A condenação de quatro anos e seis meses a Daniel Alves por agressão sexual a uma mulher em boate de Barcelona, na Espanha, encerra apenas o primeiro capítulo do processo sofrido pelo atleta na Europa. A sentença foi divulgada nesta quinta-feira, dia 22. O anúncio da pena acontece duas semanas depois do julgamento, que durou três dias no Tribunal de Barcelona e foi presidido pela juíza Isabel Delgado Pérez. Preso há 13 meses, o jogador vai começar a cumprir a pena, mas ainda pode recorrer à decisão da juíza. Conheça os caminhos da Justiça espanhola:
Instâncias da Justiça espanhola
- Tribunal de Barcelona: é um órgão provincial. Foi o que condenou Daniel Alves a quatro anos e seis meses.
- Superior Tribunal da Justiça da Catalunha: é superior ao Tribunal de Barcelona e trata-se de um órgão relativo à comunidade autônoma da Catalunha. A defesa de Daniel Alves deve recorrer a ele para buscar inocentá-lo.
- Tribunal Supremo de Madri: órgão máximo da Justiça espanhola. Caso o órgão provincial recuse o recurso, ainda há como recorrer a este, que tem alçada em todo território espanhol e toma decisões definitivas.
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Como Daniel Alves pode recorrer da pena aplicada?
Depois da condenação, há mais duas instâncias em que o jogador brasileiro pode recorrer. A primeira é o Superior Tribunal de Justiça da Catalunha. Caso haja indeferimento de um pedido da defesa, a última instância possível é o Tribunal Supremo de Madri, órgão constitucional máximo do Poder Judicial da Espanha.
“A defesa pode ser baseada em alguma falha processual. E a acusação pode reiterar o que apontou no processo (em caso de pedido de aumento de pena). As cinco versões de Daniel o prejudicaram. Na sentença, a juíza afirma que a vítima manteve sua versão e sendo persistente nela”, analisa a advogada Fernanda Pereira, especialista e doutoranda em Direito Penal e em inteligência aplicada e investigação criminal.
Um ponto que pode ser apontado pela acusação é a recente lei “Só o sim é sim”, que estabelece as penas para crimes sexuais na Espanha. A legislação foi aprovada em 2022 e reformada em 2023. Na parte da defesa, um recurso específico pode solicitar, ainda, que Daniel Alves possa cumprir a pena em liberdade, enquanto outro pedido se referiria à condenação em si, em paralelo.
Se recurso não for acolhido pelo Tribunal Supremo de Madri, não há mais caminhos. Daniel terá de cumprir a pena sem mais pedidos de recursos e o caso é considerado encerrado. A pena deve ser cumprida na Espanha, já que todo o processo ocorreu no país europeu. É um caso semelhante ao de Robinho, condenado por estupro na Itália, mas em liberdade no Brasil, por não estar no país europeu. A diferença, contudo, é que Robinho pôde recorrer em liberdade em primeira instância. Foi neste momento que ele deixou a Itália.
A tendência é que Daniel Alves aguarde pelo recurso, se for pedido, preso, já cumprindo a pena de quatro anos e seis meses aplicada pela Justiça. Durante todo o processo, seus advogados tentaram que o brasileiro respondesse ao caso em liberdade. Daniel tem casa em Barcelona, onde mora sua mulher, Joana Sanz. Ele também levou a mãe de seus filhos e os próprios filhos para morar na cidade com a intenção de convencer a Justiça de que não fugiria. Mas nenhum desses pedidos foi aceito. Nesta semana, um preso revelou que Daniel tinha planos de fugir da Espanha se fosse libertado.
Em caso de acolhimento de um recurso de liberdade (que no Brasil é o habeas corpus) em alguma das instâncias superiores ao Tribunal onde Daniel foi julgado e condenado, o jogador deve ser imediatamente liberado. Somente com a liberdade, mas com a condenação ainda sendo apelada, a saída do brasileiro da Espanha pode ser proibida. “No momento que já há uma sentença, não tem perigo do dano de dificultar o julgamento, cercear ou coagir uma testemunha. Hoje, o risco seria o de fuga, o que pode ser suprimido pela retenção de passaporte, liberdade vigiada (tornozeleira eletrônica), entre outros elementos fornecidos pela própria defesa”, exemplifica Fernanda Pereira. As sugestões de monitoramento podem ser oferecidas pela própria defesa, para facilitar o deferimento de um eventual recurso de liberdade.
No caso de recurso aceito para anulação do júri ou absolvição, o jogador deve ser solto, pode sair da Espanha e até mesmo voltar ao Brasil, já que não teria mais nenhuma pendência no território espanhol com a Justiça. Nesse caso, o tribunal superior anularia a condenação do Tribunal de Barcelona.
Como a pena foi definida
A acusação pedia condenação de 12 anos. O Ministério Público, nove. Mas era esperado, no máximo, seis anos de reclusão. Um pagamento da defesa à Justiça, ainda no início do processo, para uma indenização de 150 mil euros (cerca de R$ 800 mil) à jovem vítima do crime é motivo de abatimento da sentença. Daniel Alves recebeu o valor para pagar a multa na Justiça de Neymar da Silva Santos, pai do jogador da seleção brasileira e do Al-Hilal, de acordo com o site Uol. O Estadão procurou o estafe do empresário e do jogador e a resposta que obteve foi “nada a declarar”.
Reduzir a pena era uma decisão questionada pela acusação. O MP indicava, ainda, dez anos de liberdade vigiada após o cumprimento da pena em cárcere, e que ele seja proibido de se aproximar ou comunicar com a vítima pelo mesmo período. Esse prazo, na condenação, foi reduzido para cinco anos. “Deve ter sido considerado a parte de ser réu primário. Quando uma pena é de quatro a 12 anos, o que se leva em conta, é a pena mínima. Há atenuantes, como reparação, que podem ter sido considerados pelo corpo de juiz”, explica Fernanda Pereira.
O tribunal considerou que ficou claro que a vítima não consentiu ao ato e que existem elementos, além do testemunho da mulher, para ser comprada a agressão. Segundo a análise da sentença, foi considerado que Daniel Alves “capturou bruscamente a denunciante, a tirou do chão e evitou que ela pudesse se mover”, como parte da agressão sexual. A sentença enfatiza a falta de consentimento da mulher.
Ao longo do período detido, Daniel Alves mudou sua versão sobre o caso por diversas vezes, trocou de defesa e teve três pedidos de liberdade provisória negados, com a Justiça citando risco de fuga. Recentemente, foi noticiado que Daniel Alves foi acusado por um colega de cela de planejar uma fuga para o Brasil. Seu estado emocional, “deprimido e desanimado”, também fez a prisão onde ele está detido acionar um protocolo antissuicídio.
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