotski para trabalhar no país.

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De acordo com uma matéria publicada pela jornal londrino The Times, a Arábia Saudita tem feito investimentos até para retirar árbitros da Premier League, considerada o campeonato de futebol mais forte do mundo e apontada como liga mais valiosa por estudo recente da Football BenchMark.

“O efeito da chegada de super atletas trazem junto o crescimento de todo ecossistema, que muitas vezes não é nem calculado, e dentro deste contexto entram até os árbitros. Salários de outros jogadores, patrocínios, valorização de profissionais envolvidos, direitos de transmissão, são apenas alguns dos exemplos da força trazidos pela audiência destes ícones do esporte como Cristiano Ronaldo e Neymar”, corrobora Renê Salviano, CEO da Heatmap e especialista em marketing esportivo, e que faz a captação de contratos entre marcas envolvendo profissionais do esporte.

Segundo o Times, a Liga Saudita paga por partida entre US$ 4 mil (R$ 24,5 mil na cotação atual) e US$ 5 mil dólares (R$ 30,7 mil na cotação atual) por jogo aos árbitro. No Campeonato Brasileiro, um árbitro Fifa ganha em média R$ 7 mil por jogo. Aqueles credenciados apenas à CBF têm um pagamento na casa de R$ 5 mil.

Em jogos da Libertadores, a Conmebol não tem uma tabela fixa, como ocorre na Uefa, por exemplo, e trabalha como valores que variam de US$ 2 mil (R$ 12 mil) a US$ 16 mil (R$ 98,3 mil). O valor mais alto, contudo, é pago apenas em finais. Fora uma pequena elite, a maioria dos árbitros brasileiros têm outros empregos, já que a arbitragem de futebol não é uma função profissionalizada pela CBF. Nos grandes centro do futebol do mundo árabe, o ofício já passou pelo processo de profissionalização.

“Temos uma legislação e regulamentos retrógrados que não acompanharam o desenvolvimento dos negócios do futebol. Tivemos na Copa do Brasil dois jogos que renderam setenta milhões para o vencedor do confronto. Quem conduziu a arbitragem desses jogos? Um profissional remunerado de que forma? Dedicado por quanto tempo a esse ofício? Como se dá a promoção dos árbitros aqui? O que pode ser cobrado deles? Por quem? Não temos sequer uma liga. Assim como se dá com os atletas, os melhores árbitros devem procurar o melhor para eles”, argumenta Thiago Freitas, COO da Roc Nation Sports no Brasil.

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A profissionalização dos árbitros está em debate no Senado brasileiro. No último dia 11, a Comissão do Esporte (CEsp) aprovou a PL 864/2019, do senador senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB). O projeto, que regulamenta as relações de trabalho entre árbitros, auxiliares e entidades esportivas, recebeu um substitutivo de Romário (PL-RJ) e seguiu para a Comissão de Assuntos Sociais (CAS).

“Com a evolução das dinâmicas esportivas e a necessidade crescente de profissionalização do setor, é fundamental aprofundar o debate, com vistas a aprimorar a legislação que rege essas relações, garantindo direitos justos e condições de trabalho adequadas”, disse Romário, durante a reunião da CEso.

Na avaliação de Vital do Rêgo, no formato atual da legislação, árbitros e auxiliares são “meros prestadores de serviços”, já que as empregadoras são isentas de responsabilidades trabalhistas, securitárias e previdenciárias.

A PL tem o objetivo de estabelecer um contrato especial de trabalho esportivo, a ser firmado entre o árbitro e a organização que administra ou regula a modalidade. O contrato pode ser estabelecido por prazo determinado, compatível com a duração das competições às quais os profissionais estiverem vinculados.

O texto também define que seja assegurada uma remuneração mensal mínima quando o salário for pactuado por tarefa, e tal valor deve estar prevista em acordo ou convenção coletiva de trabalho, no contrato individual ou em lei. Direito a férias e décimo terceiro salário, calculados proporcionalmente nos casos de contratos com duração inferior a 12 meses, são outros pontos defendidos no projeto.