Rival do Palmeiras nesta quarta-feira, o Independiente del Valle se consolidou como um dos clubes mais bem-sucedidos no continente. Campeão da Sul-Americana em 2019 e 2022, o time equatoriano se tornou algoz de grandes clubes brasileiros nos últimos anos e alcançou sucesso esportivo graças, entre outras razões, ao seu projeto inspirado no Barcelona e que privilegia a formação e desenvolvimento de jovens atletas.
O clube se estabeleceu como um dos principais formadores de jogadores no continente, com investimento alto nas categorias inferiores e passou a ser a base da seleção equatoriana, que faz boa campanha nas Eliminatórias. Mas para que isso fosse possível, teve de alterar significativamente o seu modelo de gestão há quase duas décadas.
Fundado em 1958 por jovens trabalhadores da pequena Sangolquí, cidade a menos de meia hora da capital Quito, o Del Valle se habituou a disputar as divisões de acesso do Equador e vivia no limbo do futebol local. Até que, em 2006, os empresários Michael Deller e Franklin Tello decidiram comprar o clube.
A aquisição, por meio de um fundo de investimento, foi determinante para que a equipe se tornasse uma potência no Equador. Deller, o principal acionista, é um dos homens mais ricos do país. Dono da rede de fast-food KFC no país e figura importante no ramo imobiliário, ele enxergou no futebol a oportunidade de expandir seus negócios.
Conforme o jornalista equatoriano Jacinto Bonilla Prado, que acompanha de perto o Del Valle, a agremiação é administrada com “objetivos claros, transparência administrativa, gestão econômica rigorosa e respeito absoluto pelos prazos estabelecidos”.
Os magnatas locais decidiram investir alto e deram prioridade às categorias de base. Segundo Roberto Arroyo, gerente esportivo do Del Valle, a agremiação investe de 25% a 30% de seu orçamento na formação dos atletas, o que inclui hospedagem, alimentação, transporte, educação, com aulas para os garotos no próprio colégio do clube, e, claro, metodologia esportiva clara e bem definida. “O clube acreditou nisso desde o início e a filosofia tem sido mantida até hoje”, resume Arroyo em entrevista ao Estadão.
Formação cidadã
Santiago Morales, gerente geral do Del Valle, conta ao Estadão que, desde que o projeto foi iniciado em 2007, quando o time disputava a terceira divisão, os dirigentes notaram que havia uma lacuna na formação dos jogadores no futebol equatoriano.
Por sermos um time novo, tivemos que buscar forças para poder competir com times de longa história no campeonato nacional. Vimos que a única forma de competir com eles era formando jogadores. É por isso que desde o primeiro dia trabalhamos sempre para dar-lhes uma formação integral, não só esportiva
Santiago Morales, gerente geral do Independiente Del Valle
O clube privilegia a formação cidadã do atleta, de modo que oferece, em seu centro de alto rendimento localizado na cidade de Sangolquí, psicólogos, nutricionistas, fisiologistas e preparadores físicos, entre outros profissionais, muitos dos quais vieram da Europa. “Essa é uma jornada que percorremos durante muitos anos até estabelecermos firmemente um projeto que obviamente tem muito mais para crescer, mas acredito no potencial que o jogador de futebol equatoriano tem”, observa o dirigente.
O investimento nos garotos se mostrou até baixo perto do retorno financeiro e esportivo. Além dos títulos, o time lucrou mais de R$ 500 milhões com as vendas de seus principais talentos para o exterior nos últimos anos. Moisés Caicedo, por exemplo, foi vendido por R$ 26 milhões ao Brighton. No ano passado, o volante foi negociado por 133 milhões de euros (R$ 730 milhões) ao Chelsea e se tornou a transferência mais cara da história da Premier League. O Chelsea também comprou Kendry Páez, o “Endrick do Equador”, que se acostumou a quebrar recordes precocemente. O jovem de 16 anos, vai se transferir à equipe inglesa quando completar 18 anos, em maio do ano que vem.
Filosofia de jogo imutável inspirada em Guardiola
O time perde, ganha ou empata, saem e entram técnicos e jogadores e algo é imutável no Del Valle: a filosofia de jogo. O clube de Sangolquí se orgulha de ser estável financeiramente e em campo, com uma maneira de jogar bem definida, sem se nortear pelos resultados.
O jornalista Jacinto Bonilla Prado conta que, desde os sub-12 até a equipe principal, os atletas jogam no mesmo esquema e conhecem, desde cedo, a filosofia de jogo que lá impera. É por isso que, quando os jovens chegam ao elenco profissional, adaptam-se facilmente.
“Por volta do ano de 2018 tomamos a decisão de encontrar um modelo de jogo, não queremos dizer que nosso modelo seja o melhor ou o pior, simplesmente escolhemos o modelo de jogo como uma diretriz. Decidiu-se adotar um modelo de jogo europeu bem espanhol, muito parecido com o de Guardiola”, detalha o cartola Santiago Morales, mencionando o melhor treinador do mundo, conhecido por seu jogo posicional, de muita posse de bola e triangulações.
É com base na filosofia de jogo que o vice-campeão da Libertadores de 2016 garimpa jovens jogadores, desde os 12 anos, e escolhe os seus treinadores. Todos têm que se adaptar ao modelo, implementado no time profissional desde 2019. “Os técnicos são escolhidos pela metodologia do clube e os jogadores também. Os jogadores também se adaptam à metodologia de jogo que procuramos e desta forma que é feito tanto o recrutamento de adolescentes como o recrutamento de adultos, seja a nível nacional ou internacional”, explica o gerente Roberto Arroyo.
“É simplesmente uma decisão gerencial. Gostamos que a equipe proponha o jogo, que tenha um futebol vistoso e que ganhe os jogos”, endossa Morales.
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