Cuca foi condenado? A vítima o reconheceu? Veja o que se sabe sobre o escândalo de Berna

Contratação do ex-técnico pelo Corinthians reavivou o caso ocorrido na Suíça, em 1987; pressão e pedido da família levaram o treinador a deixar o comando do time após 6 dias e dois jogos

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Foto do author Ricardo Magatti
Atualização:

Anunciada há uma semana, a contratação de Cuca pelo Corinthians para o lugar de Fernando Lázaro reavivou o escândalo de Berna, na Suíça, que aconteceu em 1987. O técnico era jogador do Grêmio à época e foi condenado pela Justiça do país europeu por manter relação sexual com uma menina de 13 anos em um hotel. Pressão e o pedido da família levaram o técnico a deixar o cargo após vitória sobre o Remo na Copa do Brasil na noite desta quarta-feira, 26.

“Não esperava esta avalanche, coisas passadas há muito tempo, fui julgado e punido pela internet, mas não quero entrar em detalhes”, afirmou durante o anúncio.

O Estadão reuniu tudo o que se sabe sobre o episódio, que provocou protestos da torcida corintiana e pressionou o técnico a pedir demissão.

O que aconteceu no escândalo de Berna?

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Alex Stival, o Cuca, Henrique Arlindo Etges, Eduardo Hamester e Fernando Castoldi, então atletas do Grêmio, foram detidos sob a alegação de terem tido relações sexuais com uma garota de 13 anos sem consentimento. O caso ocorreu no hotel Metrópole, em Berna, na Suíça, em 1987, ano em que o time gaúcho fez uma excursão pela Europa.

Segundo a investigação da polícia local, a garota pediu autógrafos e camisetas para os jogadores, que, então, a levaram para dentro do quarto e abusaram dela. Ela registrou queixa na polícia horas depois sob a alegação de ter sofrido violência sexual.

Cuca, técnico do Corinthians, enfrenta pressão por condenação na Suíça Foto: Rodrigo Coca/Ag.Corinthians

Segundo publicou o Estadão em 7 de agosto de 1987, a versão do Grêmio, naquela época, era de que a jovem invadiu o quarto em que estava os atletas para pedir flâmulas, camisetas e autógrafos e depois saiu.

No mesmo dia, o Estadão publicou que Eduardo e Henrique haviam admitido ter tido relação sexual com a garota, mas de forma consensual. Fernando e Cuca negavam qualquer participação.

Cuca foi condenado?

Sim. Cuca, Henrique e Eduardo foram condenados em 1989, portanto dois anos depois do episódio. A Justiça suíça condenou os brasileiros a 15 meses de prisão e a pagamento de US$ 8 mil. Mas eles nunca cumpriram a pena estipulada para o crime, que prescreveu em 2004. Fernando foi condenado a três meses de prisão e ao pagamento de U$ 4 mil por ser considerado cúmplice.

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Cuca foi enquadrado no antigo artigo 187 do Código Penal da Suíça, que prevê prisão de até cinco anos por envolvimento em um ato sexual com uma criança menor de 16 anos. A A Justiça entendeu que não houve violência por parte de Cuca e dos outros jogadores, mas sim “coerção” e “fornicação”, segundo afirmou ao Estadão uma porta-voz do Tribunal Superior de Berna, responsável por dar a sentença há 34 anos.

Cuca chegou a ser preso?

Sim. Cuca e os outros três colegas do Grêmio permaneceram em cárcere por 30 dias. Depois desse período, retornaram para o Brasil após darem depoimento por mais de uma vez e ser encerrada a fase de instrução do processo.

Julgamento à revelia?

Cuca alega ter sido julgado à revelia. Ele ficou no Brasil enquanto o julgamento aconteceu na Suíça, mas o Grêmio pagou advogados para defender ele e os outros jogadores, segundo contou Luiz Carlos Pereira Silveira Martins, o Cacalo, ex-presidente do Grêmio e então vice-presidente jurídico do clube naquele momento.

A prisão dos gremistas reverberou muito na época. Ao Estadão, fontes diplomáticas ligadas ao Ministério das Relações Exteriores consideraram o caso “delicado e difícil”.

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Cuca foi condenada pela Justiça Suíça, mas crime prescreveu e a pena não foi cumprida Foto: Diego Vara/Reuters

O que o técnico Cuca alega?

Em sua coletiva de apresentação no Corinthians, Cuca declarou ser “totalmente inocente” e disse ter “vaga lembrança” do episódio. “Eu estava no Grêmio há uns 20 dias. Tenho vaga lembrança de tudo que aconteceu. Na lembrança que tenho, tinha 23 anos, íamos jogar uma partida e pouco antes subiu uma menina para o quarto. O quarto em que eu estava com mais três jogadores era duplo, tinha duas camas. Essa foi minha participação nesse caso”, disse o treinador.

“Sou totalmente inocente, não fiz nada. As pessoas falam que houve um estupro. Eu não fiz nada”, completou o técnico. Ele também alega que a jovem não lhe reconheceu como um de seus agressores.

“O mais importante não é a palavra da vítima? Ela falou: ‘Eu não conheço, não vi, não estava’. Foram três vezes. A palavra da mulher era que o Cuca não estava lá. Como posso ser condenado? Pelo quê?”, questionou.

O que diz a defesa da vítima?

O advogado da vítima, Willi Egloff, porém, contestou a versão de Cuca ao afirmar que a menina reconheceu, sim, o então jogador do Grêmio como um dos que participaram do ato. “A declaração de Alexi Stival (Cuca) é falsa. A garota o reconheceu como um dos estupradores. Ele foi condenado por relações sexuais com uma menor”, disse o advogado ao Uol.

O advogado também validou as notícias publicadas pelo jornal Der Bund, de Berna, em 1989. A publicação apontou que o sêmen de Cuca foi encontrado na garota. De acordo com Egloff , o exame foi feito pelo Instituto de Medicina Legal da Universidade de Berna. “É correto que o sêmen de Alexi Stival foi encontrado no corpo da garota”, disse ele.

Anunciado há uma semana, Cuca treina, sob pressão, o Corinthians Foto: Rodrigo Coca/Ag.Corinthians

O processo está sob sigilo?

Sim. O processo está sob sigilo de 110 anos. O documento só pode ser acessado em caso de autorização da vítima ou por meio de uma decisão judicial determinando a derrubada do sigilo. “A proteção de dados pessoais é tratada com muito mais rigor na Suíça do que nos Estados Unidos, por exemplo”, comparou uma porta-voz da Corte de Berna em resposta ao Estadão. Ela justificou a necessidade de manter os documentos do caso sigilosos. “O legislador quer ter certeza de que nenhuma das pessoas mencionadas no processo estará viva quando ele se tornar público”.

O que dizem os patrocinadores do Corinthians?

Apenas dois dos nove patrocinadores que estampam suas marcas no uniforme do time masculino do Corinthians, incluindo a gigante americana Nike, fornecedora de material esportivo da equipe há 20 anos, se posicionaram sobre a escolha da diretoria por Cuca: Banco BMG e a Ale, distribuidora de combustíveis.

O BMG, por meio de publicação nas redes sociais, demonstrou apoio à luta feminina. “O Banco BMG reitera que não compactua com atos violentos e, acima de tudo, respeita, preza e luta pela igualdade das mulheres”.

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A Ale se limitou a informar que “mantém um rigoroso programa de compliance e é comprometida em operar segundo fortes princípios éticos”. Na mesma linha do BMG, também admitiu que “não compactua com qualquer tipo de violência e preza para que seus colaboradores, clientes, fornecedores e parceiros sigam dentro desses mesmos princípios”.

Já Nike, Neo Química, que dá nome à arena corintiana, Pixbet, Cartão de Todos, Spani Atacadista, UniCesumar e Lukma permaneceram em silêncio sobre o caso Cuca. O Estadão procurou todas as empresas por mensagens, ligações e e-mails.

Por que o Corinthians contratou Cuca?

O presidente do Corinthians, Duílio Monteiro Alves, sempre aprovou o trabalho do técnico, campeão brasileiro no arquirrival Palmeiras em 2016, mas considerava que ele jamais poderia treinar o time alvinegro justamente pela condenação. Isso mudou após, segundo ele próprio, uma apuração dos fatos.

Antes de tomar sua decisão, Duílio conversou com Cuca e foi convencido pelo técnico, que se declarou inocente. O dirigente disse ter consultado os departamentos jurídicos, de marketing e de compliance do clube. Também afirmou ter conversado com a diretora do futebol feminino, Cris Gambaré. Todos, segundo Duílio, avalizaram a contratação de Cuca.

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Questionado após o anúncio de saída de Cuca, o presidente Duílio Monteiro Alves preferiu não alimentar especulações sobre qual rumo o clube tomará na escolha do novo treinador. O mandatário disse ainda que o pedido de demissão de Cuca não causa alívio ou sentimento de fracasso, mas tristeza pela decisão.