O Campeonato Saudita já disputa as atenções do mundo do futebol com ligas europeias. Só nesta temporada, foram gastos mais de R$ 2 bilhões com contratações. Nomes como Cristiano Ronaldo, Neymar e Kanté são utilizados como ferramenta para reverter a imagem da Arábia Saudita no cenário global. Esse cenário parte do desejo de Mohammed Bin Salman, príncipe saudita, e do Fundo de Investimento Público (PIF). Neymar foi o último grande atleta a desembarcar no projeto.
O PIF, administrado pelo príncipe herdeiro da monarquia saudita, tem controle sobre 80% das ações do Newcastle, da Inglaterra, e de quatro clubes do país – Al-Nassr, Al-Ittihad, Al-Hilal e Al-Ahly. O time inglês custou 300 milhões de libras (cerca de R$ 2,2 bilhões na cotação da época) aos cofres sauditas. Nesta quarta-feira, eliminou o Manchester City da Copa da Liga Inglesa e disputa a fase de grupos da Champions League na temporada.
A manobra de MBS (como é chamado o herdeiro ao trono saudita pelas iniciais do seu nome) é tida como um sportswashing, uso estratégico e político do esporte para melhorar a reputação de um país – neste caso, a Arábia Saudita – no mundo. O PIF tentou levar Messi, para se somar à Cristiano Ronaldo e Neymar, na última janela de transferências. Mas ele preferiu os Estados Unidos.
“Se sportswashing for aumentar meu PIB em 1%, então eu continuarei fazendo sportswashing. Não me importo com o termo. Tenho um crescimento de 1% do PIB por meio do esporte e ainda pretendo aumentar mais 1,5%. Pode chamar como você quiser. Vamos conseguir esse 1,5%”, menosprezou Bin Salman diante das acusações, em entrevista à Fox News, dos Estados Unidos.
“Quando você quer diversificar a economia, você tem de trabalhar em todos os setores: mineração, infraestrutura, manufatura, transportes, logística, tudo isso. Parte disso é turismo e, se você quer desenvolvê-lo, parte disso é cultura. Parte disso é o seu setor esportivo, porque você quer criar um calendário esportivo.” Fortalecer o Campeonato Saudita é um dos pilares para o setor no país; além do futebol, o príncipe mantém os investimentos na Fórmula 1 e sonha em sediar Jogos Olímpicos e Copa do Mundo num futuro próximo. Também receberá o Mundial de Clubes da Fifa em dezembro. O país tem metade de sua população formada por jovens. O futebol e os craques do futebol estão no imaginário desses jovens. Muitos deles agora estão na liga saudita.
Com isso, a influência do país no mundo do esporte se expande. Yasser Almisehal, presidente da Federação de Futebol da Arábia Saudita, foi eleito em fevereiro para ser um dos seis representantes da Confederação Asiática de Futebol no conselho mais importante da Fifa, que substituiu o famoso Comitê Executivo após as denúncias de corrupção de 2015, que levou, inclusive, alguns brasileiros para a cadeia, como José Maria Marin, então da CBF. O mandato de Almisehal vai até 2027, mesmo ano em que o país receberá os Jogos da Ásia.
Bin Salman é herdeiro do trono saudita e primeiro ministro do país árabe. Com o fundo de investimentos, ele controla as transferências de atletas dos clubes do país. Sua fortuna é estimada em mais de US$ 25 bilhões (cerca de R$ 124 bilhões). O príncipe dedica boa parte do seu tempo ao futebol. Ele colocou seu avião particular a serviço, por exemplo, de Neymar, quando o astro brasileiro vindo do PSG checou. Pessoas próximo a ele dizem que o príncipe gosta de trabalhar. Ele tem duas filhas e é contrário à poligamia.
Sua iniciativa de apostar no futebol saudita tem em 2023 o pontapé inicial. Mas não pretende parar por aí. O contrato de Neymar, por exemplo, é de dois anos com o Al-Hilal. A torcida do time já pega no pé no técnico Jorge Jesus, que anda mais empatando do que vencendo. Há cobranças. O futebol saudita não se propõe a ser apenas uma brincadeira do príncipe. Ele é uma ferramenta para o crescimento do país.
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